Imposição de metas impossíveis ou abusivas, agressões verbais, brincadeiras ofensivas, punições injustas, apelidos pejorativos, troca de setores sem aviso ou treinamento são exemplos de posturas que se caracterizam como assédio moral no trabalho.

A Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT) reconhece o assédio moral no ambiente de trabalho como violência. Em 2019 foi aprovado pela Câmara Federal o Projeto de Lei 4742/2001, que classifica a prática de assédio como crime.

Previsto no artigo 216-A do Código Penal, assédio sexual é "constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função". A pena é de um a dois anos de prisão.

Já o artigo 186 do Código Civil declara que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Em 2022, a Lei 14.457/2022 implementou o Programa Mais Mulheres para garantir melhores condições para as mulheres e contextualiza a prevenção e combate ao assédio e outras formas de discriminação no ambiente de trabalho.

Mas os casos continuam: "Seis em cada 10 médicas já foram vítimas de assédio sexual ou moral no Brasil." "Ex-secretário de Esportes é indiciado por perseguição e assédio sexual contra servidoras no Tocantins." Manchetes como essas se somam à recente denúncia de uma estagiária contra um ex-diretor no Rio Grande do Sul. Outras 10 mulheres se encorajaram e ele foi demitido por justa causa. Fica o alerta.

DE TABU A TEMA OBRIGATÓRIO

Ponto de extrema relevância é a obrigatoriedade de treinamentos contra o assédio nas empresas que tenham CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio). A produtora Marina Stuchi, de Londrina, realiza palestras preventivas em empresas e observa que o mercado de trabalho já reconhece a necessidade da abordagem, sobretudo por conta dos impactos do assédio.

De sua experiência, Stuchi relata que o impacto na saúde mental do trabalhador assediado é enorme. "Problemas como depressão, crise de ansiedade, bornaut são os mais comuns. Também crises de insônia, gastrite e enxaqueca são outros males que atingem o assediado", cita.

As ações de prevenção, por sua vez, se revelam importantes. "Pois são construídas para alcançar soluções humanas e pacificadoras para os relacionamentos desgastados no ambiente de trabalho, sempre com a perspectiva de prevenção de conflitos, do surgimento e/ou agravamento de situações de assédio e da discriminação. Tais ações podem prevenir potenciais casos de assédio, reduzir vulnerabilidades e vítimas em potencial", enumera.

Marina Stuchi dá cursos e palestras nas empresas: "É importante aprendermos a nomear as coisas. Muitas pessoas sofrem assédio no trabalho, mas não sabem nomear"
Marina Stuchi dá cursos e palestras nas empresas: "É importante aprendermos a nomear as coisas. Muitas pessoas sofrem assédio no trabalho, mas não sabem nomear" | Foto: Lucas Oliveira/ Divulgação

Embora exista mais consciência sobre o assunto, a palestrante compreende que é preciso avançar mais. "Ainda é um tema tabu e que encontra resistência", aponta. E nesse perspectiva, as palestras nas empresas cumprem um papel essencial - trazer a discussão sobre o tema e dar esclarecimentos. "É importante aprendermos a nomear as coisas. Muitas pessoas sofrem assédio no trabalho, mas não sabem nomear. Sentem o incômodo, muitas desenvolvem uma rejeição ao ambiente de trabalho e não sabem exatamente o motivo", diz Stuchi.

Garantir um bom ambiente de trabalho e mais produtividade compreende os objetivos do curso ministrado por ela, destinado a empresários, comerciantes, membros da empresa, servidores, estagiários, aprendizes e pessoal terceirizado.

Empresas comprometidas e que investem em ambiente e cultura organizacional saudáveis e pautadas pelo respeito mútuo, equidade de tratamento, não se limitam a reconhecer o risco jurídico, financeiro e para a reputação de suas organizações.

"Trata-se de garantir direitos fundamentais dentro do ambiente de trabalho, assim como aprimorar os relacionamentos interpessoais, garantindo, com isso, um melhor desempenho e entrosamento de toda a equipe", explica a palestrante.

O PASSO A PASSO DA CONSCIENTIZAÇÃO

O propósito do curso ministrado por Marina Stuchi é sensibilizar e conscientizar as pessoas da equipe de trabalho, para que:

- Potenciais agressores abandonem determinados comportamentos e ações caracterizadas como assédio, visando reduzir ao máximo ocorrências no ambiente de trabalho, com maior propriedade e conhecimento da causa;

- Potenciais vítimas, a partir do treinamento, possam entender as situações que configuram assédio e consigam relatar essas ocorrências.

- Seja feita caracterização e qualificação de casos de assédio, que poderão ser devidamente esclarecidos para todos, de forma que a organização mobilize a estrutura adequada de apoio quando necessário;

- Reduzir o número de relatos improcedentes em canais de denúncias, melhorando estatísticas e otimizando o tempo de apuração.

POLÍTICA DE TOLERÂNCIA ZERO

Gestora de Recursos Humanos em um grupo com mais de 400 colaboradores, sendo a maioria ainda composta por homens, Marta Barbosa, de Curitiba, nota uma transformação progressiva no cenário profissional ao longo dos anos.

Mas lembra também como um passado não tão distante foi cruel, pois antes o o tema da igualdade de gênero e prevenção era evitado, e as mulheres que se manifestavam eram frequentemente julgadas, com a culpa muitas vezes recaindo sobre elas.

A constante vigilância sobre as mulheres era evidente em diversas situações, seja ao tomar decisões assertivas ou ao expressar emoções. "Comentários como 'está na TPM' ou 'é falta de sexo' acompanhavam atitudes firmes, enquanto a sensibilidade feminina era atribuída a qualquer manifestação emocional. Além disso, as conquistas profissionais eram frequentemente desmerecidas com insinuações infundadas, como deve ter obtido com favores sexuais", expõe.

Marta Barbosa, gestora de RH: "Levantamos os fatos ocorridos e tomamos medidas rigorosas, incluindo a demissão daqueles que praticaram assédio"
Marta Barbosa, gestora de RH: "Levantamos os fatos ocorridos e tomamos medidas rigorosas, incluindo a demissão daqueles que praticaram assédio" | Foto: Divulgação

Barbosa já enfrentou situações de queixas relacionadas a assédio moral ou sexual. "Nossa abordagem diante dessas situações é sempre imediata e assertiva, visando garantir um ambiente de trabalho seguro e respeitoso para todos os colaboradores".

Em tais casos, a apuração é essencial. "Levantamos os fatos ocorridos e tomamos medidas rigorosas, incluindo a demissão daqueles que praticaram tais atitudes, deixando claro que esse comportamento é inaceitável em nossa organização". E enfatiza: "a repulsa a qualquer forma de assédio é um valor fundamental que reforçamos durante o processo de integração de novos colaboradores".

Durante essa fase, é explícita a política de tolerância zero para o assédio moral e sexual. "Além de fornecer informações sobre os canais de denúncia disponíveis, garantindo que todos os membros da equipe estejam cientes e confortáveis para relatar qualquer incidente".

A gestora considera ainda que a prevenção do assédio no ambiente de trabalho constitui pilar fundamental para a construção de uma cultura organizacional saudável e inclusiva. "É essencial implementar programas eficazes de prevenção do assédio, capacitando os colaboradores a reconhecer, denunciar e combater qualquer forma de comportamento inadequado".

O movimento tem se consolidado em diferentes empresas e para o também gestor de RH, Maurício Chiesa Carvalho, de Londrina, a prevenção contribui para a construção de uma cultura organizacional baseada no cuidado mútuo, pois com um ambiente permeado por respeito e confiança, aumenta a segurança psicológica. "Consequentemente, traz o contexto de felicidade nas organizações, reduzindo faltas, rotatividade e mitigando chances de um ambiente tóxico e afastando lideranças tóxicas", observa.

COMO DENUNCIAR

- Ligando 190, Polícia;

- Ligando 180, Central de Atendimento à Mulher;

- Delegacia da Mulher;

- Também é possível procurar pessoalmente uma delegacia, regular ou especializada.

- Em caso de violência contra a mulher cometida pela polícia, procure a Corregedoria.

- Em todos os casos, você pode gravar áudio ou filmar com o celular, e entregar esse material como prova. Só não pode divulgá-lo sem autorização das pessoas filmadas ou gravadas.