‘‘Ninguém comete erro maior do que não fazer nada porque só pode fazer pouco.’’
Edmund Burke (1729-1797), filósofo irlandês.
Adubo na terra
O governo soltou na praça um pacotaço e tanto em favor da economia rural. Quando? Na semana passada. Sim, não deu manchete de jornal nem debate na televisão. Primeiro: pouca gente ainda acredita em planos de governo (acusado justamente por não ter planos). Segundo: agricultura não dá ibope (só em caso de estiagem das bravas ou de invasão de terras.
O pacotaço verde, sob o rótulo pomposo de Brasil Empreendedor Rural, compromete-se com a abertura de 4 milhões de empregos no campo.
Bobagem. O programa anunciado não tem essa pilha toda. Até porque não é mais função da agricultura produzir empregos ruins com salários péssimos. A obrigação dela é realizar produtos cada vez melhores a custos e preços cada vez menores. O emprego é indireto e reside no agrobusiness inteiro.
O importante, no conjunto das medidas acionadas, é a perspectiva de um novo padrão de financiamento e de um novo tratamento tributário para a economia rural, atividade de risco como nenhuma outra. O risco de plantar e não colher, de colher e não vender, de vender e não ganhar. O risco do clima, da praga, do banco, do governo, do mercado e da Bolsa de Chicago.
A redução do risco está alojada em duas medidas: 1) a ampliação da Cédula do Produto Rural (CPR); 2) a abertura do seguro agrícola ao setor privado. Criada em 1994, a CPR é emitida por produtores e cooperativas para a venda antecipada da produção, com liquidação na entrega física do produto. É o recurso mais barato para bancar o plantio e o custeio – invenção de americanos e europeus.
O problema é que a CPR vinha sendo operada exclusivamente pelo Banco do Brasil e cobria apenas algumas culturas. Doravante, a ‘‘venda antecipada da safra’’ poderá contemplar todos os produtos e mobilizar todos os bancos. No seguro agrícola, a mesma descomplicação geral. Até aqui, só o Proagro segura a prensa e só o Banco do Brasil diverte-se com ele.
Diversão, sim. Enquanto lá fora, no mundo da fartura, o seguro agrícola banca a produção, no Brasil o espertinho cobre apenas o crédito rural. No fundo, uma cobertura para o banco e não para o produtor, cercado de riscos por todos os lados. Com a privatização do seguro rural, o produtor poderá ser ressarcido em caso de perdas parciais ou totais. Claro, no raio de alcance da apólice contratada.
Outra grande sacada, igualmente com meio século de atraso: a internacionalização dos mercados de futuros e de opções agrícolas, centrado entre nós na BM&F. Vai chover capital de fora na horta da agropecuária brasileira.




Secos & Molhados
Era uma vez
- O crédito rural é bananeira que já deu cacho. Ele cobre menos de 8% do valor da produção agropecuária. Caso único no mundo civilizado. Nos anos 70, cobria 45%. Abundante e subsidiado. Uma farra.
Disparidades
- Pesquisa da FGV mostra que a renda real por hectare é de R$ 1.085 em São Paulo, R$ 726 no Sul e R$ 123 no Nordeste. Falta apurar a renda no Centro-Oeste, hoje o pólo mais dinâmico da economia rural brasileira.
Para o gasto
- O ganho líquido dos pequenos produtores não tem passado de dois salários mínimos por ano (sim, por ano), mais casa e comida. O tamanho médio das propriedades é de 92 hectares no Sul, 96 em São Paulo e 896 no Centro-Oeste.
Patrimônio
- A FGV visitou 1.837 produtores com-terra em todo o Brasil. Desse total, 92% têm televisor, 56%, automóvel; 12%, telefone; 3%, computador. E mais: 15% não têm energia elétrica.