Economia aponta cenário mais positivo
PUBLICAÇÃO
domingo, 02 de janeiro de 2000
Agência Estado
De São Paulo
O mercado acionário brasileiro, há mais de dois anos acuado por sucessivas crises financeiras internacionais e abalado pela mudança no regime cambial que levou à desvalorização do real, pode ter neste ano a oportunidade de se redimir e fechar a década de 90 como uma interessante alternativa de investimentos e fonte de capital para as empresas.
Um cenário mais positivo já foi antecipado no últimos meses de 1999, quando o volume de negócios na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) praticamente dobrou em relação à média anual. O resultado não deixa de surpreender considerando os resultados pífios pós-desvalorização do real. A Bovespa fechou o ano com valorização em real de 151,90%, em dólar de quase 70%, e ainda registrou um recorde histórico no último pregão de 1999, ao superar a marca dos 17 mil pontos.
O ressurgimento do mercado acionário veio da migração dos investidores de renda fixa aplicações de renda fixa, que, com a queda acentuada nas taxas de juros de 45% para 19% ao ano, passaram a buscar ganhos maiores. O vigor da Bolsa de Nova York, naturalmente, contribuiu para manter o ritmo forte.
Para este ano, executivos do mercado prevêem um crescimento real em dólar de até 30%, sustentado pela retomada do crescimento econômico, pela redução contínua dos juros e pela volta dos investidores estrangeiros.
Para os economistas em geral, o governo deve manter a política de redução dos juros, embora de forma mais branda daqui para frente por causa da inflação. Ainda assim, os resultados obtidos até agora são inegáveis.
Para o Banco Bilbao Vizcaya Brasil, o nível atual dos juros reais já é o mais baixo dos últimos três anos anos. A taxa do certificado de depósito interbancária deflacionada (pelo IPCA) ficou em 16% ao ano em 1996 e deve fechar 1999 pouco abaixo disso, em 15,6%. São números distantes do registrado em 1998 (26,5%) e do pico da década (39,7%). Nossa previsão é chegar ao fim de 2001 com uma taxa de 9,7%, diz Octavio de Barros, economista-chefe do BBV Brasil.
Além da migração de aplicações em renda fixa para ações, tanto de fundos de pensão quanto de pessoas físicas, a queda dos juros reais tem impacto sobre o desempenho das empresas e, consequentemente, reflexos no preços dos papéis, avalia o economista-chefe do Banco Santander, Dany Rappaport.
As bolsas de valores, entretanto, não serão alimentadas somente pelos investidores domésticos. Há uma forte expectativa de que o capital externo retorne ao Brasil já nos primeiros meses de 2000, impulsionando os negócios nas bolsas. Rappaport observa que a queda do risco Brasil já foi parcialmente antecipada no fim do ano.
Uma forma de avaliar esse movimento é pela redução do spread (diferença) entre o rendimento do C-Bond, principal título de dívida externa brasileira, e dos títulos do Tesouro americano equivalentes. Essa diferença superou os mil pontos-base nos piores momentos do ano passado, em agosto, por exemplo, e fechou 1999 na faixa de 680 pontos-base. Para este ano estima-se que o spread caia para 500 pontos-base. Mas esse é um sinal de que o capital que fugiu do País com medo de um possível calote está perdendo o medo de pode voltar.
Na opinião de Rappaport, dois fatores vão sustentar o declínio do spread. A expectativa de melhora da situação fiscal do País e o equilíbrio maior das contas externas. O déficit em transações correntes deve cair graças à recuperação da balança comercial e aos investimentos diretos estrangeiros, que devem continuar elevados: entre US$ 18 bilhões e US$ 25 bilhões.
Apesar de a conta de capitais ser superavitária, ela não deverá cobrir o déficit em transações correntes, observa o economista-chefe do Citibank Carlos Kawall, que estima um déficit no balanço de pagamentos de US$ 4 bilhões. O Unibanco está mais otimista e acredita que ele seja zerado.
Embora o cenário para este ano seja animador, o mercado está cauteloso. Barros, por exemplo, entende que as condições para a retomada imediata do crescimento ainda não estão asseguradas. É preciso que o País dê sinais claros de mudanças mais ousadas na responsabilidade fiscal de diferentes esferas do governo e na criação de uma cultura exportadora capaz de garantir crescimento seguro.