O dia 31 de maio de 1969 ficou marcado na história como aquele em que João Saldanha, então técnico da seleção brasileira, conheceu um jovem goleiro chamado Eduardo Roberto Stinghen, o Ado. Saldanha foi ao estádio Belfort Duarte, no Alto da Glória, para assistir o jogo entre Coritiba e Londrina Futebol e Regatas, antigo nome do Londrina Esporte Clube. O objetivo era observar o goleiro coxa-branca, Joel Mendes, que era muito bom. Mas naquela tarde de domingo o destaque foi Ado, mesmo que o time alviceleste tenha perdido a disputa por 1 a 0.

“Eu não me lembro de muita coisa dessa partida. Era um moleque desligado. Eu me recordo que tinha um auê no estádio porque o João Saldanha estava presente. Para ser sincero, nem sabia quem era ele. Só depois que soube que era o técnico da seleção. Mas passei batido e quando terminou a partida não sabia se ele tinha gostado do meu desempenho ou não. Naquela época ele não estava satisfeito com o desempenho do Cláudio, do Santos, e do Lula, do Corinthians”, relata Ado.

Saldanha ficou deslumbrado com o desempenho do goleiro do Londrina naquela partida, porque Ado não ficava estático sob a trave do time. Ele avançava até o limite da área para fazer as defesas e também para distribuir as bolas. Além disso, chamava a atenção por utilizar luvas, como os goleiros europeus, já que muitos goleiros ainda não utilizavam esse equipamento aqui no Brasil. “Naquela época tudo era muito amador por aqui. Meu tio morava em Trento, na Itália, e eu me correspondia com ele. Ele me enviava luvas e materiais iguais aos que o Zoff utilizava. Só quando fui contratado pelo Corinthians comecei a comprar luvas, porque as que eu conseguia por aqui tinham uma borracha que ficava escorregadia. Antes de começar a usar luvas, o Trovão (Sílvio Silva), massagista do Londrina, mandava eu passar breu na mão”, recorda o campeão mundial pela seleção brasileira.

Depois de conseguir ser titular no time de João Saldanha, Ado acabou perdendo a titularidade quando ocorreu a troca de técnicos da seleção. “Saldanha caiu porque falou a célebre frase em que refutou o pedido do presidente Médici para que convocasse Dadá Maravilha, dizendo para o presidente escalar o ministério, que ele convocaria a seleção”, destaca. “O Zagalo optou pelo Félix, porque ele tinha mais experiência que eu. O Brasil vivia uma fase difícil, com muita repressão”, relembra.

“O Zagalo montou um 4-3-3. A opção pelo Félix foi muito boa. Até hoje temos uma amizade muito grande, sempre nos encontramos. Ele teve grande participação no jogo contra a Inglaterra, mas acabou levando um chute na cara. O Zagalo chegou a pedir para que eu me aquecesse. Ele se recuperou e acabei não entrando”, relembra. Na última partida, Félix fez um gesto para ser substituído no fim do jogo. “Mas o Zagalo disse que só seria tricampeão aquele que terminasse a partida e não quis me colocar”, relembra.

Segundo o ex-goleiro do Londrina, a conquista de uma Copa do Mundo é difícil de descrever. “Só quem está dentro sabe disso. Cada um extrapola de uma maneira. No vestiário tomamos champanhe na taça Jules Rimet. Foi uma glória. Eu não tinha noção da repercussão no Brasil. Quando chegamos aqui foi uma loucura. Nunca vi tanta ovação. Parecia um conto de fadas. Em seis meses conquistei quase tudo que disputei”, aponta.

Início no futebol

Quando criança, Ado acompanhou a Copa do Mundo do Chile, em 1958, pelo rádio. “Eu me lembro que colocavam alto-falantes em frente das Casas Fuganti e ficava todo mundo na praça acompanhando a transmissão. Não tinha TV transmitindo direto”, relata. Mal sabia ele que 12 anos depois ele estaria no grupo que conquistaria o tricampeonato mundial, ao lado de Pelé, Carlos Alberto, Rivelino, Gerson, Jairzinho, Tostão, Félix e tantas outras estrelas.

Ado começou a carreira no “terrão” do Colégio Marista, onde estudava. Logo depois passou a atuar no antigo Corinthians de Londrina, aos 14 anos. “Nos fins de semana, quando era convocado, queria ir na matinê do cinema e não queria jogar. Eu acabava optando pela matinê. Mas naquela época o time acendia a luz do cinema para me pegar”, relembra. Por atuar nesses campos sem gramado, sua técnica era bastante elogiada nessas condições de jogo. “Diziam que eu era corajoso no terrão e não tinha medo de me jogar na bola. No campo de terra eu era um absurdo. Quando vim jogar na grama, foi demais”, relembra.

Seu desempenho logo começou a chamar a atenção da equipe profissional do Londrina. “Eu me lembro que tinha o Zuza como goleiro titular e o reserva dele, que me fugiu o nome, mas os dois estavam lesionados. Quando o Londrina precisou jogar em Bandeirantes, acabaram me chamando. Joguei bem, mas acabei sendo expulso quando discuti com o árbitro por não ter aceitado a marcação de um pênalti. Quando voltei a Londrina, o Franchello (então presidente do Londrina) propôs a assinatura do contrato. Com 16 anos já tinha assinado contrato profissional”, relembra.

Ele ressalta que o Londrina foi muito importante para a sua carreira. “Devo tudo ao Londrina, que me prestigiou e deu oportunidade de jogar. O Londrina foi tudo para mim. Tenho irmãos morando aí. No fim do ano quero dar uma passada na cidade, se meus netos deixarem. Há três anos fui ver o estádio Vitorino Gonçalves Dias. Fui ver o vestiário, que na nossa época era tudo improvisado, com a mesa de massagem perto da área de banho. Naquela época era um belo estádio. O VGD tem que ser preservado”, reivindica.