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Economia 5m de leitura

Juiz determina que banco não empreste sem manifestação por escrito

Mais de uma centena de pessoas idosas não tinham sequer conhecimento da contratação do empréstimo consignado

ATUALIZAÇÃO
25 de outubro de 2022

Vítor Ogawa - Grupo Folha
AUTOR

Imagem ilustrativa da imagem Juiz determina que banco não empreste sem manifestação por escrito

O juiz da 4ª Vara Cível de Curitiba, José Eduardo de Mello Leitão Salmon, determinou na quinta-feira (20), liminarmente, que o Banco BMG não libere mais empréstimos consignados para consumidores que não tenham manifestado declaração de vontade, por escrito, de contrair o empréstimo. A decisão foi concedida após o Nudecon (Núcleo de Defesa do Consumidor) da DPE-PR (Defensoria Pública do Paraná) ajuizar uma ação contra o Banco BMG, que teria lesado mais de uma centena de pessoas idosas que não tinham sequer conhecimento da contratação do empréstimo, número que pode escalar para milhares de pessoas, segundo o coordenador do Nudecon, o defensor público Erick Lé Palazzi Ferreira. 

Além de violar o Código de Defesa do Consumidor, a prática viola também o Estatuto da Pessoa Idosa e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
 

O prejuízo estimado pelo Nudecon até o momento passa dos R$10 milhões. “Esses cem casos foram das pessoas que entraram em contato com a gente, mas um advogado me procurou e só ele tinha mais de 500 casos semelhantes. Também houve uma ação civil pública em Nova Londrina contra essa mesma empresa, que eram quase 100 casos. A gente não conseguiu quantificar em todo o Estado, a não ser em Curitiba. Foram mais de 300 no Procon da capital paranaense até o ano passado.” 

O Nudecon assumiu o caso em 2021, após uma magistrada do município de Quedas do Iguaçu atuar em um processo individual naquela cidade, em que uma idosa processou o mesmo banco pela mesma prática. De acordo com Ferreira, a magistrada percebeu que a prática poderia ser recorrente, por isso, informou o núcleo. A equipe da Defensoria começou a ouvir as vítimas e a colher elementos que pudessem embasar a ação civil pública que foi posteriormente ajuizada. “Em Quedas do Iguaçu foram mais de 50 casos na comarca”, destacou Ferreira.

O coordenador ressaltou que o problema vai além do desconto realizado diretamente na fonte dos empréstimos não autorizados. De acordo com ele, há casos relatados de consumidores que não aceitaram a contratação do empréstimo e não receberam o cartão consignado, mas que ainda assim sofreram descontos em sua fonte de renda. Há também casos de consumidores que aceitaram o empréstimo consignado, mas, na verdade, tratava-se de um contrato para a obtenção do cartão de crédito consignado. Além disso, também foram encontrados casos em que a pessoa idosa aceitou o cartão de crédito, não fez o desbloqueio e, mesmo assim, houve um depósito em conta e, sucessivamente, a cobrança. 

“Eles ligavam para os idosos, que não aceitavam o cartão de crédito consignado e mesmo assim faziam o depósito na conta do idoso e faziam o contrato. Eles são abordados por representantes comerciais que trabalhavam por comissão e eram terceirizados.” Ferreira ressaltou que o Nudecon enviou ofício ao banco requisitando informações e o banco não se manifestou e nem respondeu. “Para o direito do consumidor não importa se esse contrato é feito por agente terceirizado ou não, pois o  banco é o responsável, porque o contrato foi com o banco. Logo, ele é o responsável por contratar os terceirizados ou os seus representantes e deve exigir deles que cumpram a legalidade.”

Outro padrão de abordagem ocorria quando funcionários ofertavam crédito consignado padrão, com valores fixos de parcela, por meses fixos e com prazo determinado para o fim do contrato. O idoso aceitava o crédito, mas depois de muito tempo  descobria que era um cartão de crédito consignado que liberava o limite do cartão e faziam o desconto da margem consignável direto do benefício do idosos. “O banco só descontava o mínimo da fatura, e dessa forma o empréstimo nunca se pagava. Tem idoso pagando há seis anos só o mínimo e ainda está devendo a totalidade do valor da dívida”, declarou.

A Justiça indeferiu, no entanto, o pedido da Defensoria pela imediata suspensão dos descontos realizados nos benefícios previdenciários e nos vencimentos de consumidores(as) que não tenham manifestado, por escrito, declaração de vontade para a contratação do cartão de crédito consignado” e a “imediata suspensão dos descontos realizados nos benefícios previdenciários e nos vencimentos dos consumidores que não receberam o cartão ou que, mesmo recebendo, não desbloquearam o cartão. Apesar disso, o magistrado fixou multa de R$ 1 mil, limitada no máximo até R$ 100 mil, em caso de descumprimento da decisão, da qual cabe recurso. "Indeferiu de forma abstrata para todos os consumidores nesta situação, mas está aberta a possibilidade de comprovar isso individualmente e fazer o pedido de suspensão, ou seja, pode ser revista para cada consumidor. Por exemplo, se um consumidor que acabou de ser vítima tem a comprovação que no caso dele aconteceu isso, seria como se fosse pedido uma nova liminar para que, no caso dele, a cobrança seja suspensa. A gente está fazendo o atendimento desses casos." 

Ele orientou aqueles que já contraíram o contrato sob essa condição que a ação do Nudecon já está pedindo ressarcimento para essas pessoas em todo o Estado. "Quem fez a contratação sem querer,  haverá a nulidade do contrato, a devolução em dobro do dinheiro e incidirá a penalização por dano moral, que abrange todos os consumidores do estado que estejam na mesma situação."

"Para quem foi enganado pensando que era um contrato de empréstimo consignado com início e fim, a gente pediu para seja averiguar qual a taxa média do mercado aplicada para aquele consignado na época da contratação e que seja feito o cálculo se foi pago ou não esse valor para que seja dividida as parcelas no tempo correto. São empréstimos não tão altos de R$ 1 mil ou R$ 2 mil que deveriam ter o tempo em que deveria ser pago. Nesse caso a devolução deve ser o dobro do valor pago a mais, fora a indenização por dano moral."

O Nudecon assumiu o caso em 2021, após uma magistrada do município de Quedas do Iguaçu atuar em um processo individual naquela cidade, em que uma pessoa idosa processou o mesmo banco pela mesma prática. De acordo com Ferreira, a magistrada percebeu que a prática poderia ser recorrente, por isso, informou o Núcleo. A equipe da Defensoria começou a ouvir as vítimas e a colher elementos que pudessem embasar a Ação Civil Pública que foi posteriormente ajuizada. 

Segundo Ferreira, a prática, além de violar o Código de Defesa do Consumidor, viola também o Estatuto da Pessoa Idosa e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

O consumidor que foi vítima de situação semelhante pode procurar o Nudecon pelo telefone (41) 99232-2977 ou pelo e-mail nudecon@defensoria.pr.def.br.

OUTRO LADO

Por meio de nota, o Banco BMG informou que, até o momento, não recebeu formalmente a intimação da referida decisão relatada na matéria, e que se manifestará nos respectivos autos assim que a recepcionar.

"O BMG aproveita para reiterar que cumpre detidamente toda a regulação e autorregulação bancária, bem como as legislações aplicáveis, preservando a excelência no atendimento e a ética com transparência.”

A Febraban afirmou que não compactua com práticas que desrespeitam os direitos dos consumidores e não vai permitir que más condutas prejudiquem a imagem de todo o setor. A carteira de empréstimo consignado atingiu, em agosto, R$ 560,9 bilhões, um aumento de 14,0% em relação ao mesmo mês do ano anterior, e representa importante fonte de recursos de baixo custo aos consumidores, e forte motor da economia.

 Juntamente com a ABBC (Associação Brasileira de Bancos), a Febraban lançou em janeiro de 2020 a Autorregulação do Crédito Consignado com um conjunto de medidas para aperfeiçoar a qualidade da oferta e contratação empréstimo consignado, coibir o assédio comercial e melhorar o relacionamento com os clientes, evitando conflitos de consumo. Desde a sua criação até agosto de 2022, já foram aplicadas 1.002 sanções contra correspondentes bancários.

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