BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Antes da chegada do novo coronavírus ao país, era crescente o número de grandes empresas que se financiavam na Bolsa em busca de taxas e condições melhores. A crise e a volatilidade dos mercados, entretanto, fizeram com que as companhias voltassem ao crédito bancário.

Desde então, companhias maiores tomaram quase metade dos recursos disponibilizados pelos bancos em linhas de crédito.

No último mês, o ritmo de concessão de empréstimos às grandes empresas diminuiu e, em direção oposta, há indícios de retomada nas ofertas públicas de ações, tanto de empresas que já tinham capital aberto quanto daquelas que estão ofertando papéis na Bolsa pela primeira vez.

Entre 10 de julho e 7 de agosto, segundo dados do Banco Central, os bancos emprestaram R$ 70,8 bilhões em novos créditos às grandes empresas.

Entre abril e maio foram quase R$ 130 bilhões. Do meio de março ao fim de abril, no ápice da crise, as grandes empresas pegaram R$ 155 bilhões em novas linhas.

Já o volume captado pelas empresas na Bolsa chegou a R$ 20,5 bilhões entre maio e julho e há expectativa de novas ofertas no curto prazo. Na CVM (Comissão de Valores Mobiliários), há 25 companhias com emissões em análise.

Com o pânico entre os investidores e a volatilidade nos mercados, em março e abril, meses em que as grandes empresas mais pegaram crédito nos bancos, não houve ofertas públicas de empresas na B3.

"Com o cenário de juro básico da economia em patamares historicamente baixos é natural e uma tendência de que mais empresas consigam acessar o mercado de capitais, seguindo a forte tendência que já vinha ocorrendo a partir de 2017", disse o diretor de Fiscalização do Banco Central, Paulo Souza.

"A pandemia interrompeu esse processo, mas diversas instituições estão reportando que a procura pelo mercado de capitais voltou a aquecer no mês de junho", afirmou.

A volta das grandes empresas ao crédito bancário secou os recursos no sistema financeiro e prejudicou pequenos empresários. Além disso, os bancos preferiram emprestar aos maiores, por causa do menor risco de calote. Assim, empreendimentos menores ficaram sem crédito.

O movimento levou o Banco Central a lançar medidas para ampliar a liquidez no sistema financeiro, com o objetivo de fazer com que o crédito chegasse aos donos de pequenos negócios. Depois, com a resistência dos bancos a emprestarem aos menores, o governo lançou linhas subsidiadas, como Pronampe e Pese.

Liquidez é a quantidade de recursos disponíveis nas instituições financeiras. Quanto mais dinheiro em caixa, maior a possibilidade de aumentarem a concessão de crédito.

Na tentativa de reverter a situação, em junho, a autoridade monetária lançou outro pacote de medidas direcionado às pequenas e médias empresas.

"Em momentos de turbulência e maior incerteza, as empresas priorizam alternativas de financiamento ou de fortalecimento de caixa que possam ser acessadas de forma mais ágil. Nesse sentido, o crédito bancário se coloca como uma boa alternativa para muitas delas", disse o diretor de Relacionamento com Clientes da B3, Rogério Santana.

Os indicadores econômicos mais recentes mostraram recuperação e indicaram que o fundo do poço foi em abril, o que elevou a confiança do investidor. Assim, a Bolsa apresentou melhora e fechou acima dos 100 mil pontos pela primeira vez desde março em 10 de julho e, desde então, manteve o patamar.

"Já vemos um fluxo intenso de ofertas de ações, tanto em aberturas de capital como em ofertas subsequentes. A expectativa é que mais companhias acessem o mercado de capitais para financiar sua operação ou mesmo captar recursos para aquisições de outras empresas ou ativos específicos", disse Santana.

Para André Galhardo, economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, ainda é cedo para falar em retomada do mercado de ações, mas a volta das grandes empresas à Bolsa é um movimento natural.

"Temos um ambiente de spread [diferença entre taxa de captação dos bancos e quanto eles cobram nos empréstimos] altíssimo para pessoa jurídica, então em cenário de melhora dos índices econômicos, é mais vantajoso garantir recursos no mercado de capitais", disse.

O economista Mauro Rochlin, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas), disse acreditar que as incertezas ainda são muito grandes.

"Mesmo antes da pandemia, a captação de recursos na Bolsa ainda não era um instrumento efetivo e o crédito bancário ainda tem participação maior", disse.

Ele pontuou, no entanto, que a queda da taxa básica de juros, que está a 2% ao ano, menor patamar da história, pode impulsionar o brasileiro a investir no mercado de ações, porque o rendimento de aplicações mais conservadoras não são mais tão atrativos.

"Com as empresas maiores voltando ao mercado de capitais, é razoável esperar um aumento na disponibilidade de recursos para as pequenas e médias nos canais bancários tradicionais", afirmou o presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Isaac Sidney Ferreira.

"A retomada do mercado de capitais é um sinal positivo, de confiança dos investidores na capacidade de recuperação da economia brasileira", disse.