Em um ano, o número de mulheres que investiram no mercado de ações mais que dobrou. Segundo dados da B3, em agosto de 2019 eram 295.514 mulheres registradas na Bolsa. Em 2020, elas somaram 742.719 cadastros, apresentando um crescimento de 151%. Apesar do aumento, a participação feminina representa apenas 25% do total de investidores, mas elas acreditam que podem mudar as estatísticas se tiverem mais incentivo.

Imagem ilustrativa da imagem Número de mulheres na Bolsa cresce 151% em um ano
| Foto: Roberto Custódio

“Comecei a investir em 2019. O que mais me chamou a atenção foi o fato de que poderia tem uma maior rentabilidade com o dinheiro parado na poupança. E que poderia alcançar em um tempo menor os meus objetivos financeiros”, comenta Rosiele Damião do Nascimento, 28.

Já no início, a farmacêutica bioquímica entrou no modelo de renda variável, após adquirir conhecimento sobre o assunto na internet. Para ela, foi fundamental a popularização do assunto para que compreendesse o mercado como um universo possível para si. “Antes, eu tinha em mente que investimentos eram para pessoas com um grande patrimônio. Após acompanhar os vídeos da Nathalia Arcuri, vi que seria possível começar a investir mesmo com pouco conhecimento”, cita.

REPRESENTATIVIDADE

Nathalia Arcuri é uma jornalista à frente do canal Me Poupe!, no Youtube, e já conta com 5,33 milhões de inscritos acompanhando seus vídeos sobre finanças. Como uma das figuras femininas mais conhecidas no ramo, ela acaba trazendo representatividade para que mais mulheres se reconheçam como capazes de gerirem suas carteiras de forma independente.

"As mulheres possuem ainda dentro de si um tabu de que investimentos são para homens, pois, muitas vezes, são os pais (homem) os provedores de renda dentro de casa e quem administra o patrimônio da família. Nos tempos atuais, nós mulheres estamos abrindo a cabeça e começando a entender sobre investimentos”, afirma.

Mas ainda é raro. A farmacêutica conta que no seu círculo de amizade poucas possuem interesse em investir na Bolsa, no entanto, vê o movimento crescente de mulheres iniciando o próprio negócio, o que exige conhecimento de finanças. Para ela, a busca por esse conhecimento é o primeiro passo de amadurecimento para que encontrem novos caminhos rumo à liberdade financeira.

ABERTURA DE CONTAS

Autonomia que 2.568 mulheres paranaenses encontraram ao abrirem suas contas no mês de agosto de 2020, somando 42.875 cadastros de investidoras ativos. No mesmo mês de 2019, eram apenas 16.111 paranaenses no mercado de ações. Na época, uma taxa de 20% do total no Estado.

Para alavancar esses dados, Nascimento defende que mulheres devem incentivar outras e afirma já fazer a sua parte. “Nós mulheres que investimos precisamos sim aconselhar outras amigas a investirem, pois ensinando também aprendemos muito. A troca de experiência nos faz crescer absurdamente, juntas chegamos mais longe”, estimula.

Incentivo que Samantha Ortega de Souza, 29, recebeu por meio do irmão, um investidor curioso sobre o tema. Por meio dele, passou a ter contato com assunto, a buscar informações e a entender como funciona. Ela investiu no ano passado, precisou recuperar o valor, mas voltou aos investimentos há três meses.

“Eu comecei mais conservadora. Procurei um assessor, porque eu não consigo acompanhar tudo que está acontecendo o tempo todo, então o assessor vai passando o relatório e me explica, eu vou acompanhando como posso”, menciona. O modelo a deixou mais segura para iniciar no mercado.

Isso não quer dizer que a empresária não entenda sobre o que acontece no mundo das finanças, ela quem decidiu pelo mercado de ações para diversificar a carteira. “O que me chamou a atenção é que dá mais rentabilidade, tem um risco maior, mas eu acho interessante. Eu acho que o certo seria todo mundo ter um dinheiro na Bolsa, o Brasil está começando agora a criar essa cultura”, aponta.

Para ela, o fato de ter menos mulheres abrindo contas tem a ver com comportamento e cultura. “Eu acho que o homem tem mais o perfil de se arriscar, as mulheres que eu conheço são mais conservadoras. Porém, muitas nem sabem que existem formas de investir de maneira segura também”, afirma.

Souza diz que está em um ambiente incomum, pois as amigas ainda não descobriram ou não se sentem confortáveis para aplicarem o dinheiro. Ela diz que a própria mãe possui receio em trabalhar com carteira diversificada, mas com os filhos investindo, está mais convencida a iniciar. O que para a empresária é um ganho. “Eu aconselho, eu acho que é interessante, mas tem que ler bastante, estudar ou ter alguém de confiança para ajudar. Tendo isso, eu aconselho, é um meio legal para investir.”

INFLUÊNCIA

Se o número de investidoras ainda é baixo, a representação no mercado financeiro não é diferente. Vitória Bettin, 21, é assessora de investimentos na Bravus Investimentos, escritório credenciado pela XP em Londrina, e comenta que ainda existe no mercado um número baixo de assessoras mulheres e que há muitos fatores envolvidos, um deles é a mesma barreira cultural vivenciada pelas investidoras.

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| Foto: Folha Arte

“Eu acho que, antes de tudo, começa com histórico de homens que cuidam do dinheiro familiar. Depois, as mulheres tendem a achar que esse é um assunto difícil, que precisa de muita matemática e mulheres, no geral, já não são incentivadas nesse aspecto. Tem muita cultura de que isso não é para elas”, argumenta.

O mercado mostra que não só é, como elas também podem trabalhar e agregar ao mercado. “Já existem pesquisas mostrando que fundos com pelo menos um terço de mulheres na equipe de gestão rendem mais do que aqueles sem mulheres no quadro”, comenta. O estudo mencionado é o do banco Goldman Sachs, de 2020.

Bettin afirma que, mais do que incluir mulheres nas vagas de trabalho, é preciso desenvolvê-las para que ocupem cargos de liderança. Como assessora há dois anos, percebe o comportamento das mulheres que investem. “É comum encontrar homens investindo em nome das mulheres, de suas esposas ou filhas, para separar as contas. Estão no nome delas, mas são eles que controlam, porque elas acreditam não terem conhecimento suficiente, não acreditam serem capazes e deixam na mão deles”, afirma.

No entanto, vê tendência de crescimento da participação das mulheres controlando suas carteiras de forma independente. Isso porque há mais pessoas falando sobre o assunto e elas estão se posicionando. “Betina Roxo, economista chefe da Rico; Nathalia Arcuri, jornalista da área de finanças; Adena Friedman, CEO da Nasdaq; elas e muitas outras são líderes do mercado e influenciam outras mulheres também”, afirma.

Isso leva a se interessarem pelo assunto e descobrirem as possibilidades e, no momento atual, com a taxa de juros baixa, é comum acompanharem o mercado e migrarem para a renda variável. Informação e conhecimento fundamentais para seguirem suas escolhas e gerirem suas carteiras com mais autonomia. “Elas precisam ser mais estimuladas a cuidarem das suas finanças, a cuidarem do seu dinheiro, porque isso é independência, liberdade. Nós precisamos desenvolver o mercado financeiro para mulheres no geral”, aponta.