SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Arremessar, driblar e defender são fundamentos do handebol compartilhados com a queimada, jogo comum nas aulas de educação física e um dos meios utilizados para apresentar o esporte aos estudantes. Para crianças e adolescentes com deficiência, no entanto, a iniciação esportiva não ocorre da mesma maneira.

"Quando tem um aluno com deficiência, o que o professor prepara para incluir nas aulas?", questiona Antônio Sérgio Oliveira Soares, 51, fundador da Associação Esportiva e Paradesportiva do Sul e Sudeste do Pará (Aepa).

Para ele, a falha começa na formação dos docentes que, no paradesporto, não é aprofundada e fica dependente do interesse do profissional em se especializar.

Em Parauapebas (PA), a Aepa oferece, desde 2013, judô também para pessoas com deficiência --sobretudo visual. Embora atingir o alto rendimento não seja o principal objetivo, a entidade foi representada nas Paralimpíadas de Tóquio por Thiego Marques, 22. Acumulando marcas como o bronze nos Jogos Parapan-americanos de Lima, em 2019, o judoca mira Paris, sede dos Jogos de 2024.

"Eu não tinha pretensão de ser atleta, era apenas para fugir do bullying na escola", diz Thiego, que pratica judô há dez anos, quando Antônio Sérgio ainda promovia a modalidade em um projeto social na prefeitura da cidade.

Com medalhas conquistadas ainda no primeiro ano de treino, o esporte deixou de ser um subterfúgio. Desde 2013, quando disputou um campeonato juvenil nos Estados Unidos, Thiego é atleta da seleção brasileira paralímpica de judô. Hoje, compete pela categoria até 60 quilos, na classe B3, devido à baixa visão.

Se Thiego buscava lidar com o bullyng, Ariosvaldo Fernandes, 44, mais conhecido como Parré, queria apenas manter-se saudável. Na adolescência, enquanto os colegas participavam da educação física, ele percorria o entorno da quadra com a cadeira de rodas. Seu primeiro contato com o paradesporto ocorreu quando um professor o apresentou ao basquete.

"Não sabia que uma pessoa com deficiência era capaz de jogar. Pensei que era piada quando imaginei que teria que arremessar uma bola a três metros de altura", afirma. Após oito anos na modalidade, Parré migrou para o atletismo classe T53 e acumula 11 medalhas em Jogos Parapan-Americanos.

Hoje, Parré é velocista da Associação Desportiva para Deficientes (ADD), em São Paulo, uma das 648 instituições que oferecem esportes paralímpicos espalhadas em todos os estados do Brasil e que podem ser encontradas no mapeamento de clubes feito pelo Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB).

Como ocorre entre os atletas convencionais, o percurso que vai da recreação aos Jogos passa por competições regionais, nacionais e internacionais. No paradesporto, porém, há mais barreiras que incluem não só a falta de capacitação de professores e o baixo investimento, como também o desconhecimento de lugares onde é possível treinar.

Em 2018, o Comitê Paralímpico deu início à Escola Paralímpica de Esportes com o objetivo de promover iniciação esportiva em nove modalidades para crianças e adolescentes de 8 a 17 anos com deficiência física, visual e intelectual.

Desenvolvido no Centro de Treinamento Paralímpico, em São Paulo, o projeto fornece uniforme, lanche e transporte aos alunos. Ainda assim, a demanda inicial foi baixa e levou o comitê à busca ativa de público nas escolas, com pais e gestores.

"Para a minha surpresa, muitos não sabiam que existia esporte para aluno com deficiência, muito menos Paralimpíadas", diz Ramon Pereira de Souza, 59, gestor de esporte escolar do CPB. A solução encontrada foi convidar os pais para acompanhar as aulas no CT.

Pensando em aulas mais inclusivas nas escolas, o departamento de educação paralímpica do comitê oferece cursos com a meta de qualificar 25 mil profissionais em todo o Brasil até 2024.

"Se nós os capacitarmos, certamente os professores serão capazes de planejar atividades inclusivas", afirma Souza. Para ele, o preparo dos docentes pode orientar o comportamento de crianças e adultos não só nos esportes, mas também no dia a dia, em situações como ajudar uma pessoa cega a atravessar a rua.

Incluir as famílias é fundamental para aproximar pessoas com deficiência da prática de esportes e trazer novos atletas ao cenário paralímpico. Para o professor Soares, da Aepa, a iniciação no paradesporto ainda é tardia devido à superproteção.

"Precisa de convencimento para o familiar tirar o parente de casa para fazer uma atividade", afirma Luiz Carlos de Araújo, 60, coordenador administrativo da Secretaria de Gestão do Esporte e Lazer da Universidade Federal de Pernambuco (Segel/UFPE), que conduz o Programa de Iniciação ao Desporto Especial (Pronide) e o Projeto Paratleta.

A reabilitação é outro caminho comum até o esporte, segundo Júnior Ongaro, 41, presidente da Associação dos Deficientes Físicos do Paraná (ADFP). Em Curitiba, a entidade desenvolve oito modalidades paralímpicas para lazer e alto rendimento.

Foi na fisioterapia na ADFP que Eliseu dos Santos, 44, se apaixonou pela bocha. A prática visava a saúde, mas as perspectivas mudaram assim que ele soube que havia competições. "Eu queria ser jogador de futebol, ir para a seleção, mas isso ficou adormecido com a distrofia. A bocha devolveu esses sonhos, completou minha vida."

Na classe BC4, Eliseu participou dos jogos paralímpicos de Pequim, Londres, Rio e Tóquio, conquistando medalhas nos três primeiros --em 2016, subiu ao pódio para receber a prata ao lado do irmão, Marcelo dos Santos, que também tem distrofia muscular progressiva.

"O esporte dá autonomia, ajuda na autoestima e faz muito bem para a pessoa com deficiência em todos os âmbitos", diz Ongaro, que é paraplégico e praticou basquete em cadeira de rodas, atletismo e remo como atleta de alto rendimento.

Segundo o professor Souza, o paradesporto é uma ferramenta de inclusão e traz benefícios não só para as crianças com deficiência, mas também para as famílias, para a comunidade escolar e para a sociedade.

"A medalha é muito importante, mas, no final das contas, é o que menos interessa. O que mais importa é o desenvolvimento pessoal, ver os atletas crescendo, virando pessoas legais, que vão contribuir para a sociedade", diz Hugo Parisi, 37, presidente do Instituto Pro Brasil, clube que oferece natação em Brasília.

Divulgar as histórias de atletas paralímpicos atrairia mais pessoas com deficiência com diferentes graus de comprometimento para o esporte, afirma Eliseu, o atleta da bocha: "É a forma de inclusão mais gratificante. Você sai de 'coitadinho' para atleta profissional, com pessoas querendo tirar foto, admirando você, vendo teu exemplo".

O judoca Thiego, que diz ter sentido a superproteção na pele, considera que há um papel social intrínseco aos atletas ao inspirar e encorajar pessoas com deficiência e suas famílias para o esporte. "A cada conquista que tenho, represento minha cidade, meu estado, meu país e pessoas com deficiência e com albinismo."

SAIBA ONDE PRATICAR ESPORTES PARALÍMPICOS NO BRASIL

Conheça algumas associações que desenvolvem o paradesporto nas cinco regiões do país

Instituições em outros estados e municípios podem ser localizadas no mapeamento do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), que lista 648 clubes em todo o país.

Escola Paralímpica de Esportes do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB)

Oferece atletismo, badminton, bocha, futebol de 5 e futebol PC, goalball, judô, natação, tênis de mesa e vôlei sentado para crianças e adolescentes de 8 a 17 anos com deficiência física, visual e intelectual. O atendimento é gratuito, fornece uniforme, lanche e transporte em algumas regiões do estado de SP e será retomado no dia 4 de outubro. As inscrições estão abertas até o preenchimento das vagas.

Onde: São Paulo

Contatos: [email protected] | (11) 4710-4218/4220/4216

Informações: https://www.cpb.org.br/

Associação Desportiva para Deficientes (ADD)

Oferece atletismo, basquete em cadeira de rodas, bocha, tênis de mesa e vôlei sentado para crianças e adolescentes de 6 a 18 anos. Adultos podem se inscrever em uma modalidade específica, desde que já tenham perfil de alto rendimento, já que as equipes participam de competições. O atendimento é gratuito.

Onde: São Paulo

Contatos: [email protected] | (11) 5011-6133

Informações: https://www.add.org.br/

Associação dos Deficientes Físicos do Paraná (ADFP)

Oferece atletismo, basquete, bocha, esgrima, natação, tênis de mesa, tiro esportivo e triatlo para pessoas com deficiência física, normalmente acima de 18 anos. Ainda não promove iniciação esportiva para crianças, mas encaminham-nas para outras instituições. O atendimento é gratuito e inclui uniforme e material de iniciante. As inscrições são feitas em consulta com a assistente social da entidade.

Onde: Curitiba

Contatos: [email protected] | [email protected] | (41) 3264-7234

Informações: https://adfp.org.br/

Associação Esportiva e Paradesportiva do Sul e Sudeste do Pará (Aepa)

Oferece judô para crianças e adolescentes de 4 a 17 anos no projeto Ser da Paz, mas não há limite de idade no projeto Todos à Luta. O atendimento é gratuito e inclui material de treinamento e uniformes. Recebe pessoas com e sem deficiência.

Onde: Parauapebas (PA)

Contatos: [email protected] | (94) 99169-1809

Informações: http://www.aepa.org.br/

Instituto Pro Brasil (IPB)

Oferece natação para pessoas com deficiência física, visual e intelectual, sem restrições de idade –há avaliação do técnico do instituto de acordo com os critérios da modalidade e as condições de saúde da pessoa. O atendimento é gratuito.

Onde: Brasília

Contatos: [email protected] | (61) 98181-8613

Informações: http://institutoprobrasil.org.br/

Secretaria de Gestão do Esporte e Lazer da Universidade Federal do Pernambuco (Segel/UFPE)

No Projeto Paratleta, voltado ao alto rendimento, oferece atletismo, bocha, natação e tiro com arco. No Programa de Iniciação ao Desporto Especial (Pronide), com caráter mais lúdico, oferece atletismo, bocha adaptada, futsal, natação e vôlei, além de dança. Recebe pessoas com deficiência física, visual, intelectual e auditiva, síndrome de down e transtorno do espectro autista. Para o Projeto Paratleta, no entanto, há classificação funcional de acordo com cada modalidade. O atendimento é gratuito e há inscrições para lista de espera. O retorno das atividades está previsto para 2022.

Onde: Recife

Contatos: (81) 2126-8462 (Segel)/8461 (Pronide)/8577 (Projeto Paratleta).