O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), que mede a inflação oficial do Brasil, teve alta de 0,54% em janeiro de 2022, o maior resultado para o mês nos últimos seis anos. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), responsável pelo cálculo do índice inflacionário, o maior aumento até então havia sido registrado em janeiro de 2016, de 1,27%, quando a economia do país atravessava um período de recessão.

Apesar de ter sido observada uma desaceleração ante dezembro de 2021, quando o IPCA foi calculado em 0,73%, o índice segue em dois dígitos no acumulado até janeiro, de 10,38%. No recorte de 12 meses até janeiro, trata-se da taxa mais elevada desde 2016, quando ficou em 10,71%. A meta da inflação perseguida pelo BC (Banco Central) é de 3,50%, com teto de 5%. Analistas, no entanto, preveem que o índice deve voltar a estourar a meta em 2022. Se a estimativa for confirmada, será o segundo ano consecutivo de descumprimento.

O segmento de alimentação e bebidas teve maior influência no avanço da inflação, segundo o IBGE, com variação positiva de 1,11%. O grupo teve o maior impacto no índice do mês (0,23 ponto percentual). Mas dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados, oito registraram aumento de preços.

Os eventos climáticos extremos podem ter contribuído para a alta dos alimentos, avaliou o analista da pesquisa do IBGE, André Filipe Almeida. No início do ano, estados como Minas Gerais e Bahia sentiram os reflexos das fortes chuvas, enquanto a Região Sul amarga período de estiagem. “Produtos in natura têm o clima como um dos principais fatores para determinação da quantidade produzida e ofertada”, disse Almeida. “Esses fatores climáticos acabam influenciando a quantidade e até a qualidade dos produtos.”

Em alimentação e bebidas, os principais destaques foram carnes (1,32%) e frutas (3,40%), que embora tenham desacelerado em relação ao mês anterior, tiveram os maiores impactos no grupo. O IBGE também informou que os preços do café moído (4,75%) registram aumentos seguidos há 11 meses, acumulando alta de 56,87% nos últimos 12 meses.

Outros destaques foram cenoura (27,64%), cebola (12,43%), batata-inglesa (9,65%) e tomate (6,21%). Já os principais recuos no grupo foram registrados por arroz (-2,66%), frango inteiro (-0,85%) e frango em pedaços (-0,71%).

PREOCUPAÇÃO

Os reflexos da alta nos preços dos alimentos já foram sentidos pelos varejistas. O Sincovag (Sindicato do Comércio Varejista dos Itens de Alimentação), demonstrou preocupação com o cenário que se desenha para 2022. O presidente da entidade, Álvaro Furtado, afirmou que o mês de janeiro foi uma enorme decepção para o setor. O primeiro mês do ano costuma ser ruim porque os consumidores viajam e estão apertados com os gastos de dezembro e tributos de início de ano, mas neste ano, janeiro foi ainda pior do que em anos anteriores.

“Os resultados foram muito aquém do mínimo esperado, ou seja, teve cortes significativos mesmo nos itens básicos para comer”, apontou Furtado. Além da redução normal do fluxo de clientes, ele observou uma queda maior no valor do tíquete médio. “Minha avaliação é a de que isso é um reflexo de uma situação econômica muito difícil. Nós estamos em um processo de alto nível de desemprego. O consumo depende de renda, e mesmo quem não perdeu o emprego teve reajuste abaixo da inflação, o que significa que o poder de compra diminuiu”, analisou o presidente do Sincovag, que ainda reclama da pressão do aumento dos custos de transporte, energia e impacto do câmbio. A preocupação atinge os varejistas de todos os portes, disse Furtado.

PODER DE COMPRA

“Precisávamos todos criar um pouco de ambiente de normalidade e nossa sociedade gosta de fazê-lo consumindo. Em razão disso, estamos com nível de endividamento familiar muito elevado. Some-se a isso um índice de inflação de dois dígitos tirando poder de compra dos salários e o aumento, em muitos casos acima da inflação, de impostos e material escolar, e temos sim um cenário bem desafiador para todos nós”, avaliou o economista Marcos Rambalducci.

O economista lembrou ainda que o preço dos combustíveis bateu recorde de alta nesta semana e vai impactar nos preços da gasolina e diesel, o que pressiona os preços de todos os produtos. Sem contar os empregos, que devem crescer muito menos neste ano, já que a economia não deve superear a elevação de 1%. “Então, 2022 será bastante desafiador.”(Com Reportagem Local)

Transportes influenciam desaceleração em relação a dezembro

O IBGE apontou que a desaceleração do IPCA de dezembro para janeiro – de 0,73% para 0,54% - foi puxada pelo grupo dos transportes. O segmento recuou 0,11%, após subir 0,58%. Esse foi o único dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados que teve queda em janeiro.

O recuo, avalia o instituto de pesquisa, é consequência da baixa de preços das passagens aéreas (-18,35%) e dos combustíveis (-1,23%). Além da gasolina (-1,14%), também houve queda no preço do etanol (-2,84%) e gás veicular (-0,86%). O óleo diesel (2,38%) foi o único a subir em janeiro. Outros destaques foram os transportes por aplicativo (-17,96%) e o aluguel de veículo (-3,79%).

“A queda nas passagens aéreas pode ser explicada pelo componente sazonal”, disse o analista da pesquisa do IBGE, André Filipe Almeida. “Em relação aos combustíveis, os reajustes negativos aplicados nas refinarias pela Petrobras, em dezembro, ajudam a entender o recuo nos preços em janeiro.”

Entre as 16 capitais e regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, Curitiba tem a maior inflação acumulada em 12 meses, com alta de 12,77% até janeiro. Na sequência, vêm Rio Branco (AC), com 11,90%, e Vitória (ES), com 11,65%. Belém (PA) está na outra ponta da lista, com IPCA acumulado de 8,84%, o mais baixo entre as metrópoles avaliadas.

O mercado financeiro projeta inflação de 5,44% no acumulado até dezembro de 2022, aponta a edição mais recente do boletim Focus, do BC. Essa estimativa vem sendo revisada para cima nas últimas semanas diante dos riscos que permanecessem no cenário.

Entre as ameaças ao controle inflacionário estão as incertezas da corrida eleitoral, que costumam impactar a taxa de câmbio, e a pressão do petróleo, que gera efeitos sobre os combustíveis no país. Há ainda o temor com os eventuais reflexos do clima adverso. A seca na Região Sul, por exemplo, pode gerar novos avanços nos preços dos alimentos.

Para tentar conter a inflação, o BC vem subindo a taxa básica de juros, que alcançou 10,75% na semana passada. O efeito colateral da Selic mais alta é inibir investimentos produtivos na economia, já que as linhas de crédito ficam mais caras no país. A redução de investimentos ameaça a geração de empregos e a retomada econômica.

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