O juiz da 4ª Vara Cível de Curitiba, José Eduardo de Mello Leitão Salmon, determinou na quinta-feira (20), liminarmente, que o Banco BMG não libere mais empréstimos consignados para consumidores que não tenham manifestado declaração de vontade, por escrito, de contrair o empréstimo. A decisão foi concedida após o Nudecon (Núcleo de Defesa do Consumidor) da DPE-PR (Defensoria Pública do Paraná) ajuizar uma ação contra o Banco BMG, que teria lesado mais de uma centena de pessoas idosas que não tinham sequer conhecimento da contratação do empréstimo, número que pode escalar para milhares de pessoas, segundo o coordenador do Nudecon, o defensor público Erick Lé Palazzi Ferreira.

Além de violar o Código de Defesa do Consumidor, a prática viola também o Estatuto da Pessoa Idosa e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
Além de violar o Código de Defesa do Consumidor, a prática viola também o Estatuto da Pessoa Idosa e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. | Foto: iStock

O prejuízo estimado pelo Nudecon até o momento passa dos R$10 milhões. “Esses cem casos foram das pessoas que entraram em contato com a gente, mas um advogado me procurou e só ele tinha mais de 500 casos semelhantes. Também houve uma ação civil pública em Nova Londrina contra essa mesma empresa, que eram quase 100 casos. A gente não conseguiu quantificar em todo o Estado, a não ser em Curitiba. Foram mais de 300 no Procon da capital paranaense até o ano passado.”

O Nudecon assumiu o caso em 2021, após uma magistrada do município de Quedas do Iguaçu atuar em um processo individual naquela cidade, em que uma idosa processou o mesmo banco pela mesma prática. De acordo com Ferreira, a magistrada percebeu que a prática poderia ser recorrente, por isso, informou o núcleo. A equipe da Defensoria começou a ouvir as vítimas e a colher elementos que pudessem embasar a ação civil pública que foi posteriormente ajuizada. “Em Quedas do Iguaçu foram mais de 50 casos na comarca”, destacou Ferreira.

O coordenador ressaltou que o problema vai além do desconto realizado diretamente na fonte dos empréstimos não autorizados. De acordo com ele, há casos relatados de consumidores que não aceitaram a contratação do empréstimo e não receberam o cartão consignado, mas que ainda assim sofreram descontos em sua fonte de renda. Há também casos de consumidores que aceitaram o empréstimo consignado, mas, na verdade, tratava-se de um contrato para a obtenção do cartão de crédito consignado. Além disso, também foram encontrados casos em que a pessoa idosa aceitou o cartão de crédito, não fez o desbloqueio e, mesmo assim, houve um depósito em conta e, sucessivamente, a cobrança.

“Eles ligavam para os idosos, que não aceitavam o cartão de crédito consignado e mesmo assim faziam o depósito na conta do idoso e faziam o contrato. Eles são abordados por representantes comerciais que trabalhavam por comissão e eram terceirizados.” Ferreira ressaltou que o Nudecon enviou ofício ao banco requisitando informações e o banco não se manifestou e nem respondeu. “Para o direito do consumidor não importa se esse contrato é feito por agente terceirizado ou não, pois o banco é o responsável, porque o contrato foi com o banco. Logo, ele é o responsável por contratar os terceirizados ou os seus representantes e deve exigir deles que cumpram a legalidade.”

Outro padrão de abordagem ocorria quando funcionários ofertavam crédito consignado padrão, com valores fixos de parcela, por meses fixos e com prazo determinado para o fim do contrato. O idoso aceitava o crédito, mas depois de muito tempo descobria que era um cartão de crédito consignado que liberava o limite do cartão e faziam o desconto da margem consignável direto do benefício do idosos. “O banco só descontava o mínimo da fatura, e dessa forma o empréstimo nunca se pagava. Tem idoso pagando há seis anos só o mínimo e ainda está devendo a totalidade do valor da dívida”, declarou.

A Justiça indeferiu, no entanto, o pedido da Defensoria pela imediata suspensão dos descontos realizados nos benefícios previdenciários e nos vencimentos de consumidores(as) que não tenham manifestado, por escrito, declaração de vontade para a contratação do cartão de crédito consignado” e a “imediata suspensão dos descontos realizados nos benefícios previdenciários e nos vencimentos dos consumidores que não receberam o cartão ou que, mesmo recebendo, não desbloquearam o cartão. Apesar disso, o magistrado fixou multa de R$ 1 mil, limitada no máximo até R$ 100 mil, em caso de descumprimento da decisão, da qual cabe recurso. "Indeferiu de forma abstrata para todos os consumidores nesta situação, mas está aberta a possibilidade de comprovar isso individualmente e fazer o pedido de suspensão, ou seja, pode ser revista para cada consumidor. Por exemplo, se um consumidor que acabou de ser vítima tem a comprovação que no caso dele aconteceu isso, seria como se fosse pedido uma nova liminar para que, no caso dele, a cobrança seja suspensa. A gente está fazendo o atendimento desses casos."

Ele orientou aqueles que já contraíram o contrato sob essa condição que a ação do Nudecon já está pedindo ressarcimento para essas pessoas em todo o Estado. "Quem fez a contratação sem querer, haverá a nulidade do contrato, a devolução em dobro do dinheiro e incidirá a penalização por dano moral, que abrange todos os consumidores do estado que estejam na mesma situação."

"Para quem foi enganado pensando que era um contrato de empréstimo consignado com início e fim, a gente pediu para seja averiguar qual a taxa média do mercado aplicada para aquele consignado na época da contratação e que seja feito o cálculo se foi pago ou não esse valor para que seja dividida as parcelas no tempo correto. São empréstimos não tão altos de R$ 1 mil ou R$ 2 mil que deveriam ter o tempo em que deveria ser pago. Nesse caso a devolução deve ser o dobro do valor pago a mais, fora a indenização por dano moral."

O Nudecon assumiu o caso em 2021, após uma magistrada do município de Quedas do Iguaçu atuar em um processo individual naquela cidade, em que uma pessoa idosa processou o mesmo banco pela mesma prática. De acordo com Ferreira, a magistrada percebeu que a prática poderia ser recorrente, por isso, informou o Núcleo. A equipe da Defensoria começou a ouvir as vítimas e a colher elementos que pudessem embasar a Ação Civil Pública que foi posteriormente ajuizada.

Segundo Ferreira, a prática, além de violar o Código de Defesa do Consumidor, viola também o Estatuto da Pessoa Idosa e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

O consumidor que foi vítima de situação semelhante pode procurar o Nudecon pelo telefone (41) 99232-2977 ou pelo e-mail [email protected].

OUTRO LADO

Por meio de nota, o Banco BMG informou que, até o momento, não recebeu formalmente a intimação da referida decisão relatada na matéria, e que se manifestará nos respectivos autos assim que a recepcionar.

"O BMG aproveita para reiterar que cumpre detidamente toda a regulação e autorregulação bancária, bem como as legislações aplicáveis, preservando a excelência no atendimento e a ética com transparência.”

A Febraban afirmou que não compactua com práticas que desrespeitam os direitos dos consumidores e não vai permitir que más condutas prejudiquem a imagem de todo o setor. A carteira de empréstimo consignado atingiu, em agosto, R$ 560,9 bilhões, um aumento de 14,0% em relação ao mesmo mês do ano anterior, e representa importante fonte de recursos de baixo custo aos consumidores, e forte motor da economia.

Juntamente com a ABBC (Associação Brasileira de Bancos), a Febraban lançou em janeiro de 2020 a Autorregulação do Crédito Consignado com um conjunto de medidas para aperfeiçoar a qualidade da oferta e contratação empréstimo consignado, coibir o assédio comercial e melhorar o relacionamento com os clientes, evitando conflitos de consumo. Desde a sua criação até agosto de 2022, já foram aplicadas 1.002 sanções contra correspondentes bancários.

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