Com baixa taxa de natalidade e a população ficando mais velha, o Japão tenta atrair trabalhadores de outros países para ocupar as vagas de emprego ociosas, principalmente na indústria. Atualmente, o país contabiliza mais de dois milhões de profissionais estrangeiros, que correspondem a 3% da sua força de trabalho total. E todos os meses, milhares de pessoas, a maioria delas originárias de nações menos desenvolvidas, desembarcam no Japão levadas pela esperança de melhores condições salariais. O mercado de trabalho japonês ainda compensa financeiramente, mas a desvalorização do iene, o endurecimento das leis trabalhistas e o aumento das exigências para ingresso no país dificultam os planos de quem emigra com o intuito de acumular capital rapidamente.

Iniciado entre o final da década de 1980 e os primeiros anos da década de 1990, o movimento de decasséguis brasileiros nunca cessou no Japão. Há 35 anos, o Brasil enfrentava a hiperinflação e o alto nível de desemprego, fatores que impulsionaram milhares de descendentes de japoneses a realizarem o caminho inverso feito no começo do século 20 por seus pais e avós, buscando no Oriente melhores chances de trabalho e de vida. A descendência japonesa era a chave de acesso à oportunidade de trabalhar arduamente por um ou dois anos para então retornar ao Brasil com dinheiro suficiente para realizar alguns sonhos materiais.

A partir dos anos 2000, o controle inflacionário e a melhora da economia brasileira tiveram impacto nesse fluxo migratório, que diminuiu. Hoje, há uma estabilidade na procura de trabalhadores brasileiros por vagas no Japão. “Essa questão do trabalho no Japão é constante. Sempre há pessoas querendo ir. Tivemos uma interrupção durante a pandemia de Covid-19, mas após esse período, as pessoas voltaram e atendemos uma média de 120 candidatos por mês”, disse a gestora da unidade de Londrina da Itiban Empregos no Japão, Elizabeth Sayuri Kwano. A agência também atua em Maringá, São Paulo e em cidades do interior paulista.

Kwano, que há duas décadas acompanha a ida dos decasséguis ao Japão, aponta as mudanças percebidas ao longo do tempo. Ela observa uma preocupação maior do governo japonês com o acolhimento aos estrangeiros e com a questão da segurança no trabalho, além do maior rigor no cumprimento das leis trabalhistas, que impedem as jornadas muito exaustivas. “Antes, as pessoas iam sem noção do que iriam encontrar. Saíam de uma comodidade para irem para um país sem saberem nem onde iriam dormir. Hoje, as condições estão muito mais favoráveis aos decasséguis. O mundo passou por um avanço muito grande nesses 30 anos. Não tem como receber os trabalhadores e não dar condição favorável de acolhimento. E o perfil dos trabalhadores também mudou. Hoje, uma das principais preocupações de quem está indo é saber quais são os seus direitos. Não é porque é estrangeiro que está desprotegido em relação aos direitos trabalhistas.”

O londrinense Marcelo Mitio Sugeta Oshima conhece as duas realidades vividas pelos decasséguis no Japão. Assim como muitos de sua geração, ele partiu para o Oriente em 1997, aos 20 anos de idade e recém-formado em programação de sistemas. A faculdade foi paga com o dinheiro enviado pela mãe, que trabalhava em uma indústria de alimentos japonesa. Com o diploma nas mãos e dois irmãos mais novos prestes a ingressar na universidade, Oshima assumiu a responsabilidade de custear os estudos dos irmãos e rumou para o Japão para que a mãe pudesse retornar ao Brasil. Desde então, nunca mais voltou.

“A gente pensou que eu iria ficar um, dois, três anos, no máximo, e já voltava para o Brasil. Mas não é simples assim. No tempo que você fica fora do mercado brasileiro, muita coisa muda”, comentou Oshima, que começou como empregado em uma fábrica de autopeças e hoje, atua em uma agência de empregos na cidade de Sakado, na província de Saitama, onde ajuda os brasileiros a encontrarem uma vaga no mercado de trabalho.

Oshima afirma que as condições de trabalho melhoraram ao longo de todos esses anos, mas como resultado dessa mudança, os ganhos dos decasséguis caíram. Com um alto índice de casos de depressão e suicídio, relacionados ao ritmo intenso de trabalho, o governo japonês passou a exigir maior rigor na obediência à legislação trabalhista que, entre outras determinações, reduziu as horas extras. Embora a medida tenha tornado menos desumana a rotina dos trabalhadores, os ganhos também caíram.

SALÁRIO MÉDIO

Hoje, os trabalhadores estrangeiros também são obrigados a pagar impostos municipais e a ingressar no seguro social, que inclui seguro saúde e aposentadoria, sob pena de não ter o visto renovado. Assim, 20% do que ganham retornam aos cofres públicos. Outra dificuldade é a desvalorização da moeda nacional. O salário médio de um operário em uma fábrica de eletrônicos ou autopeças, dois dos setores que mais empregam estrangeiros, fica em torno de 200 mil ienes, o que corresponde a menos de US$ 1,2 mil. “Tem região que paga menos, tem região que paga mais. Perto de Tóquio, o salário é maior, mas o custo de vida também é mais alto”, disse Oshima.

Descontando-se os 20% dos impostos municipais, cerca de 40 mil ienes com o aluguel de um imóvel de um quarto e 30 mil ienes com alimentação, além dos gastos com água, luz e gás, não sobra muito para poupar. E muitos brasileiros ainda financiam os custos com viagem, o que compromete parte da renda. Ou seja, fazer um bom pé de meia no Japão ainda é possível, mas leva muito mais tempo. “O custo de vida japonês está muito alto. As fábricas de alimentos ainda mantêm apenas um dia de folga, mas nas indústrias de autopeças e de eletrônicos, são dois dias de folga, o que fez diminuir a renda, embora nestes dois setores o valor-hora seja maior”, ressaltou Oshima. “A realidade, hoje, é diferente. Se quiser ficar um ano e voltar para o Brasil com muito dinheiro, pode esquecer.”

A vez da quarta geração

As exigências do governo japonês para o ingresso de yonseis – descendentes da quarta geração – no país, também são um outro obstáculo apontado pelas agências recrutadoras. Para estes imigrantes, o conhecimento da língua japonesa, tanto leitura quanto conversação, é fundamental. O certificado de proficiência em japonês deve indicar nível quatro ou cinco.

“O Japão dispõe de muitas vagas, mas essa exigência imposta aos descendentes da quarta geração tem dificultado demais o encaminhamento de trabalhadores para o país”, lamentou o proprietário da agência Alpha – Empregos no Japão, em Londrina, Vilmar Faust Lo.