São 45 anos de idade e dez como técnico de vôlei. Nesse curto espaço de tempo, a coleção de troféus já é gigantesca, bem maior do que a esperada por ele próprio. Mas Bernardo Rocha de Rezende, o Bernardinho, técnico da seleção brasileira masculina de vôlei, não está satisfeito. Quer mais.

Bernardinho é um obcecado por vitórias e pela perfeição. Não dá sossego para seus comandados e exige mais do que o máximo de cada um. Talvez isso explique tanto sucesso. Com a seleção feminina, foram 28 torneios e 27 pódios. Na masculina, em 15 campeonatos disputados nos quase quatro anos à frente da equipe, foram 14 finais, com 12 títulos conquistados, como duas Ligas Mundiais, uma Copa do Mundo, um Campeonato Mundial e a Olimpíada de Atenas.

Por trás daquele rosto sisudo e dos gritos das quadras, está uma pessoa bem-humorada, que se preocupa com o futuro do vôlei e com o trabalho social com crianças. Em entrevista à Folha durante passagem por Londrina, onde ministrou uma palestra, ele fala sobre o método de trabalho, carreira fora das quadras, as dificuldades do futuro e muito mais.

Folha - Qual o segredo para tanto sucesso?
Bernardinho - Não tem segredo nenhum. Se tivesse segredo eu não iria desvendá-lo. Não tem outra fórmula para as coisas acontecerem bem se não for com muita dedicação e uma dose de talento. Se você tem talento, trabalhando muito e se dedicando muito você colhe aquilo o que você planta.

Folha - E essa vida de palestrante?
Bernardinho - Falo do trabalho que levou ao sucesso. De valores que são básicos no nosso trabalho, o trabalho em equipe, motivação, liderança, coisas que são essenciais para qualquer ambiente. É uma troca de experiências. Passo um pouco do que vivi nesses últimos 30 anos.

Folha - Depois de ganhar tudo e ser eleito mais uma vez o melhor técnico do Brasil, o que mais o Bernardinho quer ganhar?
Bernardinho: O próximo campeonato. A Superliga com o Rexona. Os passados (títulos) já foram. Essa questão do técnico é muito relativa. A intenção é premiar a melhor equipe e como não dá para escolher um atleta se escolhe o técnico. Quero poder continuar fazendo com que as pessoas evoluam, atletas femininos, masculinos, quem quer que seja. Os desafios, daqui pra frente, serão maiores. Não esperam (os torcedores) menos do que vitórias. Se ganhar vai ser uma coisa natural, se perder é crise.

Folha - 2004 foi o melhor ano da sua carreira?
Bernardinho - Tive grandes anos. O ouro (olímpico) é uma conjunção de fatores. Tive sete anos com o feminino e em 28 torneios internacionais chegamos a 27 pódios. Acho que foram anos maravilhosos. Falam que esse ano foi especial porque as pessoas têm fascínio pelo ouro olímpico. O Campeonato Mundial e a Copa do Mundo eram títulos que o Brasil não tinha, o ouro olímpico já.

Folha - Como manter motivação desses jogadores depois de ganhar tudo?
Bernardinho - É o grande desafio. Tem que haver um comprometimento nosso, do que nós queremos. O preço a ser pago a partir de agora vai ser mais alto do que no passado, porque dessa equipe se espera muito. Tem que ver se os jogadores querem continuar no processo do próximo ciclo olímpico. Eles terão que estar dispostos a pagar um preço mais alto ainda. Mais trabalho, mais comprometimento, mais dedicação, mais qualidade. Nós seremos o time a ser batido.

Folha - Já pensa na carreira fora das quadras?
Bernardinho - Atrás de uma mesa dessas (risos) não vai dar certo. Nenhuma chance de me ver fora das quadras. Não estar perto me faria muito mal. Não conseguiria render o que rendo. Eu adoro ficar do lado da quadra. O momento mais feliz do meu dia é durante o treinamento. Se é ruim eu fico mal. Aí dizem 'pô, mas cada treinamento você quer o máximo'. E quero fazer bem feito.

Folha - A seleção masculina sentiu isso na pele, não é?
Bernardinho - É, mas eles hoje têm consciência. Eu falo com os jogadores na Itália e me dizem que sentem falta.

Folha - O trabalho de base realizado pelo Rexona é fundamental para o futuro do vôlei brasileiro?
Bernardinho - Acho que sim, é uma sequência. Temos que continuar fazendo. É uma parceria que vem dando certo. Vamos ampliar nosso horizonte junto às escolas públicas. Eu acho muito importante que o esporte esteja vinculado à escola, que é o habitat natural dos jovens.

Folha - E essa experiência como apresentador de TV?
Bernardinho - Sou, digamos, um parceiro de apresentador. Só aceitei o projeto porque tem uma importância grande. O ''Movimento Olímpico'' (nome do programa apresentado por ele no Sportv) quer manter a chama acesa durante quatro anos e não a cada quatro anos você retomar a coisa querendo mobilizar as pessoas. Você poder mostrar projetos e atletas interessantes, esportes olímpicos. Ter também uma coluna do atleta paraolímpico e de projetos sociais ligados ao esporte. Tudo isso me motivou. Minha presença ajuda a criar as bases para que esse programa tenha força, junto com o João Pedro Paes Leme, que é um repórter excepcional. Mas em algum momento eu vou ter que sair e outros virão ocupar esse espaço. A idéia é essa, mobilizar as pessoas e criar um espaço para o esporte e não o futebol. Um espaço para todos os esportes e com conteúdo. Fizemos algumas palestras em Curitiba, com intuito de ajudar projetos sociais, de crianças com problemas renais. É um pouco que você pode retribuir pelo que o esporte tem lhe dado, que é muito mais do que eu esperava quando iniciei.

Folha - O ciclo das levantadoras Fofão e Fernando Venturini está chegando ao fim. Quem seria a substituta?
Bernardinho - Vejo muitas jogadoras com boas condições. Substituir a Fofão e a Fernanda não é simples. Espero que uma delas, pelo menos a Fofão, repense isso para poder passar o bastão aos poucos. Mas têm vários potenciais interessantes, a Ana Cristiana, de Osasco, é muito boa, a Daniele Lins, também do Osasco, tem muito potencial. A Ana Etiene, de Minas, tem um futuro brilhante. A Marcele, do Campos, é uma jogadora que já tem mais experiência e pode ocupar esse espaço.

Folha - Você vai para a China?
Bernardinho - Que China. Claro que não (risos). Vou ficar por aqui.