SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Dois anos após serem legalizadas no país e ainda à espera de uma regulamentação governamental, empresas de apostas patrocinam 3 em cada 4 clubes da Série A do Brasileiro. Em sua maioria, elas ocupam espaços periféricos dos uniformes.

Na elite, 8 sites patrocinam 15 equipes, mas penas Bahia, Ceará, Fortaleza e Goiás os têm como principal anunciante da camisa de jogo.

Atlético-MG, Botafogo, Corinthians, Coritiba, Flamengo, Grêmio, Red Bull Bragantino, São Paulo, Santos, Sport e Vasco comercializaram espaços como mangas, ombros e barra frontal, além dos shorts.

Segundo Fábio Wolff, da agência de marketing esportivo Wolff Sports, esses patrocinadores investem de R$ 100 mil até R$ 15 milhões por propriedades de arenas e/ou de uniformes. "Muitas casas de apostas estão observando o processo de regulamentação e ainda não fizeram investimentos por questões estratégicas."

Ainda assim, é uma mudança visível de cenário em relação ao Campeonato Brasileiro de 2019, quando seis empresas marcaram presença em nove uniformes.

Em geral, elas oferecem, além de um valor fixo, variáveis de acordo com a participação da torcida no volume de apostas. Em contrapartida, colhem dados para formar uma carteira de clientes.

Em novembro, antes da eliminação do Flamengo diante do Racing (ARG) nas oitavas de final da Copa Libertadores, o Sportbet.io, parceiro do time carioca, lançou a promoção "Black Friday do Mengão" prometendo pagar até R$ 100 para quem tivesse êxito em apostar R$ 10 na classificação rubro-negra.

"As empresas possuem nesse momento dois objetivos, o de exposição de marca, as tornando mais conhecidas, e o de captar leads [informações dos seguidores] para geração de negócio", afirma Wolff.

Especialistas ouvidos pela reportagem acreditam que o processo de regulação deverá impulsionar esses patrocínios.

O advogado Pedro Trengrouse, professor da FGV e certificado em regulação do jogo pela Universidade de Nevada, nos EUA, afirma que há mais de 500 sites de apostas sediados no exterior (países da América Central, África, Ásia e Europa) que oferecem serviços em competições disputadas no Brasil.

"Os motivos centrais da regulação são o de proteger a economia popular e o de garantir a integridade do esporte, estabelecendo monitoramento permanente das apostas. É o que vai depurar esse mercado no Brasil e trará as principais operadoras, que só investem no mercado regulado", diz Trengrouse.

Segundo Hans Schleier, diretor de marketing da Casa de Apostas, as marcas estão no momento de se apresentar ao mercado brasileiro.

A Casa de Apostas, sediada em Curaçao, ocupa o principal espaço das camisas do Bahia e do Vitória, integrante da Série B do Brasileiro, e também estampa sua logomarca no ombro dos uniformes de Botafogo e Santos.

"Muitos clubes já possuíam acordos de patrocínios máster, e as negociações são mais complexas por isso", diz Schleier. "Não existe vantagem num mercado não regulado."

A legalização das apostas online foi sancionada pelo ex-presidente Michel Temer no dia 12 de dezembro de 2018. Desde então, o Ministério da Economia tem o prazo de dois anos, prorrogáveis por mais dois (até dezembro de 2022), para promover a regulação.

O subsecretário de Prêmios e Sorteios do Ministério da Economia, Waldir Eustáquio Marques Júnior, diz à reportagem que esse processo só será concluído em julho de 2021.

"O estado brasileiro não estava acostumado com essa atividade, precisávamos entender o assunto, que mexe fortemente com a integridade do esporte", afirma Marques Júnior. "A regulamentação será concisa em três pontos: prevenção à lavagem de dinheiro, monitoramento para manipulação de resultados e a segurança das informações."

O órgão chegou a elaborar uma minuta, em meados de 2019, depois de receber mais de 1.800 sugestões em consulta pública, e tinha a previsão de concluir o processo até o começo deste semestre.

O texto inicial afirmava que o operador precisaria ser uma pessoa jurídica, desembolsar R$ 3 milhões para obter a taxa de licença e indicar uma reserva de R$ 6 milhões à disposição do governo como garantia para pagar os prêmios.

A minuta não contemplava o modelo de monitoramento das partidas, o que, segundo especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo em setembro de 2019, justificava o receio diante dos riscos de manipulação de resultados e lavagem de dinheiro.

Depois de duas consultas públicas, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que atua como consultora jurídica do Ministério da Economia, propôs que o modelo de autorização fosse substituído pelo de concessão pública. Somente assim, entende a PGFN, o poder público conseguirá punir operadores por improbidades.

Houve, então, uma terceira consulta pública, em março deste ano. Em agosto, após decreto do presidente Jair Bolsonaro, o BNDES, que é o responsável pelo processo de concessão e desestatização de ativos do Programa de Parcerias para Investimentos (PPI) do governo, foi designado para conduzir a regulação.

Em nota, o BNDES diz que, junto com o Ministério da Economia, faz "tratativas para o início dos estudos que balizarão a desestatização do setor de apostas esportivas".

O governo não informa uma estimativa da movimentação do negócio, mas Marques Júnior acredita que deverá ser entre R$ 4 bilhões e R$ 10 bilhões. Desse montante, o governo deverá arrecadar em torno de 30% com a tributação.