RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Os efeitos da pandemia do novo coronavírus sobre a atividade econômica se espalharam em abril, atingindo mesmo aqueles segmentos que haviam resistido às primeiras semanas de isolamento em março, como supermercados, farmácias e a fabricação de produtos de higiene e limpeza.

As projeções são parte de estudo divulgado nesta quarta (27) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), com base em indicadores sobre transações comerciais e pesquisas qualitativas. O documento estima recuos de 36,1% na produção industrial, de 28,4% nas vendas do comércio e de 23,7% nos serviços.

"São números nunca vistos nas séries históricas", diz o diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicos do Ipea, José Ronaldo Souza Júnior. O estudo será feito a cada mês, para tentar antecipar os impactos e ajudar na elaboração de políticas para a recuperação econômica.

As projeções do instituto aprofundam os primeiros efeitos já mostrados nos indicadores de março do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Naquele mês, o setor de serviços (-6,9%) teve o pior desempenho da história (-6,9%); as vendas do comércio (-2,5%), o pior março desde 2003; e a indústria (-9,1%), só não foi pior do que na greve dos caminhoneiros.

Os dados do Ipea indicam a deterioração da atividade econômica brasileira no primeiro mês do segundo trimestre de 2020, cenário reforçado pela divulgação de dados do emprego nesta quarta, que mostraram o fechamento de 1,1 milhão de vagas formais desde o início da pandemia. O PIB do primeiro trimestre será conhecido nesta sexta (29).

"A implementação de medidas de isolamento, que ganharam destaque nos últimos dez dias de março, a paralisação de uma ampla gama de atividades produtivas, juntamente com a queda das demandas interna e externa, vêm causando forte retração nos indicadores setoriais", diz o estudo divulgado nesta quarta.

O instituto diz que, entre os indicadores usados para elaborar as estimativas da indústria, houve queda disseminada, com destaque para a produção de automóveis (-95%), o fluxo de caminhões nas rodovias (-19,1%) e o nível de utilização da capacidade da indústria de transformação (-23,9%).

O Ipea espera que, mesmo a indústria de produtos de limpeza e perfumaria, uma das poucas atividades a se salvar em março, com alta de 0,5% na produção, fechará abril em queda de 2,7% sobre março. Segundo o estudo, "chama atenção o acumulo de estoques verificado entre dezembro último e abril deste ano".

A produção de celulose e papel, que avançou 0,3% em março, beneficiada por uma corrida por estoques de papel higiênico e maior demanda por embalagens, deve registrar recuo de 1,4% em abril, na comparação com o mês anterior.

Já a indústria de alimentos, que teve queda menor em março (0,5%), diante da corrida de consumidores aos supermercados em busca de mantimentos para a quarentena, deverá fechar abril com recuo de 14,7%, segundo o instituto.

No comércio, supermercados e farmácias haviam resistido à deterioração geral da atividade em março, com o aumento da procura por alimentos para refeições em casa e por produtos de limpeza e higienização. Os primeiros deve reverter a alta de 14,6% para recuo de 5%. As farmácias, que avançaram 1,3%, devem cair 10,5%.

O diretor do Ipea pondera que, mesmo com a queda em abril, o setor de supermercados ainda mantém um patamar de vendas maior do que antes da pandemia, já que a projeção de recuo da atividade no mês passado não elimina todo o ganho do mês anterior.

No caso das farmácias, diz ele, o desempenho em abril pode estar relacionado também à menor buscar por medicamentos em geral, já que as pessoas estão deixando de ir ao médico para tratamento de outras doenças durante a pandemia.

Segmentos da indústria e do comércio relacionados a produtos considerados supérfluos, que dependem de crédito ou do comércio de rua se afundam ainda mais. São os casos da indústria de informática e eletrônicos, que deve cair 33,1% nas projeções do Ipea, vestuário (-14,4%) e couros e calçados (-6,6%).

No comércio, considerando o conceito de varejo ampliado, que inclui as vendas de automóveis, a queda deve chegar a 34,7%, com grande contribuição do comércio de veículos que teria recuado 62,2% nas vendas em abril, diz o instituto.

Já no segmento de serviços, apesar do recorde negativo em março, com resultados negativos em todas as atividades pesquisadas, a deterioração tende a se aprofundar em abril, com recuo de 23,7% em relação ao mês anterior, segundo projeção do instituto.

Pressionados pelas restrições à abertura dos estabelecimentos, os serviços prestados às famílias, atividade que inclui hotéis, restaurantes e atividades de lazer, deve ter recuo de 44,3%. Os serviços de transportes devem registrar recuo de 54,1%. Nessa categoria, enquadram-se os serviços prestados pelas companhias aéreas, por exemplo.