Joelmir Beting
PUBLICAÇÃO
terça-feira, 04 de setembro de 2001
''Exportar ou morrer? Não vamos morrer. Vamos exportar para continuar a viver.''
Fernando Henrique Cardoso, presidente da República
Vender para viver
O presidente Fernando Henrique Cardoso não é candidato à imortalidade da Academia Brasileira de Letras. Portanto, não se obriga a versejar sobre o novo desafio brasileiro número um: deslocar o saldo da balança comercial do vermelho para o azul cor de anil.
Ocorre que o presidente vem tentando editar uma exaltação bem bolada para desemperrar o export-drive verde-amarelo de anemia. Há duas semanas, brandiu o Grito do Ipiranga: ''Exportar ou morrer!'' Que teria ficado de bom tamanho em ''exportar ou sofrer''. Ou melhor: ''exportar ou estagnar''. Já tivemos o ''exportar é a solução'' ou o ''exportar é a salvação''. Em resumo: exportar é o que importa.
Eis que o presidente refaz o repto nacional, arredondando tudo em ''exportar para viver'' (colado no ''exportar ou morrer''). Que os marqueteiros palacianos teriam azeitado em ''exportar para crescer''.
No caso, exportar pelo menos um quinto do PIB e não, como até aqui, menos de um décimo dele. Ou 6,5% nos últimos 12 meses.
O problema é que esse discurso é mil vezes melhor do que o recurso. O Brasil só vai embarcar 13% do PIB - para tão-somente igualar a média dos 25 países com maior coeficiente de extroversão econômica - quando deixar de embarcar impostos e encargos em cascata para um mercado protegido por subsídios ocultos e confiscos declarados.
Que o diga a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), instituição de pesquisa e fomento dos 30 países mais ricos. Em documento divulgado anteontem (Relatório de Políticas Agrícolas em Economias Emergentes), a OCDE abre o jogo sujo nas barbas da Organização Mundial de Comércio (OMC): o acesso aos mercados dos países ricos, pelo critério das barreiras tarifárias ad valorem e das barreiras não-tarifárias, exige pedágio médio de 31%. Pois o acesso ao mercado brasileiro, citado exemplarmente, custa nada além de 14%.
Quem navega contra a maré montante da globalização? Os países ricos. A quem interessa a sabotagem arruaceira da Rodada do Milênio da OMC em Seattle (1999) ou em Dohua (2001)? Aos neoprotecionistas do ''status quo'' dos ricos, liderados em causa própria por José Bové, produtor francês de queijo de luxo encalhado e subsidiado.
Mas não basta xingar o mundo. Para embarcar US$ 100 bilhões por ano, o Brasil tem de fazer a intrincada lição de casa: 1) desonerar a carga fiscal da exportação; 2) reinventar o crédito bancário para a produção; 3) restaurar, integrar e ampliar o transporte intermodal; 4) engajar pequenas e médias empresas ao ''exportar para crescer''; 5) admitir que no mercado mundial os produtos não são comprados e, sim, vendidos.
Secos & Molhados
Pé-de-cabra
- Com o real desvalorizado em 46% em relação ao dólar (no conceito da paridade do poder de compra), os exportadores brasileiros nunca desfrutaram de um pé-de-cabra cambial tão poderoso para erguer esse mundo de Atlas.
Pé no brejo
- O problema é que o impulso cambial bate de frente com a queda do preço médio da pauta embarcada. Se, em termos reais, a cotação média dos produtos primários e semi-elaborados (do café à celulose) igualasse, em 2001, a cotação média de 1997, a balança já teria acumulado, até julho, um superávit de US$ 2,8 bilhões. Ou US$ 6,1 bilhões no ano passado.
Gol contra
- Nos cálculos da Funcex, de janeiro a julho de 2001, as vendas externas cresceram 10,9% em volume e recuaram 2,1% em valor. Nos produtos básicos, o desastre continuado: vendemos 32,9% a mais e faturamos 7,6% a menos. Ou como diria Neném Prancha: ''Time ruim tem azar!''