Usar o transporte intermunicipal tem se tornado tarefa cada vez mais árdua para moradores do Norte Pioneiro, devido a uma expressiva redução de horários de ônibus e até a desativação de linhas inteiras. O resultado é a criação de um preocupante gargalo de mobilidade coletiva na região.

Municípios que não estão na rota dos principais corredores viários ou façam parte do itinerário de viagens de ônibus entre centros maiores convivem com a escassez de possibilidades de transporte intermunicipal.

Com o êxodo rural na região nas últimas décadas e o aumento do acesso da população a aquisição de veículos, o transporte coletivo deixou de ser uma necessidade – ou uma opção – para muitos dos moradores no Norte Pioneiro. Então, alegando inviabilidade financeira causada pela redução de passageiros, as empresas responsáveis passaram a reduzir, gradativamente, as viagens.

Um caso extremo aconteceu em 2023 quando quatro linhas intermunicipais tiveram o serviço totalmente paralisado pela empresa então dona da concessão: Ribeirão do Pinhal – Bandeirantes, Jacarezinho – Cambará, Joaquim Távora – Ribeirão Claro e Jacarezinho – Ribeirão Claro.

À época o DER/PR (Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná) fez um chamamento público para que novas empresas assumissem os itinerários, porém não houve interessados e as linhas estão paradas até hoje.

A situação representa um desafio na vida de quem precisa se deslocar entre esses municípios. É o caso da professora de educação especial Reni Miranda, que mora em Jacarezinho e leciona no Colégio Estadual Dr. Generoso Marques, na vizinha Cambará. Convocada via PSS (Processo Seletivo Simplificado) para assumir a vaga, a profissional viu a alegria da oportunidade de trabalho conviver com o desafio logístico.

Sem transporte coletivo operando entre os municípios, Reni precisa que o marido a leve e a busque diariamente. “Para a gente prejudica muito essa falta de ônibus. Precisa de pelo menos quatro horários por dia, porque tem bastante gente que trabalha ou estuda em um município e mora em outro. Agora estamos tentando encontrar alguém com os mesmos horários que eu para dividir as despesas”, lamenta.

O problema foi motivo de questionamento por parte do deputado estadual Luiz Claudio Romanelli, que tem base política formada no Norte Pioneiro. “Eu já tratei desse assunto junto ao DER/PR e também fizemos um debate sobre o tema com uma das principais empresas da região, que é a Viação Garcia. Segundo eles, o que houve foi a redução acentuada de passageiros que estão buscando outros meios de transporte”.

Em municípios da região onde as linhas seguem operantes, porém, com cada vez menos horários disponíveis aos passageiros, também há problemas de mobilidade para moradores. Esse é o caso do aposentado Hélio Antônio de Oliveira, morador de Wenceslau Braz, que conta que um dos motivos que deixou a zona rural para morar na cidade foi justamente a redução dos horários de ônibus.

“Quando eu mudei para o sítio, eram sete horários de ônibus por dia, de duas empresas diferentes. Teve situação do ônibus não parar para pegar mais passageiro, de tão lotado que estava. Mas foi diminuindo tanto os ônibus que quem não tem carro ou moto começou a ficar isolado do mundo e coisas simples do dia a dia passaram a ficar difíceis, como fazer compra ou ir numa farmácia”, relembra.

Embarque na rodoviária de Wenceslau Braz em um dos poucos horários que restaram como opção aos passageiros
Embarque na rodoviária de Wenceslau Braz em um dos poucos horários que restaram como opção aos passageiros | Foto: Lucas Aleixo

Procurado, o DER/PR informou por meio de nota que “foi elaborado um Plano de Mobilidade Intermunicipal que irá subsidiar as novas licitações de linhas de ônibus intermunicipais” e “que a pretensão das novas licitações é permitir um transporte público viável economicamente”. Não há, contudo, divulgação de um prazo para que o plano entre em execução.

RODOVIÁRIAS VAZIAS

Outro reflexo sentido pela região é a subutilização dos terminais rodoviários, cada vez mais esvaziados com a redução das linhas intermunicipais. As administrações municipais têm usado os espaços para abrigar repartições públicas, por exemplo, dado ao baixo fluxo de passageiros. Consequentemente, muito dos comércios que existiam dentro das rodoviárias fecharam as portas nos últimos anos.

Em Jacarezinho houve uma tentativa da prefeitura de conceder, via processo licitatório, alguns dos boxes da rodoviária local, recentemente reformados, porém não houve interessados mesmo com a oferta sob baixo custo. Outro caso emblemático é o de Santana do Itararé, um dos terminais rodoviários mais novos da região. Com 15 anos de funcionamento, o espaço tem o trânsito de apenas dois horários de ônibus por dia. Até o guichê da empresa que opera no município passa a maior parte do tempo fechado.

Sede e garagem da Princesa do Norte, em Santo Antônio da Platina, dará lugar a um supermercado atacadista
Sede e garagem da Princesa do Norte, em Santo Antônio da Platina, dará lugar a um supermercado atacadista | Foto: Antônio de Picolli

Situação emblemática de todo esse contexto acontece em Santo Antônio da Platina, onde a antiga sede e garagem da Princesa do Norte foi vendida e está sendo demolida. A área, um dos símbolos da importância local da marca, será ocupada por um supermercado – a empresa de transporte tem se desfeito de outras áreas no Norte Pioneiro, como consequência da redução de passageiros e da atuação em toda região.

A reportagem entrou em contato com a Princesa do Norte, mas a empresa optou por não se manifestar a respeito.

Precariedade do transporte preocupa polos turísticos

A fragilidade do sistema de transporte interurbano na região também preocupa entidades ligadas ao turismo no Norte Pioneiro – alguns dos municípios praticamente “descobertos” no que diz respeito à mobilidade coletiva são exatamente os de maior potencial turístico regional, como Ribeirão Claro e Carlópolis.

“Sabemos que o turismo é uma mola propulsora da economia e do crescimento sustentável dos municípios. Por essa razão, é inegável que a redução de horários e linhas de transporte intermunicipal afeta todo o setor. Nossa expectativa é que os órgãos reguladores e fiscalizadores deste tipo de serviço estejam atentos para garantir que a mobilidade por meio de transporte coletivo se mantenha em evolução em nossa região. Estamos à disposição das prefeituras para dialogar com os órgãos responsáveis em busca de solução para essa questão, sempre com o intuito de ampliar o número de viajantes dentro do Estado e, assim, movimentar a nossa economia”, explica a presidente da Atunorpi (Associação Turística do Norte Pioneiro), Mara Mello.

Entre as iniciativas vistas como passíveis de melhora do cenário por parte da Atunorpi é o programa Paraná + Viagem, do governo do Estado, que prevê o repasse de recursos para prefeituras com plano de trabalho aprovado para incentivos de viagens dentro do Paraná.