São Paulo - O Brasil deve ter na safra 2009/10 a menor fatia do mercado mundial de óleo de soja em 10 anos. Segundo as projeções do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), o País deve embarcar apenas 1,5 milhão de toneladas da commodity, o que corresponde a apenas 15,8% do movimento global. É o pior resultado desde a temporada 1999/00, quando o País respondeu por 15,3% das exportações mundiais.
O País já foi o maior exportador mundial de óleo de soja, mas a indústria perdeu competitividade em relação à Argentina após a aprovação da Lei Kandir, em 1996. Antes, o setor pagava 13% de ICMS sobre a exportação de soja em grão e cerca de 10% sobre os embarques de farelo e óleo.
Sob a nova legislação, a alíquota foi reduzida a zero, mas, na prática, apenas as exportações do grão foram beneficiadas. As esmagadoras que precisam adquirir soja em outros Estados continuam a pagar ICMS na compra da matéria-prima, acumulando créditos tributários, difíceis de reaver, sobre a exportação do produto final. ''O processamento da soja ainda é tributado como uma operação doméstica, e não como uma etapa do processo de exportação'', reclama Fábio Trigueirinho, secretário-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). ''Isso tem obrigado as indústrias a migrar para o Centro-Oeste e investir em unidades menores, que possam ser abastecidas apenas com o grão produzido na região.''
Com o desestímulo à exportação do produto processado, o Brasil viu a Argentina abocanhar seu mercado. Na temporada 1995/96, os dois países dividiam a liderança nas exportações globais de óleo de soja, com cerca de 30% cada. Já no final daquela década, a participação da Argentina subiu para 41%, enquanto a do Brasil caiu pela metade. Na safra 2009/10, os argentinos devem ficar com 55% do mercado.
A diferença de desempenho fica evidente também quando se comparam os volumes. No ano que vem, os argentinos devem embarcar 5,22 milhões de toneladas de óleo de soja, volume 226% maior do que o registrado em 1996. Já a exportação brasileira deve ser 6% menor do que o volume de 1,6 milhão de toneladas embarcadas naquele ano.
O Brasil também perdeu grande parte de sua participação no mercado de farelo. Há 13 anos, o País exportava 11,9 milhões de toneladas da commodity, ou 35,3% das vendas globais, enquanto a Argentina exportava 8,22 milhões de toneladas, o que correspondia a 24,3% do mercado. De lá para cá, as exportações argentinas mais que triplicaram enquanto as brasileiras ficaram praticamente estáveis. Hoje, a Argentina é responsável por mais de 45% de todo o farelo exportado no mundo, enquanto o Brasil ficou com apenas 22%.
Enquanto isso, as exportações brasileiras de soja em grão dispararam. Se, em 1996, o País embarcou pouco menos de 3,5 milhão de toneladas, volume três vezes menor do que o de farelo, este ano deve fechar com uma exportação de quase 30 milhões de toneladas - um crescimento de 750%. Ou seja, praticamente todo o crescimento da produção no período foi embarcado diretamente para o exterior.
Para Antônio Sartori, diretor da corretora Brasoja, o Brasil faz uma escolha errada ao priorizar a exportação da matéria-prima. ''É ridículo o País comemorar ser o maior exportador mundial de soja. Deveríamos exportar mais farelo, óleo, frango e suínos, agregando valor e gerando empregos no País'', afirma. Sartori destaca o fato de que a indústria tem hoje uma capacidade ociosa de quase 30%. Segundo a Abiove, o Brasil deve processar menos de 30 milhões de toneladas de soja na safra 2009/10, de uma produção de 63 milhões de toneladas. ''Poderíamos esmagar quase 50 milhões de toneladas de toneladas'', afirma.
Sartori destaca que o aumento da produção doméstica de biodiesel será insuficiente para estimular níveis mais altos de esmagamento da soja. Ele prevê que, com a adoção do programa B5 (um mistura de 5% de óleo vegetal no diesel) a partir de janeiro, o consumo de biodiesel deve crescer mais de 70% no ano que vem, para 2,4 milhões de toneladas. Com isso, a demanda interna por óleo de soja deve se aproximar da inédita marca de 5 milhões de toneladas. ''Contudo, a produção de óleo não deve passar de 6,1 milhões de toneladas, que é o mesmo patamar dos últimos anos. O biodiesel vai apenas absorver parte do excedente que ia para o mercado externo'', prevê.