A lenta recuperação da economia brasileira impõe uma dura realidade aos trabalhadores. As estatísticas são sensíveis e apontam que a taxa de desemprego teve uma discreta redução, mas o número que registra os que atuam na informalidade atingiu um recorde. De acordo com dados da Pnad-C (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Contínua), divulgada no último dia 27 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), os trabalhadores nesta modalidade representam 41,4% do total da população ocupada no País. Nível mais alto desde que o indicador passou a ser medido, em 2016. Dos 684 mil novos postos de trabalho criados no trimestre encerrado em agosto, 87,1% foram postos informais – trabalhos sem carteira assinada, trabalhadores por conta própria sem CNPJ.

O administrador Lucas Almeida, 31, e a profissional de marketing Tatiana Moreira, 34,  estudaram sobre gastronomia e gestão para montar um food truck de pizza
O administrador Lucas Almeida, 31, e a profissional de marketing Tatiana Moreira, 34, estudaram sobre gastronomia e gestão para montar um food truck de pizza | Foto: Gustavo Carneiro - Grupo Folha

Sem a chance de ocupar uma vaga que conte com as regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o jeito é buscar uma própria solução. Foi o que fizeram a profissional de marketing Tatiana Moreira, 34, e o administrador Lucas Almeida, 31, hoje donos de um food truck - Pompiere - , especializado em pizzas. O projeto é a principal fonte de renda do casal. “Eu fui demitida e recebi um dinheiro de herança. Sempre tive o plano de ter um restaurante e gostava de cozinhar”, explica Moreira. Antes de investir, eles foram atrás de capacitação. Estudaram gastronomia e aprenderam sobre a gestão. Até o carro começar a rodar vendendo as iguarias da culinária italiana, os dois se prepararam por um ano. “Foi um ano difícil e apertado, mas conseguimos o melhor preço e começamos a trabalhar sem dívidas. Hoje, para aceitar um emprego, eu pensaria muitas vezes”, afirma Moreira, que já planeja alugar uma cozinha para ampliar o atendimento dos pedidos de entrega por aplicativo.

O caminho escolhido pelo casal é o recomendado por especialistas. Apesar de a situação de aperto do desemprego, é preciso se organizar antes de colocar o plano em prática. Segundo o consultor do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) em Londrina, André Azevedo, há dois tipos de empreendedorismo, o de necessidade e o de oportunidade. Apesar de o primeiro ser o que passa pela cabeça de qualquer pessoa que precise encontrar o sustento, o segundo pode ser muito mais sólido e propício a levar a ideia ao sucesso. “As pessoas tendem a querer escolher a ideia que traga o menor risco, mas é importante que percebam o que é viável. Se há mercado para o produto ou serviço. Depois, o trabalho tem que ser o de posicionamento. Para quem se deseja vender”, explica Azevedo, que afirma que a elaboração do preço final deve ser a última etapa.

Outra característica que precisa ser levada em consideração é a própria habilidade de quem deseja se empenhar em uma jornada de trabalhar por conta própria. É o que defende a consultora de recursos humanos Andréa Gauté, vice-presidente da ABRH-PR (Associação Brasileira de Recursos Humanos – Paraná). “As pessoas não podem simplesmente se aterem em fazer o que gostam. Precisam pensar em encontrar um diferencial. Buscar uma forma de se destacar”, opina Gauté. Outra dica é formar uma rede colaborativa, não só de parceiros, como também o compartilhamento, muito útil em casos como o de gestão do espaço físico. “Todas as ideias devem ser colocadas num papel. Mesmo quem não tem conhecimento de como fazer um plano de negócios deve elaborar um plano. É muito mais fácil e viável derrubar um sonho enquanto ainda está apenas por escrito”, explica a especialista.

TENDÊNCIA

O movimento de trabalhar sem um patrão vem crescendo em todo o mundo. A facilidade para a comunicação trazida pelas redes sociais, as relações de compartilhamento e a grande automatização, assim como o uso de inteligência artificial, vem mudando o padrão do mercado de trabalho em todo o planeta. Segundo dados divulgados em fevereiro, pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) – órgão das Nações Unidas –, o número de pessoas trabalhando na economia informal é de aproximadamente 2 bilhões.

A pesquisa aponta que a proporção de indivíduos que fazem parte da força de trabalho está caindo nos últimos 25 anos. Atualmente, 5,7 bilhões de pessoas em todo o mundo se encontram em idade produtiva, no entanto, somente 3,3 bilhões estão empregadas, enquanto os desempregados são 172 milhões. Os 2 bilhões restantes estão fora da força de trabalho. A estatística ainda aponta que 52% das pessoas que trabalham são assalariadas, enquanto 34% atuam por conta própria. Outros 11% ajudam em trabalhos familiares, e apenas 3% são empregadores.