Osmani Costa
De Londrina
Às 15h30 de ontem, exatamente uma hora antes do início do treino da Seleção Brasileira, começou a aumentar o movimento de pessoas nas proximidades do Estádio Vitorino Gonçalves Dias (VGD), na área central de Londrina. Sob um forte calor, a presença de policiais militares (PMs) também já era significativa; eles estavam espalhados em pontos estratégicos dentro e fora do estádio.
Diferentemente de anteontem, às 15h45 do segundo dia de treinamento ainda eram pequenas as filas nas bilheterias. O preço único de R$ 2,00 pela entrada começa a irritar parte da torcida, que reclama pela gratuidade ou um valor menor. Às 16h05 chega o ônibus oficial da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), com os jogadores e a comissão técnica.
A chegada da delegação brasileira foi saudada pela torcida com aplausos e gritos dos nomes de jogadores e do técnico Wanderley Luxemburgo. Entre os torcedores que cercaram o ônibus – mas quase nem viram seus ídolos por causa do cordão de isolamento feito por PMs – estava o microempresário Eurípedes Gonçalves, 49 anos, três filhos e residente em Cambé (13 km a oeste de Londrina).
Gonçalves faz parte de uma parcela especial da torcida, que transita pelas redondezas do VGD enquanto a Seleção treina, mas não entra no estádio por diversos motivos. ‘‘Este horário é complicado, estou em Londrina a trabalho. Passei aqui por curiosidade, para tentar ver pessoalmente algum jogador, mas não tenho tempo para assistir ao treinamento’’, explicou o dono de uma pequena gráfica.
Na opinião dele, é muito importante para Londrina e região a realização do torneio Pré-Olímpico na cidade. ‘‘Pretendo assistir alguns jogos, dentro das minhas possibilidades. Gosto muito de futebol, mas acho que cobrar para o povo ver treinamento é um pouco exagerado; deveria ser gratuito’’, afirmou Gonçalves, que é torcedor do Londrina e do Santos desde a época de Pelé.
Quem veio de longe também para tentar ver os jogadores brasileiros foi o índio caigangue Luiz Gino, 37 anos. Ele foi ao VGD acompanhado pela mulher Zauirda e pelo filho Valdeir, 2 anos. Flamenguista doente – o filho vestia a camisa do time carioca –, ambos da equipe recentemente campeã da Copa Mercosul.
‘‘Esta é a primeira vez que tenho esta oportunidade, pena que o ingresso esteja tão caro. Acho que deviam cobrar, no máximo, R$ 0,50. Dois reais por pessoa é demais, para a gente que é pobre’’, comentou o índio, que veio da reserva de São Jerônimo da Serra (140 km a leste de Londrina). Ele, a mulher e o filho aguardavam a chegada de um grupo de índios para saber se teriam o dinheiro para entrar no estádio. ‘‘Caso consiga entrar, vou realizar um sonho de criança, porque gosto muito de futebol e da nossa seleção.’’
Num dos campos de grama sintética do Spider Ball, em frente ao Vitorino Gonçalves Dias, 12 pastores jogaram futebol ontem das 16 às 18 horas, alheios a toda movimentação provocada pela presença da Seleção Brasileira pré-olímpica. Um dos líderes do grupo, o falante pastor João Andrade, 35 anos, contou que o grupo joga todas as terças-feiras, chova ou faça sol.
De acordo com Andrade, que é goleiro, este é um momento de lazer e de condicionamento físico sagrado para os pastores. ‘‘Hoje, com a vizinhança da seleção, a nossa responsabilidade aumenta’’, observou. ‘‘Vai que o Luxemburgo mandou algum espião para assistir o nosso jogo aqui em busca de algum craque’’, brincou Andrade, para quem uma partida de futebol deve ser encarada com bom humor e como um momento de distração.
Já as irmãs Jane e Jocelaine Isaias, vindas de São Paulo, vão ao VGD nas tardes de treinamento na tentativa de ganhar algum dinheiro extra. Elas montam a mesinha numa das entradas do estádio e fazem pintura facial em crianças e adolescentes.
‘‘Viemos passar as férias na casa da vovó Paulina para descansar e também para assistir aos jogos do Pré-Olímpico. Como temos as tardes livres, aproveitamos para trabalhar um pouco. Estamos unindo o útil ao agradável’’, ressaltou Jane, que é professora primária na capital paulista.
Em São Paulo, as irmãs cobram normalmente R$ 2,00 pela pintura facial. Em frente ao estádio do VGD, elas estão fazendo o serviço por R$ 0,50. ‘‘Pintamos paisagens, figuras e muitos motivos diferentes, nas mais variadas cores. Mas aqui, os que estão sendo mais pedidos são a bandeira brasileira e margaridas com as cores verde e amarelo’’, disse Jocelaine.
Quem descobriu uma maneira de assistir aos treinos da Seleção do local do próprio trabalho foram alguns funcionários e estudantes estagiários da Maternidade Municipal, cujo prédio é separado do VGD – no gol de fundo – por um muro baixo. Mesmo sem querer se identificar, por medo de represália da direção do órgão, os funcionários garantiram que só vão para a sacada dos fundos da maternidade, para ver a movimentação dos jogadores, depois de terminado o turno de trabalho de cada um deles.
‘‘É bom ver daqui porque é de graça. Mas é meio longe, não dá para ver direito; nos próximos dias vamos trazer binóculos’’, afirmou uma enfermeira que disse ser fã número um do meia-atacante palmeirense Alex. ‘‘Eu não torço para o Palmeiras e nem para a seleção, torço para o Alex. Mas, por favor, coloca aí na reportagem que já são quase cinco horas da tarde, e nosso plantão terminou à uma da tarde. Não estamos aqui vendo treino de futebol em horário de trabalho.’’

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