Há mais de um ano, com a chegada da pandemia, um dos setores mais impactados pela crise foi o das diaristas e o das empregadas domésticas. Milhares de donas de casa em todo País deixaram de contratar estes serviços ou mantiveram à distância as faxineiras que estavam em suas casas toda semana por medo de contraírem o coronavírus com o movimento de vaivém nas residências. Algumas faxineiras ainda continuaram a receber mesmo sem poder trabalhar como antes. Por consideração, algumas donas de casa mantiveram o pagamento que estava acertado antes da pandemia, mas com o passar do tempo muitas também desistiram da oferta para driblar suas próprias dificuldades. Outras ainda, mantiveram as faxineiras no trabalho com todas as precauções, pagando o passe de ônibus - como é de praxe - ou, em alguns casos, o valor de uma viagem de transporte por aplicativo, considerado mais seguro que o transporte coletivo.

Analistas avaliam que o setor foi um dos mais impactados porque muitos empregadores estão em home office e fazendo as próprias tarefas domésticas por prevenção e também por economia. Mas esse novo comportamento afetou a vida de muitas mulheres que são chefes de família e têm nas faxinas o único modo de obter seu sustento.

Segundo o Instituto Doméstica Legal, que baseia seus dados no IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - quase 15% da mão de obra doméstica do País são de pessoas de mais de 60 anos - grupo de risco para a Covid. Este fator, mais as dificuldades financeiras de muitas famílias, agravadas pela pandemia, determinaram uma queda significativa no trabalho dessas profissionais e aquelas que não podem contar com a possibilidade das patroas manterem seus ganhos, mesmo em situações adversas, sofreram o impacto de ficar sem trabalho ou reduzir drasticamente o que conseguiam ganhar mensalmente.

Há casos de quem tinha faxinas agendadas todos os dias da semana, em residências variadas, ficar reduzido a apenas uma ou duas faxinais semanais. Esse corte drástico na renda de milhares de pessoas mostra a importância da vacinação para que o mercado possa continuar a oferecer vagas e oportunidades a um setor que foi um dos primeiros a sentir a crise no bolso e na vida com renda cada vez menor.

Mas também há exemplos felizes de quem está atravessando a crise e com confiança mútua, de empregadores e empregados, consegue manter seus ganhos que provém, quase sempre, de trabalho informal. Muitas mulheres, com o que conseguem ganhar como diaristas, pagam sua própria aposentadoria, por isso é importante não só no presente, como no futuro, manter essa fonte de renda e todos os esforços devem se concentrar para que este objetivo seja cumprido.

O VALOR DO SERVIÇO DOMÉSTICO

A sensação de entrar em casa e encontrar tudo em ordem, higienizado e com cheiro de limpeza chega a ser indescritível. Com o acúmulo de tarefas profissionais ou pessoais, muitas pessoas solteiras ou que vivem com a família, não dão conta de encaixar um dia na rotina para realizar a limpeza completa que o lugar em que vivem merece. Por isso, recorrer a uma diarista é um verdadeiro conforto e manter essa despesa no orçamento é considerada uma questão de saúde mental, tamanha a sensação de bem-estar proporcionada. O trabalho informal é encarado com profissionalismo por muitas mulheres que, paralelamente aos cuidados da própria casa, fazem da faxina em casas de família, o ganha-pão.

Arlinda  Silva Pereira, 68 anos, elogia a faxina de Marileide: "Ela é caprichosa e detalhista"
Arlinda Silva Pereira, 68 anos, elogia a faxina de Marileide: "Ela é caprichosa e detalhista" | Foto: Walkiria Vieira - Grupo Folha

A comerciante Arlinda Silva Pereira, 68 anos, a cada 15 dias deixa sua casa na chácara nas mãos da diarista Marileide. A relação ultrapassa os dez anos e, do ponto de vista de Pereira, a confiança é um elemento que fortalece a harmonia e a relação de trabalho. "Na hora que chego o impacto é maravilhoso. Os panos de limpeza estão todos limpos e estendidos no varal e a Marileide é caprichosa e detalhista: nunca vai embora sem limpar a geladeira, tira todos os copos do armário e todos os talheres da gaveta. Isso até hoje me impressiona." E como não falar do box do banheiro que de tão limpo, parece recém-instalado: "Eu a ensinei a lavar com detergente de coco e vinagre. Fica limpo, lindo e tira toda a gordurinha", ensina. Sem a presença da dona da casa, Marileide tem autonomia e faz até mais do que se espera.

Contando com este serviço num dos dias mais desejados pelas patroas, as sextas-feiras, Dona Arlinda se sente privilegiada. "É uma maravilha. Nesse período, vamos conservando e ela nunca deixa nada engrossar. São três quartos, dois banheiros, paredes altas e ela lava os azulejos do teto ao chão", valoriza.

SEMANA DE TRABALHO COMPLETA

A diarista Joana de Oliveira, 47 anos, mora no Jardim Avelino Vieira, região oeste de Londrina. Dois anos atrás, perdeu o marido em um acidente e deixou o trabalho de jardinagem e paisagismo que faziam juntos. Joana considera que faz a diferença em seu trabalho de limpar casas e apartamentos, por isso é sempre recomendada. "Hoje, estou com todos os dias da semana ocupados, graças a Deus, e se aceitasse, iria ter diária até aos sábados e domingos", conta. Discreta, Joana explica que trabalha conforme a dona da casa prefere. "Em algumas casas, começo pela louça, caso tenha o que lavar. Em outras, vou direto para os banheiros e vou dando sequência à ordem da casa."

Joana de Oliveira, diarista: "Uma patroa que mora em Cambé paga a diária e mais o trasporte por aplicativo para eu não ficar nos ônibus na pandemia"
Joana de Oliveira, diarista: "Uma patroa que mora em Cambé paga a diária e mais o trasporte por aplicativo para eu não ficar nos ônibus na pandemia" | Foto: Walkiria Vieira - Grupo Folha

Com os cômodos limpos e organizados, Joana diz que se sente realizada. "Como eu não tenho mais filhos pequenos, não tenho pressa de ir embora. Para mim, o importante é cumprir todo o serviço". Ao deixar o trabalho pouco depois das 18 horas em um apartamento no centro de Londrina, a diarista conta que gosta de chegar às 7h30 ao trabalho. "Uma das patroas com quem comecei logo que fiquei viúva morava em Londrina. Ela se mudou para Cambé. Eu achei que ela fosse me dispensar, mas disse que não abre mão de mim . Ela me paga R$150 reais e mais o transporte por aplicativo para eu não ficar nos ônibus desde o início da pandemia. Eu trabalho disposta e fico feliz por ter essa preferência", revela.

UMA DIARISTA POR DÉCADAS

A professora aposentada Sandra Gomes, 61 anos, mora na região central de Londrina. No apartamento claro e ventilado, ela e o cachorro Theo dividem o ambiente. Graças ao apoio que tem da diarista Marli Casagrande, 51 anos, suas tarefas domésticas são de acordo com sua capacidade. "Eu não consigo nem pensar na possibilidade de ficar sem a Marli. Ela é um anjo em minha vida, já me ajudou em mudança, gosta do Theo e nunca vi alguém saber lavar uma roupa branca como ela,"elogia.

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Moradora de Ibiporã - região Metropolitana de Londrina, Marli trabalha em casa de família desde os 19 anos. "Trabalhei em uma olaria antes, mas sempre gostei e fiz bem os serviços domésticos. Lá em casa todo mundo ajudava e o que mais gostava era de lavar a louça", recorda.

Marli também trabalha para uma familiar de Sandra há 28 anos e explica que cada casa tem seu jeito e ela se adapta às necessidades da família. "Tem gente que pede para limpar, mas deixar as coisas no lugar como estão e eu respeito porque a casa é da pessoa. Estou com segunda e terça livres porque era auxiliar em um posto de combustível, mas eles tiraram essa função para economizar e hoje a tarefa é de todos por lá", detalha. Hoje os filhos de Marli estão com 33 e 30 anos, ela tem duas netas e toda a sua renda vem das diárias pelas quais cobra R$150. Há 12 anos paga INSS, reconhece que é um trabalho braçal bastante detalhado, mas se sente feliz. "Ajeito minha casa durante a semana dentro das possibilidades e no fim de semana minha filha me ajuda na limpeza pesada", diz.

DIFICULDADES SÓ AUMENTAM

Apesar do exemplo de profissionais que conseguiram manter seus dias de faxina, no último ano a situação se agravou para muitas mulheres que chegaram a perder entre 40 e 50% do que tinham contratado antes da pandemia. Se a situação de quem as contratava não é boa - muitas com acúmulo de serviço doméstico e as demandas do home office - pior é a situação de quem ficou sem o seu ganha-pão. Na semana passada, a reportagem da FOLHA mostrou a dificuldade das pessoas que moram em comunidades periféricas de Londrina, muitas se queixaram de terem perdido os trabalhos informais ou mesmo os bicos por causa da pandemia.

Salta aos olhos a estatística do IBGE que aponta que 430 mil empregadas domésticas com carteira assinada perderam os empregos em 2020, sem contar os trabalhos de faxina informais. Isso tem um impacto social, familiar e individual indiscutível para a massa trabalhadora.

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