SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O francês Wilfried Happio completou a final dos 400 m com barreiras do Mundial de atletismo em 47s41. O tempo seria suficiente para a medalha de ouro em 14 das últimas 17 edições da competição. Em 2022, em Eugene, nos Estados Unidos, a melhor marca de sua carreira lhe valeu o quarto lugar.

Os números ajudam a mostrar a qualidade da prova, realizada na noite de terça-feira (19), que deu ao brasileiro Alison dos Santos o título mundial. Quatro dos oito finalistas tiveram o melhor desempenho de suas vidas. O norte-americano Rai Benjamin, medalha de prata, estabeleceu seu recorde na temporada.

"Eu não me preocupei com o tempo, porque é a primeira vez que sou campeão mundial. Acho que posso ser mais rápido", disse o paulista de 22 anos, que não precisou forçar o ritmo na parte derradeira do percurso. Vencedor ao fim de 46s29, teve vantagem bastante confortável sobre Benjamin, que registrou 46s89. O norte-americano Trevor Bassit fechou o pódio com 47s39.

"Você nunca faz a prova perfeita. Vou sempre buscar maneiras de melhorar", afirmou Piu, como é chamado o brasileiro pela semelhança com outro Piu de sua cidade, São Joaquim da Barra.

De fato, sua evolução tem sido constante. Em 2019, passou a ser uma figura mais conhecida ao conquistar o ouro nos Jogos Pan-Americanos, em Lima, aos 19 anos. Campeão com a marca de 48s45, começou a perceber que era possível dar saltos maiores: "Estar correndo sempre no melhor resultado dá uma constância para você chegar ao Mundial e não baixar a cabeça para ninguém".

Três anos depois, seu tempo já é mais de dois segundos melhor. Ele não baixou a cabeça para ninguém, tornou-se campeão do mundo e vê ainda bastante margem para crescimento. O recorde mundial estabelecido pelo norueguês Karsten Warholm (45s94, nos Jogos Olímpicos de Tóquio), diz Alison, é alcançável.

"A questão não é nem se é possível. É quando vamos chegar", afirmou, indagado se ele e outros podem superar o número impressionante. "A gente tem noção de que essa marca é possível. Houve um momento em que correr abaixo de 47 segundos era distante. Abaixo de 46 também já foi, não é mais. Dá para sonhar."

Além do recorde, há outro sonho no horizonte, o ouro olímpico. Bronze em Tóquio, Piu está certamente entre os favoritos para os Jogos de Paris, em 2024, mas tem dois grandes concorrentes, Warholm e Benjamin.

O recordista Warholm, 26, chegou ao Mundial de Eugene com problemas físicos, após uma lesão muscular em junho. Suportou razoavelmente até a metade da decisão, porém tocou em uma barreira, não conseguiu manter o ritmo e ficou apenas em sétimo, com um pouco característico tempo de 48s42. Até Paris, tem tempo de reagir e promete fazê-lo.

Já Rai Benjamin, 24, prata em Tóquio e prata também nesta semana no Mundial, teve a temporada atrapalhada por Covid-19 e por uma tendinite. Será mais um rival duro para o brasileiro, que, no entanto, já é o campeão do mundo e deixou de ser considerado uma zebra.

Piu se mostra ambicioso e afirma, na terceira pessoa, que, "daqui a 30 ou 40 anos, vão se lembrar do que o Alison dos Santos fez no atletismo". Sempre sorridente, consegue dizer isso sem soar arrogante e tem de fato trabalhado arduamente com o técnico Felipe de Siqueira para alcançar seus objetivos.

O respeito dos adversários ele já tem. O de lendas do atletismo, também. O norte-americano Edwin Moses, 66, soberano nos 400 m com barreiras entre os anos 1970 e 1980 (bicampeão olímpico, muito provavelmente seria tri se os Estados Unidos não tivessem boicotado os Jogos de Moscou, em 1980), vê muita qualidade no brasileiro.

"A técnica de Dos Santos é muito mais eficiente sobre as barreiras", disse ao site da World Athletics (a federação internacional de atletismo), comparando o paulista a seus rivais. "E, obviamente, ele tem velocidade."

Também bicampeão mundial, Moses chegou a vencer 122 corridas consecutivas, incluindo 107 finais, entre 1977 e 1987. Estabeleceu um duradouro recorde mundial (47s13), em 1980, e jamais teve um adversário à altura.

O atual recordista tem.