Não é fake. A pandemia causada pelo coronavírus segue ativa desde o início de 2020 e, embora as vacinas estejam sendo aplicadas, os casos de infecção e reinfecção avançam em velocidade desproporcional à imunização. Conciliar saúde e produtividade no trabalho tornou-se um dos desafios frente ao surto em todo o mundo - e em diferentes áreas de atuação. Os investimentos em equipamentos de proteção individual não são poucos, bem como as cartilhas de prevenção dedicadas à enfatizar os cuidados de higiene, distanciamento e etiqueta social e profissional.

Perante a justiça, as empresas são responsáveis pelo cumprimento dos protocolos como exigência do uso de máscaras pelos funcionários, uso de álcool em gel , distanciamento e sanitização do ambiente em caso de contágio para prevenção da covid-19
Perante a justiça, as empresas são responsáveis pelo cumprimento dos protocolos como exigência do uso de máscaras pelos funcionários, uso de álcool em gel , distanciamento e sanitização do ambiente em caso de contágio para prevenção da covid-19 | Foto: iStock

De acordo com o advogado Eduardo Luiz Correia, sócio do escritório De Paula Machado Advogados Associados, os processos relacionados ao contágio da doença no ambiente corporativo movimentam a Justiça do Trabalho. “O tema é delicado e controvertido e está muito longe de uma pacificação”, afirma o advogado trabalhista. Correia salienta ainda que é dever do empregador adotar todas as medidas de orientação e de prevenção para afastar o risco de contágio dentro do ambiente profissional. "Para tanto, é recomendável cercar-se de profissionais da área de Segurança e Medicina do Trabalho e implementar as medidas recomendadas para o enfrentamento da Covid-19, com observância às peculiaridades de sua atividade produtiva”, esclarece o advogado. Com mais de um ano de pandemia do novo coronavírus no Brasil e novas variantes do vírus gerando casos mais graves, os processos relacionados ao contágio da doença no ambiente corporativo se sucedem.

Eduardo Luiz Correia: “A comprovação de que o empregador propiciou um ambiente de trabalho seguro, contribuiu para a rejeição da tese da doença ocupacional”, informa o advogado
Eduardo Luiz Correia: “A comprovação de que o empregador propiciou um ambiente de trabalho seguro, contribuiu para a rejeição da tese da doença ocupacional”, informa o advogado | Foto: Divulgação

Correia faz uma análise sobre o período de um ano de pandemia sob a ótica do assunto “Covid-19 no ambiente de trabalho” e leva em conta os diversos posicionamentos sobre a matéria. Diante do cenário, o advogado alerta sobre como os empregadores devem agir para proteger o ambiente corporativo e evitar a propagação do vírus, colaborando, também, para evitar o aumento do número de processos trabalhistas. Com experiência, Correia menciona um caso em Londrina no qual recentemente atuou (com decisão ainda de primeira instância) onde se discutia a possível contaminação pelo novo coronavírus no local de trabalho. “A comprovação de que o empregador propiciou um ambiente seguro, contribuiu para a rejeição da tese da doença ocupacional”, informa o advogado. A caracterização da Covid-19 como doença ocupacional depende da comprovação do nexo causal com o trabalho, ou seja, cada situação deverá ser analisada individualmente, segundo suas características e peculiaridades.

Sobre as controvérsias, o a advogado expõe que em dezembro de 2020 o Ministério Público do Trabalho emitiu Nota Técnica e considerou Covid-19 como doença do trabalho, ao passo em que, no mesmo mês, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia divulgou Nota Técnica, de cunho orientativo, no sentido de que a configuração da covid-19 como doença ocupacional depende da comprovação do nexo causal. "O assunto é controvertido e, no meu entender, a configuração da Covid-19 como doença ocupacional somente pode se dar quando estiver comprovado o nexo causal com o trabalho, na medida em que o contágio sabidamente pode ocorrer em qualquer ambiente", reflete.

Para Correia, uma consultoria trabalhista especializada auxilia empresários na tomada de decisões. “Esse trabalho é importante no sentido de esclarecer acerca da obrigação patronal de propiciar um ambiente de trabalho seguro e saudável, a fim de que as medidas de segurança e de medicina do trabalho sejam implementadas e permanentemente fiscalizadas em seu estrito cumprimento. Cabe ao empregador, ainda, a obrigação de comprovar a efetiva adoção de tais medidas, tornando-se imprescindível, para tanto, que isso se dê através da devida formalização documental.”

Interessante destacar um caso concreto onde se discutia possível contaminação pelo novo coronavírus no ambiente de trabalho “No caso em questão, com decisão ainda de primeira instância, foi rejeitada a pretensão do trabalhador de ver reconhecida a Covid-19 como doença ocupacional, tendo em vista que não houve comprovação de que o contágio teria ocorrido no ambiente de trabalho. "Relevante destacar que houve no processo, por parte do empregador, comprovação documental e testemunhal acerca da adoção de inúmeras medidas orientativas e preventivas e que o trabalhador sempre atuou com utilização dos equipamentos de proteção individual recomendados. A comprovação de que o empregador propiciou um ambiente de trabalho seguro, contribuiu para a rejeição da tese da doença ocupacional", detalha.

Sócio do Escritório De Paula Machado Advogados Associados, o advogado Paulo de Tarso Bordon Araújo também esclarece que diante da possibilidade de um trabalhador afirmar que a empresa foi responsável pelo contágio, a primeira atitude que a empresa deve adotar é questionar em qual fato o empregado baseia a alegação de que o contágio se deu na empresa, para consequente investigação. "Por isso a importância de se documentar a entrega de equipamentos individuais de proteção aos empregados, bem como todas as medidas preventivas adotadas pela empresa". Araújo também frisa que s cuidados independem do número de colaboradores, uma vez que numa ação trabalhista do empregado a Justiça do Trabalho apurará a situação daquele empregado autor da ação, especificamente, pelo que qualquer empregador deve aplicar as medidas de prevenção ao contágio pelo novo coronavírus.

Trabalhador que descumpre quarentena pode ser demitido por justa causa

Luiz Henrique Vieira, advogado: "Trabalhador afastado que descumpre regras básicas pode ser demitido por justa causa"
Luiz Henrique Vieira, advogado: "Trabalhador afastado que descumpre regras básicas pode ser demitido por justa causa" | Foto: Luana Rufato Vieira/ Divulgação

No entendimento jurídico, é dever de cada trabalhador respeitar regras impostas pela pandemia, respeitar o ambiente de trabalho, bem como seus colegas, superiores ou subordinados. De acordo com o advogado e professor de Direito do Trabalho Luiz Henrique Viera, um trabalhador afastado por Covid-19 que descumpre quarentena pode ser demitido por justa causa. A sua atitude pode ser enquadrada nas disposições do art. 482 alínea “b” da CLT (mau procedimento) ou mesmo na alínea “h” do mesmo dispositivo (ato de indisciplina), para a hipótese de adoção de regras de conduta pela empresa. Em uma outra situação hipotética, Viera esclarece que se um empregado está ciente, via exames de confirmação da doença há três dias de sua infecção por Covid-19 e ainda assim segue trabalhando sem comunicar seus superiores e colegas, também pode ser demitido por justa causa. "Pelos mesmos motivos, em especial o mau procedimento. Além disto, o empregado que agir desta maneira poderá, em tese, estar cometendo crime previsto no art. 268 do Código Penal e que se refere à infração de determinação do poder público com o objetivo de impedir introdução ou propagação de doença contagiosa", alerta.

Eduardo Luiz Correia: “A comprovação de que o empregador propiciou um ambiente de trabalho seguro, contribuiu para a rejeição da tese da doença ocupacional”, informa o advogado
Eduardo Luiz Correia: “A comprovação de que o empregador propiciou um ambiente de trabalho seguro, contribuiu para a rejeição da tese da doença ocupacional”, informa o advogado | Foto: Divulgação