Previsto inicialmente para agosto e, em seguida, adiado para setembro, o Voa Brasil ainda não tem uma data oficial para ser lançado. Isso porque o Ministério dos Portos e Aeroportos – comandado por Silvio Costa Filho (Republicanos) desde 13 de setembro – anunciou que o programa do governo Lula (PT) passou a agregar também o Ministério do Turismo, de Celso Sabino (União). A ideia - que ainda está sendo trabalhada - é criar mais um apoio para quem for viajar, possibilitando a aquisição de diárias mais baratas em hotéis.

O Voa Brasil é pauta do governo desde o primeiro trimestre do ano. Na época, o então ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França (PSB), anunciou à mídia os esboços iniciais do programa, prometendo comercializar passagens aéreas a R$ 200 a certos grupos de brasileiros. Desde então, a iniciativa foi ganhando forma e já é vista com bons olhos por economistas e por companhias aéreas que operam no país. A expectativa é de que o plano movimente os aeroportos nacionais e o turismo.

Sem investimento direto de capital público, a ação visa aumentar o número de viagens de avião e tornar os preços mais acessíveis a algumas classes. Segundo as declarações dadas por França, o Voa Brasil deve abranger somente servidores públicos que ganhem até R$ 6,8 mil, aposentados e pensionistas de até dois salários mínimos (R$ 2.640) e estudantes que conseguiram vagas em faculdades por meio do Fies (Financiamento Estudantil).

Os interessados terão direito a quatro passagens por ano, sendo, obrigatoriamente, duas do solicitante e mais duas do seu acompanhante. Além disso, eles poderão parcelar as viagens em até 12 vezes no cartão de crédito, mas com acréscimo de juros. No entanto, os beneficiários não poderão ter viajado de avião nos últimos 12 meses.

O então ministro também confirmou em declarações que os valores das demais passagens não aumentarão, já que esses descontos propostos serão uma maneira de ajudar as companhias aéreas a lucrarem com assentos ociosos nos aviões, que estão na casa dos 20%, em média, no país.

Há também a ideia de fazer leilões de cadeiras vagas, tudo para preencher o maior número possível de lugares nos voos. O governo espera que, a partir do lançamento, 1,5 milhão de passagens sejam emitidas por mês. Além disso, a equipe ministerial de Lula projeta que, até 2026, 100 novos aeroportos entrem em atividade no Brasil.

Como será feito

O Voa Brasil deve ser colocado em prática por meio de um aplicativo e cadastro via CPF. Assim, as pessoas que se enquadrarem nas exigências feitas pelo governo poderão colocar seus dados pessoais e os destinos desejados. Somente poderão ser escolhidas datas de março a novembro, tudo conforme a disponibilidade de assentos no avião. Todas as compras serão intermediadas pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco do Brasil.

Apoio ao projeto

A reportagem buscou saber se as empresas realmente têm interesse no projeto. A Latam confirmou, em nota, que está trabalhando com o governo federal para que “mais pessoas viajem de avião no Brasil”. Também reiterou que a medida “vai na direção de aumentar de forma sustentável as viagens de avião”.

A Azul também notificou que “já está participando do grupo de trabalho do Ministério de Portos e Aeroportos e colaborando com o desenvolvimento do projeto”. Afirmou, além disso, que vê como positiva a iniciativa do governo.

Já a Gol, por meio da assessoria, disse que “o setor aéreo está se recuperando da maior crise da história e políticas públicas que tenham como objetivo o crescimento e o desenvolvimento do turismo são muito bem-vindas”. A nota também confirmou que a empresa trabalha em conjunto com o governo há meses para “democratizar a aviação no país”.

Democratização ou canibalização

Para saber sobre a viabilidade do projeto de Lula, a reportagem também contatou o economista, delegado do Corecon-PR (Conselho Regional de Economia) de Londrina e professor da UEL (Universidade Estadual de Londrina), Emerson Guzzi Esteves. De acordo com ele, há aspectos positivos e negativos no texto. Se o fator favorável seria a democratização do voo, o desfavorável seria a especulação dos usuários que poderia ocasionar um desastre nos cofres das empresas participantes.

“Pode haver uma canibalização das passagens por meio do programa. Ou seja, as pessoas podem deixar de comprar pelo preço normal para esperar as passagens sobrarem e, assim, comprá-las por até R$ 200. A ideia é boa e pode vingar, mas vai depender do consumidor”, analisa.

Para Esteves, o Voa Brasil pode solucionar o problema antigo de vagas ociosas das companhias, por isso todas demonstraram apoio à medida.

“Se o consumidor mantiver o comportamento de hoje, sobrando cerca 20% de assentos vagos, o programa vai melhorar a lucratividade das empresas. Elas vão ganhar mais com isso. Se der certo, vai movimentar bastante a economia no transporte aéreo e no turismo. Lembrando que são destinos internos, para movimentar a economia no Brasil”, completa o economista.

Novas companhias aéreas

O governo federal também cogita a chegada de novas empresas do setor ao país. As “low cost”, como estão sendo chamadas, ofertariam serviços de menor qualidade e, consequentemente, de menor de preço. Esteves diz que o aumento da concorrência pode impactar os valores das passagens, mas tudo depende do custo operacional das empresas.

“A gente já teve várias outras empresas por aqui, como Cruzeiro, Transbrasil, Varig e Tam [hoje Latam]. O mercado é como se fosse um bolo, e as fatias são as empresas. Se aumentar as companhias, vai diminuir o tamanho da fatia. Então, quem não tiver uma competitividade pode sair do mercado, mas esse espaço será ocupado por outras empresas”, pondera.

O economista também supõe que as companhias, ao lidar com a concorrência futuramente, deverão diminuir o custo, otimizando as suas gestões, e, dessa forma, permanecerão operando.

Para o londrinense viajar hoje

Os preços para viajar de avião hoje podem variar até 1.000%, a depender da data, classe, localidade e empresas escolhidas. Uma pesquisa feita no site das três companhias que operam no Brasil mostra que se um morador de Londrina precisasse fazer um voo de urgência para São Paulo (SP), por exemplo, ele teria que desembolsar de R$ 1,4 mil a R$ 1,9 mil. Já se o destino fosse Salvador (BA), esse valor poderia chegar a R$ 2,6 mil.

Utilizando como referência uma viagem agendada para 1º de novembro, o londrinense poderia pagar mais barato para visitar a capital paulista, com passagens variando de R$ 400 a R$ 900. Na mesma data para a capital baiana, as companhias comercializam voos de R$ 1,3 mil a R$ 2,9 mil.

Para os que quisessem “turistar” nas praias soteropolitanas em 8 de janeiro, por exemplo, foram encontradas passagens de R$ 1 mil a R$ 4 mil. O londrinense conseguiria conhecer a terra da garoa na primeira semana de janeiro por R$ 350.

Com o novo programa do governo, os beneficiários poderiam viajar para qualquer um desses lugares por R$ 200. Isso se houvesse poltronas disponíveis.

Ansiosa pelos próximos capítulos

A aposentada Madalena Gomes dos Santos, 62, diz que aguarda ansiosamente a divulgação oficial do Voa Brasil. Isso porque ela e o seu marido fazem parte dos milhões de brasileiros que terão direito às passagens por R$ 200.

“Fiquei muito interessada [quando soube], porque gosto de viajar, mas para alguns lugares do Brasil é muito caro geralmente”, diz.

Já conhecendo países da Europa, como Inglaterra e Portugal - onde reside parte de sua família -, Madalena conta que ama conhecer novas culturas e, caso o programa do governo federal funcione, ela certamente irá se aventurar por estados brasileiros ainda não visitados.

“Eu conheço Natal (RN). É legal conhecer culturas diferentes, como o Cajueiro [de Pirangi] e as praias cristalinas e quentes. Foi maravilhoso e muito relaxante. Agora, gostaria de conhecer vários outros [pontos turísticos], como Gramado (RS), Fortaleza (CE) e os Lençóis Maranhenses [Barreirinhas (MA)]”, conclui a aposentada.

Aeroportos têm capacidade

Questionada sobre um possível aumento no fluxo de passageiros, a CCR Aeroportos, empresa que administra 17 aeroportos no Brasil - dos quais 15 operam voos comerciais - incluindo o Aeroporto Governador José Richa de Londrina, afirmou que acompanha com atenção as movimentações acerca da medida do governo.

A empresa ainda cita que todos os aeroportos que administra têm plena capacidade, operacional e estrutural, de atender a demanda de novos passageiros que possam surgir.