Investidores questionam negociação de ações de corretoras de bancos envolvidos na fusão entre Linx e Stone
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quinta-feira, 13 de agosto de 2020
ISABELA BOLZANI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A movimentação de compra e venda de ações da Link e da Stone antes das empresas informarem que estavam em tratativas de fusão chamou a atenção de investidores, que levantaram suspeitas de possível insider trading no negócio.
O termo insider trading, também conhecido como o uso de informações privilegiadas, remete a duas proibições no mercado financeiro: negociar ações ou outros ativos com base em uma informação que ainda não é pública, bem como revelar essa informação a terceiros (situação conhecida pelo mercado como tipping).
O processo de fusão foi acompanhado por três bancos: Goldman Sachs, JP Morgan e Morgan Stanley. Chamou a atenção dos investidores que as corretoras desses três bancos tenham despontado entre os maiores negociadores dos papéis de Linx e Stone antes de a informação sobre o andamento da fusão tornar-se pública.
Investidores individuais que operam pela plataforma ProfitPro, da Nelogica, publicaram em suas contas no Twitter capturas de tela mostrando a disparidade da compra e venda de ações feitas principalmente por JP Morgan e Goldman Sachs e chegaram a marcar o perfil da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), solicitando que a autarquia analisasse o caso.
O primeiro comunicado ao mercado feito sobre as tratativas finais da fusão foi publicado pela Linx às 13h08 da última terça-feira (11), quando a companhia afirmou que ainda não havia nenhum documento vinculativo assinado a respeito da transação e que, portanto, não havia garantia de que uma potencial operação fosse concluída.
Das 10h24 às 12h57, no entanto, as ações da companhia já subiam cerca de 13%, para R$ 28,95. Ao final da sessão de terça, os papéis da Linx estavam com alta de 31,5%, a R$ 34,40.
Na Bolsa de tecnologia Nasdaq, em Nova York, as ações da Stone subiam perto de 4% entre 10h30 e 12h30 e terminaram o dia com alta de 11,04%, a US$ 52,39.
Na quarta-feira, ambas as ações encerraram a sessão em queda. Linx terminou o dia com queda de 6,98%, a R$ 32 e a Stone caiu 5,92%, a US$ 49,29.
Depois do fechamento do mercado na terça-feira, a Stone anunciou a conclusão da compra da Linx por R$ 6,04 bilhões, dos quais 90% serão pagos em dinheiro e os outros 10% em ações. A companhia também afirmou que vai emitir US$ 1 bilhão em novas ações para financiar a compra.
O movimento nas ações da Linx na Bolsa brasileira, segundo fontes próximas ao assunto, provavelmente já chamou a atenção da CVM, que deve estar analisando os fatos.
Em nota, a CVM afirmou que acompanha o mercado, mas que não comenta casos específicos.
"A CVM acompanha e analisa informações e movimentações envolvendo o mercado de capitais no Brasil, tomando as medidas cabíveis, sempre que necessário. A autarquia não comenta casos específicos", afirmou.
Em nota, o Morgan Stanley afirmou que mantém a separação entre suas áreas de negócio.
"O Morgan Stanley mantém separação entre suas áreas de negócio e assegura o tratamento adequado de informações materiais não públicas. Por política interna e de acordo com as regras aplicáveis, não comentamos operação em curso", disse.
Também em nota, o Goldman Sachs afirmou que segue as regras e condutas dos reguladores locais e norte-americanos.
"O Goldman Sachs Brasil não opera para sua carteira própria e nossa corretora é uma instituição que intermedia negócios em nome de nossos clientes e não para fins proprietários", afirmou o diretor operacional do banco no Brasil, Ricardo Mourão.
Procurado, o JP Morgan não comentou o assunto.
Os bancos que possuem sedes internacionais estão sujeitos à chamada Regra de Volcker, regulação implementada por autarquias americanas e que é baseada em dois pilares: o primeiro se refere à proibição da condução de operações de tesouraria com posições proprietárias por entidades bancárias (aquelas que são beneficiadas por seguros sobre os depósitos).
O segundo pilar da Regra de Volcker limita o investimento dos recursos das entidades bancárias em fundos de hedge (fundos de "proteção", que reduzem ou eliminam os riscos com a variação de preços) e private equity (fundos de capital privado), restringindo também o patrocínio desses fundos pelas entidades cobertas pela Regra de Volcker.
O objetivo dessas restrições é coibir situações de operações de entidades bancárias em favor de si próprias, as quais trazem a possibilidade de especulação nos mercados a curto prazo e potencialmente podem colocar em risco os recursos dos depositantes.