Nessa época de crise, empresas concorrentes decidiram deixar de lado a disputa por mercado e se unir para enfrentar as dificuldades impostas pela queda no consumo e no faturamento. Nesse cenário, a união das empresas surge como uma estratégia de fortalecimento e uma forma de se manter em atividade em um período de tantas incertezas em relação ao futuro econômico do país. Em Londrina e região, grupos de indústrias de um mesmo setor somaram esforços para buscar novos caminhos e garantir a sobrevivência do negócio.

Em Carlópolis, no Norte Pioneiro, três fábricas de confecções viram a demanda cair a quase zero a partir de abril em razão das medidas de isolamento e distanciamento social necessárias para conter a disseminação do novo coronavírus. No lugar do desânimo, a dificuldade motivou os empresários a se unirem para prospectar novas oportunidades. Foi assim que a Zapzum, a Yellow Jeans e a Fábio Jeans conseguiram manter as atividades da indústria.

A Zapzum é subcontratada para confeccionar as roupas vendidas em duas grandes lojas de departamento do país. Os negócios iam bem até que, no final de março, as encomendas cessaram e praticamente parou a produção. A sócia-proprietária da empresa, Selma Pereira Lima, suspendeu os contratos de trabalho de 70% dos funcionários e apagou metade das luzes do setor para economizar energia.

A solução para o período de dificuldade surgiu da própria causa do problema. “As empresas simplesmente pararam de mandar serviço. Então, começamos a fazer máscaras. Fizemos alguns milhões de unidades e fomos descobrindo o mercado. Vimos que éramos capazes porque o que temos é valioso. Mão de obra, maquinário, o preparo. Vieram novos clientes. Fizemos macacões e aventais cirúrgicos e toucas. Não paramos de trabalhar nem um dia.”

“Nós nos juntamos para manter as atividades e os nossos funcionários. Não dispensei nenhum dos 150 trabalhadores. Uma parte teve a jornada e os salários reduzidos, mas agora em julho voltou todo mundo ao normal”, comentou o proprietário da Yellow Jeans, Ricardo José Luiz. “É um momento muito delicado e a gente tem que tentar se reinventar.”

Sobrevivência

Com a união, diz Lima, as empresas conseguiram melhorar “um pouquinho” a situação. Em julho, quase todo o pessoal já retornou ao trabalho embora 30% estejam com redução de jornada e de salários. “O jogo não está virado ainda não. Ainda estamos na sofrência. Mas já superamos o período mais difícil. Conseguimos sobreviver e estamos começando a ter mais trabalho. Imagino que quem fechou as portas não vai conseguir reabrir.”

Lima ressaltou que apesar de estarem no mesmo ramo de atuação e em uma cidade de apenas 14 mil habitantes, não existia troca entre ela e os parceiros. “Está sendo um aprendizado maravilhoso, uma experiência fantástica. Não tínhamos a ligação que temos, que é muito importante para nós, estamos muito unidos”, disse a empresária. “Foi tudo na loucura, mas está dando muito certo. Acredito que essa parceria perdure porque nos sentimos fortalecidos.”

Imagem ilustrativa da imagem Parcerias podem ser solução para enfrentamento da crise

Cervejarias

Em Londrina, três cervejarias seguiram pelo mesmo caminho. O setor de cervejas artesanais foi fortemente impactado pela pandemia e o faturamento das empresas no Estado chegou a cair 80% a partir de abril, segundo pesquisa realizada pela Procerva (Associação das Microcervejarias do Paraná). A soma da produção caiu de 799 mil litros por mês para 153 mil litros, uma redução também de 80%.

Diante da crise e sem perspectivas de retorno das festas e eventos, um dos melhores mercados para o setor cervejeiro, o diretor de Negócios da Cervejaria von Borstel, Marcus von Borstel, propôs parceria aos proprietários das cervejarias Morcelli e Geada Negra. “Em vez de ficar chorando nos cantinhos, vamos nos abraçar”, disse von Borstel. As três marcas se uniram e criaram a Quinta do Growler, que funciona pelo sistema drive thru. Em um único local, nas dependências da Morcelli Cervejaria, os clientes passam e pegam o chope das três marcas. Como o nome diz, a ação acontece sempre às quintas-feiras, das 16 às 20 horas. “Em um único ponto, o cliente consegue ter quase 20 rótulos de cerveja sendo oferecidos”, explicou von Borstel.

Outra iniciativa é o Juntos no Delivery do Chope, que funciona pelo aplicativo GoomerGo, com entregas on-line. “O cliente entra em um único lugar, pede uma única vez, recebe as três marcas e não paga três fretes. Com isso, também ganhamos em logística”, destacou von Borstel, lembrando que as ações resultantes da parceria garantem a empregabilidade do setor, incentivam a produção e impulsionam a economia local.

Preços tabelados

“Antes de sermos concorrentes, somos amigos”, enfatizou o sócio-proprietário da Morcelli Cervejaria, Juliano Morcelli. Durante a Quinta do Growler, os valores dos produtos são tabelados para que não haja competitividade por preço. A ação começou em 7 de julho e a avaliação dos resultados é positiva. “Esse cenário (de pandemia) veio para que nos reinventássemos. No início dessa semana começamos a pensar em algo mais duradouro. E o espaço da nossa fábrica já foi pensado para a realização de eventos. Juntando as cervejarias, vendo que a parceria está dando certo, por que não continuar? Nossos produtos não brigam entre si.”

“A ideia dessa parceria é para mantermos o mínimo necessário funcionando. No caso da von Borstel, foi questão de sobrevivência. A união veio para minimizar custos e conseguir vender. É uma saída. Juntos, o que gastávamos R$ 1, agora cada um paga um terço, R$ 0,35. A maior economia foi com logística”, calculou von Borstel.

Modelo colaborativo deve sobreviver à crise

A parceria estratégica entre empresas de um mesmo setor com o intuito de sobreviver a um momento de dificuldade, como fizeram as indústrias de confecção de Carlópolis e as cervejarias de Londrina, pode ser uma boa tática para o ganho de produtividade, ampliação do mercado e manutenção dos funcionários, afirmou o consultor do Sebrae, Odemir Capello. O trabalho colaborativo também pode funcionar para conseguir melhores preços na compra de insumos, compartilhar know how, recursos humanos e tecnologia.

Capello ressalta, porém, que é preciso ter cuidado ao entrar em um novo segmento. No caso de indústrias de confecção que deixam de produzir roupas para fabricar máscaras de proteção, por exemplo, é fundamental se atentar para as especificações exigidas pelas autoridades de saúde. “Se produzir um produto fora dos padrões e o mercado não comprar, em vez de ter um faturamento, pode até antecipar um problema financeiro”, alertou o consultor. “Essa mudança (na produção) não é tão rápida assim e alguns setores têm mais facilidade de fazer a migração.”

Quando há a formalização dessas parcerias e se estabelece o associativismo, os resultados podem ser bastante positivos para a economia da empresa. Na compra de matérias-primas, por exemplo, a união de várias empresas de um mesmo setor se revela bem mais vantajosa porque as entidades podem fazer a intermediação entre fornecedores e compradores. “Mas além disso, a questão do associativismo permite que as empresas tenham respostas mais rápidas aos seus pleitos e tenham acesso mais rápido às informações porque a função do sindicato é a defesa do interesse das categorias”, analisou a gerente de Relações Sindicais da Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), Juliana Bacarin.

Em um momento de crise, essa forma de organização se mostra muito eficiente, mas Bacarin afirma que o modelo funciona sempre, independente das circunstâncias. “Vai das empresas identificarem onde há interesses convergentes em que podem trabalhar juntas. O coletivo é sempre melhor que o individual. Acredito que essa dinâmica irá sobreviver depois da crise.”