SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Quando o futebol engatinhava no Brasil, o Clube Atlético Ypiranga foi pioneiro. Criado em 1906, é um dos fundadores da Federação Paulista de Futebol (1941) e vice estadual em 1913, 1935 e 1936. O rebaixamento para a segunda divisão em 1958 encerrou a modalidade profissional na agremiação, que se mantém apenas como clube social.

Sessenta e quatro anos depois, uma empresa com parceria com o Ypiranga e um nome quase igual pretende ressuscitar o futebol da agremiação. A Cia Ipiranga, uma sociedade anônima, fez parceria com o Ypiranga para o futsal e as categorias de base. Estas vão usar os uniformes e escudo da tradicional equipe. No profissional, não. Será Ipiranga com "I", não com "Y".

"O Ypiranga colocou no estatuto que não pode ter mais equipes profissionais. Eu joguei lá, meu irmão também, a gente é do bairro e tem ótima relação com a diretoria", afirma o ex-atacante Paulo Jamelli, que passou por Santos e São Paulo, um dos executivos da empresa.

Com a ideia de estrear em 2023 (embora o time de futsal já estampe a marca da empresa no uniforme), o novo Ipiranga se parece com outros projetos de futebol. Vai buscar jogadores, trabalhar no mercado, ir atrás de dinheiro e escolheu a cidade de São Paulo por acreditar haver espaço para mais uma equipe.

Mas há outras ideias que não necessariamente passam por vencer partidas de futebol. É um empreendimento em que o placar das partidas pode ficar em segundo plano.

"Eu não entraria em um projeto de futebol tradicional. Seria mais do mesmo. Nosso DNA é entregar tecnologia. Nosso negócio é outro. O resultado dentro de campo não pode estar acima do resultado operacional", afirma José Rozinei da Silva, encarregado da parte tecnológica da SAF (Sociedade Anônima do Futebol).

Resultado operacional é o lucro.

O Ipiranga tem tantas ambições que o esporte em si, como o público está habituado a ver, pode ficar fora da lista de prioridades dos seus criadores. Pelo menos não existe preocupação com o que a torcida vai pensar a respeito disso, já que o clube nasce com zero torcedor. As palavras inovação e eSports podem vir à frente do futebol.

Para os executivos, a Cia Ipiranga, com a parceria nas categorias de base com o velho Ypiranga, é o primeiro clube híbrido do mundo.

"São três vertentes. O objetivo é não ficar dependente do futebol tradicional, de patrocínio e venda de jogador. Buscamos outra linha de abordagem. A gente quer pegar o futebol do século 20 e colocar no século 21", diz Calucho Jamelli, irmão de Paulo.

Associado à empresa Total Player, dos mesmos donos, o Ipiranga desenvolve tecnologias, aplicativos e programas para avaliação de jogadores de futebol. São projetos que já existem no mercado, para avaliar se um atleta de determinadas características vai se encaixar em qual time. Há a ideia de ter uma espécie de passaporte para determinar quanto cada atleta vale. Descobrir por que um jogador tende a se valorizar mais do que outro e como maximizar isso.

O clube poderia desenvolver a tecnologia para si próprio e usá-la para descobrir talentos. Mas a ideia é vendê-la para outros clubes. Colocar isso nas mãos da concorrência mediante pagamento.

O Ipiranga quer criar NFTs, representações digitais de ativos únicos para ser vendidos. Pode realizá-los mesmo para outros times. A Total Player fez o "token" do Atlético Mineiro.

"Os clubes tradicionais são muito limitados. O que a gente percebeu é que as ferramentas de empresas de tecnologia usadas em qualquer negócio, no mercado financeiro, podem ser aplicadas no mundo do esporte, e ninguém usa isso. É uma questão de ter informação. O Ipiranga tem a informação", explica Rozinei.

A questão é se o futebol está pronto para tanta tecnologia ou para inovações que mudam a maneira como a indústria funciona há décadas.

"O mundo do futebol está hoje como estavam os bancos há dez anos. As fintechs de bancos eram inovadoras há cinco anos. Hoje são corriqueiras. Só que a cabeça dos empresários de futebol não está pronta para isso. É muito difícil mudar o conceito", reconhece ele.

Desde o nascimento do projeto, a missão tem sido ir atrás de investidores. Explicar o projeto, mostrar por que daria certo. Mostrar que é parecido com investir no agronegócio, uma comparação que causa estranheza a princípio.

"Em vez de o cara investir no agronegócio, em dólar, em ouro, vai investir no futebol com a mesma segurança. Isso é o que a gente passa para as pessoas do mercado financeiro. Dá trabalho para fazer entender. A gente não quer mandar para o público a mensagem que é mais um time de futebol. Não é. É mais do que isso", jura Paulo Jamelli.

E outra das apostas são os eSports. A crença do Ipiranga é no crescimento dos jogos virtuais no país. De uma maneira parecida com o que ocorre nos Estados Unidos.

"É o futuro. A garotada prefere assistir a um jogo de videogame a ver um jogo real", finaliza Rozinei.

Tecnologia, inovação, eSports, negócios com outros clubes, NFT, token, blockchain, realidade virtual e até futebol estão nos planos do Ipiranga.

"A gente sabe que tem de fazer uma coisa diferente de tudo. Podemos pegar toda essa demanda de jogadores que não têm mercado, mas moram na capital paulista e na Grande São Paulo. Existe muito jogador ocioso por causa do calendário brasileiro", conclui Paulo Jamelli.