Dúvidas e curiosidades cercaram o desligamento do jornalista e apresentador Evaristo Costa da CNN Brasil. A emissora decidiu encerrar o contrato com o jornalista, válido ainda por mais 15 meses, e acertar a diferença salarial que constava no documento. Em entrevista à revista Isto É, o apresentador contou que, dentre outras justificativas, a emissora alegou não ter verba de publicidade para seguir investindo na atração comandada por ele, o “CNN Séries Originais.” “Alegaram que não conseguiram vender patrocínio para meu programa, o que não é a minha área”, relatou Evaristo. O profissional diz que descobriu sozinho que havia sido dispensado, vendo a chamada da nova programação da emissora e constatando que não estava mais lá. O caso levanta questionamentos.

Demissões após as férias são comumente repercutidas, mas há uma maneira de fazer isso ser menos dolorido para o empregado? Do ponto de vista do psicólogo e diretor de Recursos Humanos para América Latina da empresa Parker Hannifin desde 2014, Marcelo Madarász, quando se analisa um fato de maneira pontual, é necessário muito cuidado e não apenas ampliar o campo de conhecimento específico sobre o ocorrido, como também aprofundar o histórico, causas, perspectivas, pontos de vista e alerta: "Lembrando que um ponto de vista é apenas a vista de um ponto, é prudente termos outros pontos de vista".

Marcelo Madarász: "Respeito, transparência, clareza dos reais motivos, comunicação franca e tratar o colaborador com honestidade são fundamentais"
Marcelo Madarász: "Respeito, transparência, clareza dos reais motivos, comunicação franca e tratar o colaborador com honestidade são fundamentais" | Foto: Marcos Suguio/ Divulgação

Segundo o gestor, não se pode cair na parcialidade e por este motivo sempre é prudente conhecer a história em sua totalidade. "Em relação à demissão de Evaristo Costa, a informação é de que seu contrato havia sido encerrado por conta do término do programa que apresentava. Segundo o mesmo, pelo relatado em redes sociais, ele teria tomado conhecimento de sua demissão ao assistir à chamada da programação da TV e perceber a ausência de seu programa. Ligou para saber o motivo e na ocasião teria sido informado que a empresa não tinha mais interesse em seus serviços. Partindo desta informação e a utilizando como ponto de partida, questiona-se que embora algumas demissões aconteçam como decorrência de vários motivos - dentre eles a necessidade de ajustes nos quadros, o enxugamento das estruturas, a adequação ao novo momento - há várias maneiras de se fazer um desligamento", pensa.

Conselheiro da Academia Europeia da Alta Gestão, Madarász explica que toda e qualquer demissão pode ter seus efeitos nocivos ao colaborador minimizados, se em primeiro lugar a empresa fizer uso do mais básico ingrediente de uma relação: o respeito. "Respeito, transparência, clareza dos reais motivos, comunicação aberta, franca, realista e tratar o colaborador com honestidade são fundamentais", diz.

Com uma trajetória em Recursos Humanos nas empresas Thomson, Camargo Corrêa, Nokia e Natura, Madarász avalia que as empresas, ao demitirem, podem oferecer um programa de recolocação no mercado, os famosos processos de outplacement, aplicam uma prática que pode minimizar os impactos negativos no demitido e pode revelar o respeito àquele que contribuiu com seu trabalho para a organização. "Há uma variedade muito grande de ofertas que podem apoiar o demitido num momento tão delicado como este", avalia.

Segundo o gestor, um bom processo de recolocação inclui o acolhimento, apoio psicológico, suporte emocional para que ele ou ela possam fazer a travessia deste momento de mudança tão radical. É importante trabalhar a mudança para que ela se transforme numa transição com todas as suas etapas: vivência do luto, fechamento do ciclo, término e abertura para novos horizontes.

Sobre demissões surpresa, Madarász avalia que na contramão desse tipo de acontecimento, cada vez mais se fala em segurança psicológica e a própria situação de pandemia permitiu que as discussões sobre o ser humano, suas fragilidades, vulnerabilidades e conflitos ganhassem destaque. "Em última instância, a situação levada a extremos pode revelar a falta de sustentabilidade da própria organização", sustenta.

INSEGURANÇA PSICOLÓGICA

Mauricio Chiesa Carvalho: "Um ambiente supostamente hostil provavelmente, tenha uma cultura de insegurança psicológica"
Mauricio Chiesa Carvalho: "Um ambiente supostamente hostil provavelmente, tenha uma cultura de insegurança psicológica" | Foto: Divulgação

Para o Executivo de Recursos Humanos escritor, Mauricio Chiesa Carvalho, toda história tem três lados. Por ser uma pessoa midiática e de grande influência, o caso do Evaristo repercutiu tanto quanto o do Faustão. Contudo, infelizmente, é algo que acontece – e muito – em organizações. "As organizações serão cada vez mais avaliadas pelo seu grau de ESG - Governança Ambiental, Social e Corporativa que é uma avaliação da consciência coletiva de uma empresa em relação aos fatores sociais e ambientais. Um ambiente supostamente hostil (como apresentado em um caso de demissão como esse), provavelmente, tenha uma cultura de insegurança psicológica. Os profissionais de comunicação e imprensa também, naturalmente, pela atividade, sofrem mais destes tipos de “pressão”", alerta.

Para Carvalho, a imprensa é vista como uma ferramenta de mediação e diálogo da sociedade junto aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. E a profissão sofreu sérios impactos com o advento da tecnologia. Embora, supostamente tenha-se hora de início e término do expediente, os acontecimentos que geram as notícias não param. Como fica a questão da saúde mental, cansaço, fadiga e stress (e até burnout) destes profissionais?

De seu ponto de vista, aqui soma-se uma possível falta de atenção à saúde mental dos profissionais com o agravante da “aparente” cultura de insegurança psicológica. "A questão é saber se uma CNN realmente é tão despreparada assim, ou, o “terceiro” lado falou mais alto? Por fim, não se trata apenas do caso do Evaristo. Tantos outros ainda, infelizmente ocorrem por aí. E essa atitude da empresa a qualquer custo pode ter consequências, uma hora o custo vem. E pode ser muito caro", expõe.

DEMISSÃO POR WHATSAPP PODE?

Vania Queiroz e Priscila Miranda, advogadas: "A dispensa é um momento que sempre gera fragilidade emocional para aquele que a recebe, assim deve ser feita com respeito à dignidade do trabalhador"
Vania Queiroz e Priscila Miranda, advogadas: "A dispensa é um momento que sempre gera fragilidade emocional para aquele que a recebe, assim deve ser feita com respeito à dignidade do trabalhador" | Foto: Walkiria Vieira

De acordo com as advogadas Vania S. Queiroz e Priscila Miranda, do escritório S. Queiroz Advogados Associados, durante o usufruto das férias, o trabalhador não pode ser dispensado nem avisado de sua dispensa. Entretanto, não há impedimento legal para que a dispensa ocorra no retorno das férias, o que é plenamente possível desde que não exista norma em convenções coletivas ou acordo que disponha de forma mais benéfica para o trabalhador.

Da avaliação das especialistas, embora seja um direito da empresa realizar a dispensa de seu empregado, é preciso ter o cuidado para que a dispensa não seja abusiva e gere danos ao trabalhador. "Se o trabalhador se muda para localidade diversa de seu domicílio exclusivamente em decorrência do emprego e há alteração no interesse da empresa que decide dispensá-lo, é seu dever custear as despesas geradas com a mudança de domicílio. O artigo 470 da CLT prevê que as despesas resultantes da transferência do trabalhador devem ser custeadas pela empresa, o que inclui tanto as despesas de ida para o novo domicílio como também os gastos financeiros com o retorno ao local de origem na hipótese de dispensa sem justa causa, abrangendo eventuais multas geradas com a rescisão do contrato de locação da nova residência", sustentam.

Ferramenta tão comum, o WhatsApp extrapolou as relações interpessoais para alcançar a esfera corporativa e o quando assunto é a dispensa de um trabalhador por meio do aplicativo, surgem muitas dúvidas. "O ideal seria a utilização de outras ferramentas que permitam uma comunicação mais fluída, considerando que a dispensa é um momento que gera fragilidade emocional ao trabalhador e mais ainda para o estagiário que está no início de sua carreira profissional", afirmam Queiroz e Miranda. "Entretanto, a comunicação da dispensa por aplicativo de WhatsApp é válida e tem sido aceita pelos tribunais que integram a Justiça do Trabalho. Por outro lado, é preciso atenção e cuidado com a forma com que a comunicação da dispensa acontece, evitando qualquer constrangimento ou tratamento vexatório ao estagiário ou funcionário que viole sua dignidade e seja causa de danos morais. Além disso, o órgão/empresa contratante deve se certificar de que o funcionário recebeu a mensagem para que a dispensa tenha validade," explicam.

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