As medidas de isolamento e distanciamento social afetaram drasticamente alguns setores econômicos enquanto outros viram surgir novas oportunidades decorrentes de mudanças de hábitos de consumo e conduta social. Estudo realizado pelo Observatório Sistema Fiep compilou dados relacionados ao impacto da pandemia do novo coronavírus na oferta e demanda de produtos e serviços e traçou um panorama das novas perspectivas de comportamento do consumidor. O resultado mostra uma menor propensão dos brasileiros a consumir bens duráveis, lazer e entretenimento fora de casa e revela uma população mais preocupada com medidas de higiene pessoal e de limpeza.

Imagem ilustrativa da imagem Pandemia muda padrões de consumo e exige adaptações das empresas
| Foto: Gustavo Carneiro

Com o objetivo de auxiliar os empresários paranaenses a se posicionarem diante da pandemia, o estudo reuniu um conjunto de pesquisas nacionais e internacionais realizadas entre março e maio de 2020 por grandes empresas de consultoria e, a partir delas, identificou as alterações na contratação de serviços e no padrão de consumo, tendências de mercado e as atividades econômicas mais impactadas. As medidas de isolamento social impulsionaram o abandono de alguns costumes para dar lugar a novos hábitos.

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| Foto: Folha Arte

Um dos maiores impactos foi na vida social dos brasileiros, revela o estudo. Com os decretos publicados por governos estaduais e municipais impondo restrições às atividades econômicas, cerca de 20% da população do país vêm adotando medidas de isolamento total e 57%, de isolamento social, saindo às ruas apenas para as atividades essenciais, como ir ao supermercado e à farmácia. Como resultado da maior permanência dentro de casa, 63% têm passado mais tempo na internet, 46% relataram que estão comendo mais e 61% disseram ter reduzido as horas de sono.

O estudo revela algumas novas formas de uso da internet. Desde o início da pandemia, 32% começaram a jogar on-line, 20% aderiram às reuniões por videoconferência, 18% iniciaram cursos on-line, 15% começaram a utilizar a internet para estudar, 15% passaram a fazer suas compras por meio de sites e 7% se submeteram a consultas médicas virtuais. O uso dos serviços de streaming e TV também cresceu significativamente a partir de março.

Em relação à prestação de serviços, a crise sanitária resultou no cancelamento ou suspensão de contratações, sendo mais afetados os serviços de manicure (88%), faxineira (85%) e cabeleireiro (82%). O que teve menor percentual de cancelamento ou suspensão foi o serviço de cuidador de idosos (60%).

Quando se observam as mudanças nos padrões de consumo, fica evidente a maior procura por itens de alimentação e também de higiene pessoal e de limpeza. Entre os entrevistados, 40% responderam ter aumentado o consumo de produtos de limpeza, 37% de higiene pessoal, 28% de frutas, verduras e legumes e 17% de outros alimentos.

Prioridades

“A gente percebe que o consumidor está mais cuidadoso com o uso que faz dos seus recursos financeiros, se voltando para o básico, para o que é fundamental. E, em um primeiro momento, o absolutamente fundamental são a alimentação e os cuidados com a saúde, duas frentes priorizadas pelos consumidores”, analisou a gerente executiva do Observatório Sistema Fiep, Marilia de Souza.

Nesse período, as vendas de roupas, calçados e outros bens duráveis, como automóveis, despencaram. Em contrapartida, pelo fato de as pessoas passarem mais tempo dentro de casa, voltaram a atenção à necessidade de melhorias no lar. Consertos, serviços de manutenção, internet mais rápida, computadores, tablets e smartphones mais avançados entraram na lista de prioridades. “O comércio não está parado. Existe uma transformação do que é considerado prioridade”, disse Souza.

Para manter ou atrair novos clientes, sugere a gerente executiva, os empresários têm de se adaptar e começar a ofertar produtos e serviços para consumidores que passam períodos mais longos em casa, sem deixar de lado as medidas de segurança para evitar a disseminação do novo coronavírus. Neste sentido, a tecnologia surge como uma forte aliada. Aderir ao e-commerce e facilitar o pagamento por meio de máquinas de cartão podem ajudar a manter o negócio em atividade.

Novo patamar

Superintendente da Apras (Associação Paranaense de Supermercados), Valmor Rovaris observou que passados os primeiros dias da pandemia, quando houve uma explosão na venda de produtos básicos, como arroz, feijão, leite e papel higiênico, alavancando em cerca de 12% as vendas em relação ao mesmo período do ano passado, hoje o volume de vendas do varejo se normalizou. No entanto, ressaltou ele, é possível notar mudanças nos itens consumidos. “As pessoas deixaram de ir comer fora e passaram a cozinhar mais em casa. A gente percebe aumento nas vendas de bebidas alcóolicas, carnes, legumes e verduras. Mas também cresceu o consumo de produtos de limpeza”, disse.

A maior mudança, no entanto, apontou Rovaris, é na forma de consumir. Ele acredita que o empobrecimento de grande parte da população se reflete em um maior planejamento dos gastos e que as vendas pela internet vieram para ficar. “O comércio mudou de patamar. Vai haver uma evolução muito grande nesse sentido. Esse processo vai ser um ‘novo normal’ que irá requerer um aprendizado.”

‘Novo normal’ será marcado por reconexões afetivas, diz consultor

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| Foto: Folha Arte

Alguns setores deverão ter mais dificuldade para encontrar soluções para se adequar aos novos padrões de consumo. As concessionárias de veículos são um exemplo de comércio que sofreu um forte impacto nas vendas com a pandemia. “Para alguns, é mais complicado pela própria tipologia do produto, terão que fazer uma reestruturação do modelo de negócio e, às vezes, serão necessárias até mudanças jurídicas. Uma revenda de automóveis pode pensar em oferecer serviço de locação neste momento que a compra de um novo veículo foi postergada. São reflexões que precisam ser feitas porque é um fenômeno de longa duração. Enquanto não tivermos uma vacina, não teremos um processo de retomada da normalidade”, avalia a gerente executiva do Observatório Sistema Fiep, Marilia de Souza.

O Sebrae PR publica guias de tendências de comportamento de consumo para ajudar os empresários a se alinharem a esse novo momento, além de palestras, workshops e apoio on-line. “O que vem bastante forte é a transformação digital e sempre que a gente fala em tendências, a gente fala em se adiantar às mudanças”, destacou o consultor do Sebrae PR em Curitiba, Mauricio Reck.

A entidade até disponibiliza ferramentas gratuitas que auxiliam empreendedores a digitalizarem todos os processos do negócio, a encontrarem as melhores linhas de crédito e a compararem as vantagens e desvantagens de cada máquina de cartão. “Sempre se dá bem quem consegue fazer melhor gestão de risco e de crise, enxugando custos. É possível fazer a transformação digital sem gastar dinheiro”, apontou. “O home office vai mudar muito a forma como entendemos o ambiente de trabalho, que sempre foi um ambiente de prestação de contas, onde você mostrava que estava trabalhando, e agora se torna mais um ambiente de colaboração ou confraternização. Os paradigmas vão mudar bastante”, disse Reck.

Estar on-line, mesmo que seja apenas pelo WhatsApp, sem fazer grandes investimentos, estabelecer parcerias que ajudem a dar visibilidade à empresa e traçar um plano B são as dicas do consultor para conseguir sobreviver à crise. “Todos estamos em um momento atípico e todo mundo sonha no que vai fazer quando a pandemia acabar, mas não sei se vai existir esse momento de ruptura porque a abertura vai ser gradual. Mas o novo normal será de reconexão afetiva. É o momento de os empresários pensarem em como o consumidor pode se conectar afetivamente com o seu negócio. Podem ser clientes antigos ou novos”, frisou Reck.