As constantes interdições na BR-277, a principal via de acesso ao Porto de Paranaguá, poderão acarretar um prejuízo de mais de R$ 600 milhões na cadeia produtiva da soja, segundo estimativa feita pelo DTE (Departamento Técnico e Econômico) do Sistema Faep/Senar-PR. Se consideradas as outras cadeias produtivas, as perdas do agronegócio paranaense podem atingir a cifra dos bilhões.

Nos últimos meses, quedas de barreiras, riscos de desmoronamentos e rachaduras na pista, ocasionados pelo excesso de chuvas, levaram à interdição total ou parcial da BR-277, a única rodovia que comporta o tráfego de cargas pesadas até o Porto de Paranaguá. Sem condições de rodagem, os exportadores são obrigados a optar por outras vias de escoamento da produção.

O cálculo da Faep foi feito considerando-se um cenário de interrupção total da rodovia e com base no frete de um caminhão de sete eixos. Com capacidade para 57 toneladas, o transporte em um veículo desse porte custa R$ 4,86 por saca no trajeto entre Cascavel e Paranaguá, um percurso de 600 quilômetros. Para transportar o mesmo volume do grão de Cascavel a Santos, uma distância de mil quilômetros, o frete sobe para R$ 7,73 por saca, quase 60% mais caro.

O problema na rodovia, que afeta fortemente a logística de transporte, acontece justo quando há estimativa de recordes na produção da soja na safra 2022/2023. Sem o impacto das adversidades climáticas e com o aumento de 1% na área de plantio no Estado, a projeção do Deral (Departamento de Economia Rural) é de que o volume colhido nas lavouras paranaenses seja 74% maior do que ano passado, chegando a 21 milhões de toneladas do grão. A soja é uma cultura de grande relevância econômica para o Paraná e muito visada no campo internacional, sendo um dos principais produtos no ranking das exportações.

A projeção do setor é de que 15,7 milhões de toneladas da oleaginosa produzida no Estado sejam exportadas, sendo 12,6 milhões por rodovia e 3,1 milhões por ferrovia. Se todo esse volume deixasse de sair por Paranaguá, por uma interdição total da BR-277, o prejuízo seria na ordem de R$ 602,7 milhões somente pelo custo de frete até Santos, estima a Faep. Segundo a entidade, algumas cooperativas e traders já vêm utilizando os portos de São Francisco do Sul (SC) e de Santos para envio de suas cargas.

O Sistema Ocepar calcula que 70% do valor estimado em perdas pela Faep sejam arcados pelas cooperativas do Estado e seus cooperados, percentual que corresponde ao volume de soja paranaense recebida por essas empresas.

A demora das autoridades competentes em encontrar uma solução definitiva para o problema causa preocupação e indignação no setor produtivo. “Estamos indignados. É absurda a forma como os governos estadual e federal têm tratado este assunto. Faz quatro ou cinco meses que estamos com problemas na descida da Serra do Mar e não sabemos como isso vai ficar. Tão logo não devemos ter uma solução”, disse o consultor de Logística da Faep, Nilson Hanke Camargo, que cobrou um posicionamento a respeito da concessão das rodovias. “Precisamos ter uma concessionária cuidando do trecho. São quase dois anos sem pedágio.”

A entidade destacou ainda que o Paraná é o maior exportador de frango do país e o terceiro em carne suína, além de contabilizar volumes expressivos nas vendas de outras commodities ao exterior. Todas essas cadeias seriam impactadas diretamente pelos problemas na BR-277 e o prejuízo total seria calculado em bilhões de reais.

O Sistema Ocepar atua junto ao governo do Estado para acelerar a concessão dos sete trechos do Anel de Integração que serão pedagiados, mas está ciente de que é uma processo demorado e o sistema produtivo tem pressa. Como medida emergencial, o superintendente interino da entidade, Flávio Turra, defende que se priorize o envio de caminhões para Paranaguá em alguns períodos do dia. "Em contrapartida, seguram-se outros carros, como automóveis e veículos que não são para transporte de cargas. Isso pode ser viabilizado. Estamos trabalhando junto ao Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e ao DER (Departamento de Estradas de Rodagem)."

Na outra ponta, disse Turra, é preciso trabalhar para que as empresas que compraram soja para exportação continuem enviando o produto para os portos. "Nossos armazéns estão cheios, a gente tem dificuldade de receber mais produção e a safra não foi toda colhida. Precisamos que as empresas também enviem para os portos, mesmo que seja para portos de outros estados."

O Paraná tem uma capacidade de armazenagem de 31 milhão de toneladas de grãos, sendo 16 milhões de toneladas a capacidade de estocagem das cooperativas, que já recebem um volume acima do que comportam, de mais de 20 milhões de toneladas.

Em nota, a Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná) também expôs sua preocupação com os desdobramentos nos problemas na pista no sentido Litoral da BR-277 e acusou a falta de ações de prevenção. “É resultado da típica falta de manutenção preventiva nas rodovias que, aliada ao excesso de chuvas, obriga à tomada de medidas extremas para a realização de manutenção corretiva”, ressaltou.

Além do aumento de custos, a Fiep lembrou que a interdição da rodovia eleva também o tempo de transporte de cargas da indústria paranaense que têm como origem ou destino o Porto de Paranaguá. “Cenário que tende a ser ainda mais problemático pela aproximação do período de escoamento de uma safra agrícola recorde, entre março e abril, que mais que dobrará a quantidade de caminhões que chegam ao pátio de triagem do porto, à qual se somará o número relevante de caminhões de contêineres com o mesmo destino”, disse a Fiep, que deverá se reunir com o Dnit ainda nesta semana para discutir a questão.

Deságio de preços em Paranaguá já causa perdas

Mesmo quem consegue chegar com o carregamento de soja ao complexo portuário de Paranaguá não está livre dos prejuízos. Os portos trabalham com o pagamento de uma taxa de incentivo (ágio) ou desincentivo (deságio) ao transporte de determinadas mercadorias e, nesse momento, para se exportar a oleaginosa pelo porto paranaense está se praticando um deságio, ou seja, um desconto de R$ 1,15 por saca do grão. Aplicado às 15 milhões de toneladas de soja paranaense que devem deixar o país pelo Porto de Paranaguá, o prejuízo seria de R$ 241,31 milhões.

“A questão do deságio é muito ampla. Depende de vários fatores. Aumenta o valor da mercadoria se tiver facilidade no carregamento e prejudica o valor do prêmio se tiver dificuldade, com muitos navios para entrarem. São muitas variáveis que influenciam, mas a interdição da rodovia, que dificulta o escoamento das cargas, é um desses fatores e pode, sim, aumentar ainda mais o valor do deságio”, explicou o consultor de Logística da Faep, Nilson Hanke Camargo.(S.S.)

Malha ferroviária necessita de melhorias

A interdição da BR-277 traz à tona novamente a questão dos modais de transporte, já amplamente discutida em 2018, em razão da maior greve de caminhoneiros já registrada no país. A atual malha ferroviária do Paraná é insuficiente para atender a demanda e a construção da Nova Ferroeste, uma longa ferrovia projetada pelo governo do Estado para ligar o município de Maracaju (MS) a Paranaguá, não tem previsão de sair do papel. “Essa questão ferroviária é complicadíssima. Esse (Nova Ferroeste) é um projeto de R$ 25 bilhões. Quem vai querer investir? Para ter retorno em quantos anos?”, questionou o consultor de Logística da Faep, Nilson Hanke Camargo.

"A parte do transporte ferroviário (da atual safra de soja) está indo normal, porém sem capacidade de aumentar a quantidade de produto que pode enviar para o porto. Tem poucos vagões para atender a toda essa demanda adicional. Então, sobram 70% da quantidade de produto a ser destinado via caminhão", disse o superintendente interino do Sistema Ocepar, Flávio Turra.

Para evitar situações como a que acontece agora, apontou Camargo, o caminho seria melhorar a malha ferroviária já disponível, necessidade já apontada em 2018 e que segue sendo apenas uma expectativa cinco anos depois. O contrato da Rumo Logística com o governo do Paraná vence em 2027 e a empresa sinalizou interesse em prorrogar o contrato. Camargo vê na extensão contratual uma possibilidade de garantir investimentos nas estradas de ferro paranaenses. “Se o contrato for prorrogado, precisamos cobrar deles investimentos, colocar cláusulas. Precisa melhorar o trecho Guarapuava-Ponta Grossa e também o trecho até Paranaguá.”(S.S.)