Seca provoca quebra de 3,4 milhões de toneladas na safra de verão
Estimativa é de perda de 16% da soja no Paraná, mas no Norte, região mais atingida pela estiagem, estrago chega a 80% em algumas lavouras
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sábado, 16 de março de 2024
Estimativa é de perda de 16% da soja no Paraná, mas no Norte, região mais atingida pela estiagem, estrago chega a 80% em algumas lavouras
José Marcos Lopes e Douglas Kuspiosz - Especial para a FOLHA
A região Norte do Paraná foi a mais atingida pela estiagem dos últimos meses, que levou a quebras nas safras de três das principais culturas do estado: soja, milho e feijão. Segundo o Departamento de Economia Rural (Deral), do governo do Paraná, a estimativa é de uma quebra de 16,4% na safra da soja, de 23% na do feijão e de 12,6% na safrinha do milho. Produtores de soja do Norte do estado, no entanto, relatam perdas de até 80% na safra 2023-2024.
O relatório mensal do Deral indicou uma perda de aproximadamente 3,4 milhões de toneladas na safra de verão, com um prejuízo de cerca de R$ 5,6 bilhões em três das principais culturas do estado. A estimativa inicial era de uma produção total de 25,5 milhões de toneladas, expectativa que foi rebaixada para 22,1 milhões. A projeção para a soja era de 22,3 milhões de toneladas, mas atualmente está prevista a colheita de 18,2 milhões de toneladas. O órgão estima que serão colhidos 2,5 milhões de toneladas de milho e 167 mil toneladas de feijão em todo o estado.
De acordo com a Federação da Agricultura do Paraná (Faep), a semeadura começou com um bom volume de chuvas, mas terminou com pouca precipitação no Norte do estado. É o que relata o produtor de soja Ederval Vinícius, de Primeiro de Maio. “Além do calor, houve muita ‘chuva verde’, que não é boa para a agricultura, com 7mm ou 8mm. Não deu uma chuva boa em 75 dias.”
Segundo ele, a quebra foi de aproximadamente 80% na região. “No ano passado, a média foi de 160 sacas por alqueire. Neste ano, estamos conseguindo somente 30. Teve comprador que rodou dias inteiros e não conseguiu encher o caminhão”, afirma.
Há 40 anos na região, o produtor Roberto Carlos Lopes disse nunca ter visto uma situação como essa. “Até outubro choveu um pouco, mas depois de novembro não choveu de jeito nenhum na região. Em 40 anos, foi o único ano em que isso aconteceu, nem os agricultores mais velhos lembram de um ano tão ruim”. Lopes previa colher 150 sacas por alqueire e vem colhendo de 20 a 30. “Quem tem seguro consegue recuperar um pouco, mas ainda fica com prejuízo”.
QUEDA DEPOIS DE RECORDE
Flávio Turra, gerente de Desenvolvimento Técnico do Sindicato e Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), lembra que a safra 2022-23 teve uma colheita recorde no Paraná, com cerca de 46 milhões de toneladas de grãos. “O total da safra de verão deverá ter uma redução de 3,4 milhões de toneladas, isso é muito significativo. As cooperativas têm uma participação importante no recebimento de soja e terão sua participação reduzida na proporção da quebra geral”.
Segundo Turra, as atenções agora se voltam para a safra de inverno, que deverá ter redução na colheita de trigo. “O plantio de cevada vai aumentar, mas a produção de trigo vai diminuir. Estimamos uma redução de 500 mil toneladas na produção de trigo em uma redução de 15% a 20% na área plantada, por conta da queda nos preços e da dificuldade de comercialização da safra passada. Se fecharmos a conta, a tendência é o estado produzir algo em torno de 41,5 milhões de toneladas na safra 2023-2024, bem abaixo da safra passada”.
A expectativa é que a produção de grãos de todo o país seja reduzida neste ano. “Foram praticamente 320 milhões de grãos na safra passada, na atual vamos produzir algo em torno de 300 milhões. É uma questão de conjuntura interna, os preços em dólar caíram em função da produção mundial, que está grande, e tem até uma certa recessão da economia mundial, o que reduz o consumo. O câmbio afetou negativamente e houve uma boa safra em nível global”, afirmou Turra.
Chefe-geral da Embrapa Soja (Centro Nacional de Pesquisa de Soja), Alexandre Nepomuceno disse que algumas regiões mantiveram boa produtividade no Paraná na safra atual, mas confirmou que houve uma quebra maior no Norte do estado. “Tivemos, principalmente depois do Natal e do Ano Novo, um período de seca que acabou afetando muitas lavouras”, afirmou. “A gente teve problemas de chuvas excessivas no Sul, no início de plantio, principalmente no Rio Grande do Sul. Lá para o Norte, problema de seca.
Quando parecia que ia melhorar, começou a ter chuvas excessivas lá para cima, agora começou a dar seca. Então, foi um ano bem atípico”. Ele avalia que a colheita total de soja no país deverá ser similar à da última safra.
Preços ainda não deram sinais de recuperação
Além dos problemas climáticos, que levaram a perdas significativas das principais culturas de grãos no estado, os preços da soja, do milho e do trigo ainda não deram sinais de reação. Segundo Ana Paula Kowalski, técnica da Federação da Agricultura do Paraná (Faep), isso se deve à grande oferta de grãos no mercado mundial.
“Houve alguma alteração no preço da soja, mas nada significativo. Tem oscilado demais por conta da oferta, que ainda se enxerga mundialmente como confortável do ponto de vista dos compradores. Nesse momento, em que os importadores se voltam para o nosso mercado, a oferta é muito ampla”.
O cenário é semelhante para as outras culturas, diz Ana Paula Kowalski, e os preços voltaram aos patamares de 2016 e 2017. “A conjuntura é de baixa nos preços dessas commodities. Viemos de três ou quatro anos de preços mais elevados, tivemos a pandemia e o cenário de guerra entre Rússia e Ucrânia, fatores que elevaram os preços, agora voltamos ao momento em que os valores voltaram aos patamares anteriores. Estamos voltando aos valores de 2016 e 2017”, disse. “Para o feijão temos visto alguma reação, porque houve uma queda expressiva, mas milho, soja e trigo o cenário não é favorável”.
A antecipação da colheita de soja deu um fôlego, mas a demanda ainda não foi aquecida. “Em janeiro exportamos muito, com um cenário que nunca tínhamos visto. Exportamos muito, mas a demanda ainda não aqueceu da forma como se esperava. Como a perspectiva é de um cenário de oferta confortável, não tem por que tem demanda se acelerar. Até o momento, não foi o suficiente para o mercado reagir”.
De acordo com Flávio Turra, gerente de Desenvolvimento Técnico da Ocepar, em fevereiro deste ano o preço médio da soja caiu 35% em comparação com fevereiro do ano passado.
“Em fevereiro de 2023, o preço recebido pelos produtores do Paraná era de R$ 158 por casa, agora é de R$ 105. Se compararmos com fevereiro de 2022 quando a casa custava R$ 160, a redução foi maior ainda”.
Falta de chuvas levou a antecipação da colheita de soja
A falta de chuvas e o forte calor levaram muitos produtores paranaenses a anteciparem a colheita da soja. Segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária, a colheita em janeiro, o que não é comum para esta época do ano, levou à exportação 1,2 milhão de toneladas, volume 282% maior que as 326,5 mil toneladas de janeiro do ano passado. Em valores, o crescimento foi menor em função da queda internacional no preço da commodity, de US$ 215,7 milhões em janeiro de 2023 para US$ 542,2 milhões em janeiro deste ano. O governo do Paraná confirmou que a quebra nas safras das principais culturas do estado se deve principalmente às condições climáticas enfrentadas pelos agricultores com calor intenso, pouca precipitação e má distribuição das chuvas pelo estado, principalmente depois da segunda quinzena de dezembro”. A Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento vem acompanhando a situação e deverá ter novos dados no fim de março.