Estudante cria projeto para arrecadar e doar figurinhas da Copa do Mundo
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domingo, 23 de outubro de 2022
LUCIANO TRINDADE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A mania de colecionar figurinhas do álbum da Copa do Mundo atrai cada vez mais adeptos, mas a brincadeira não é barata, e nem todas as crianças têm condições financeiras de participar.
O jovem estudante Allan Cohen, 16, passou a ter consciência disso ao ver um funcionário que trabalha em sua casa, o motorista Wylamy Bezerra, 46, recusar a doação de um álbum do Mundial no Qatar. O homem agradeceu a oferta e argumentou que não teria como comprar as figurinhas para seus filhos completarem a coleção.
"Ele disse que o preço de dois pacotinhos [R$ 4 cada um, com cinco cromos] é o valor que ele paga em um litro de leite para a filha dele. Entre o leite e as figurinhas, ele não poderia deixar de comprar o leite", afirma Allan à Folha.
Sensibilizado, o garoto viu na situação uma oportunidade de praticar a solidariedade e criou um projeto de arrecadação e doação de figurinhas.
"No mesmo dia em que eu ofereci o álbum para ele, eu vi uma reportagem sobre aquela criança de Goiás que desenhou o próprio álbum. Isso me impactou bastante, e foi aí que veio essa ideia", conta o estudante, citando a história do menino João Gabriel, de oito anos.
A iniciativa começou com um projeto extracurricular na escola onde o jovem faz o ensino médio, na Barra Funda, zona oeste de São Paulo. Quando resolveu criar uma página no Instagram (@figurinhaparatodos), o garoto viu o projeto viralizar nas redes sociais no perfil, ele explica como faz para receber as doações e mostra como foram as entregas que já fez.
O estudante passou a receber apoio de pessoas famosas, sobretudo jogadores de futebol. O atacante Róger Guedes e o goleiro Carlos Miguel, do Corinthians, o volante Tchê Tchê, do Botafogo, e o meia Erick, do Athletico, gravaram vídeos para divulgar o projeto.
"Eu não tinha ideia de que viraria uma coisa tão grande", diz Allan. "Depois que eu criei a página, comecei a receber muitas mensagens. Teve uma repercussão enorme, e foi assim que começou a crescer."
Em pouco tempo, cerca de dois meses de projeto, o estudante já arrecadou 13 mil figurinhas e 200 álbuns. Para fazer as doações, ele escolheu, primeiramente, o Lar das Crianças, na zona sul da cidade, e também o Centro Israelita de Apoio Multidisciplinar, na zona oeste paulistana.
"O próximo lugar que nós vamos ajudar é o General de Gaulle, no Capão Redondo", promete o estudante. O jovem conta, ainda, que costuma fazer bingos nas instituições para premiar as crianças. "É porque eu não tenho como dar o álbum completo para todas elas. Então, assim fica mais justo do que eu ter de escolher alguém."
O álbum da Copa tem espaço para 670 figurinhas. Para alcançar esse número, é necessário comprar, pelo menos, 134 pacotinhos. Isso equivale a um investimento inicial de R$ 534, sem contar os R$ 12 do próprio álbum, sendo a versão mais simples, sem capa dura.
Quando monta os kits para fazer as doações, Allan entrega o álbum e mais 670 figurinhas, incluindo entre elas algumas repetidas. "Uma das coisas mais legais é trocar figurinhas com outras pessoas. Então, não teria graça se eu desse um álbum completo para uma criança e ela só colasse tudo de uma vez", diz.
Desde cedo, o estudante sempre foi incentivado a praticar a solidariedade. Ele conta que sua mãe, Andrea, é uma inspiração para ele, pois ela também faz trabalhos voluntários.
Além do projeto para arrecadar e doar figurinhas, o garoto seguiu os passos da mãe e é voluntário em uma uma ONG, a Friendship Circle, que estimula jovens a fazer ações sociais, como conhecer e criar vínculo com crianças com deficiência.
"Eu estou indo na casa de um menino que tem síndrome de Down. Eu sempre tive contato com instituição porque minha mãe também é voluntária e eu ia com ela nos festivais. Então, sempre tive esse incentivo."
Uma semana após conversar com a reportagem, Allan preparou uma surpresa ao funcionário que trabalha em sua casa. Ele ainda não tinha dado um kit com o álbum e figurinhas para ele porque estava esperando uma oportunidade para que a filha dele, de oito anos, fosse até sua casa.
"Nós ficamos felizes, e eles ficaram muito felizes também de saber que inspiraram essa história."

