O MPT-PR (Ministério Público do Trabalho do Paraná) recebeu, de 15 de março a 18 de agosto de 2020, 1.481 denúncias relacionadas irregularidades cometidas dentro de empresas no tocante ao controle e prevenção da Covid-19. Na região atendida pela Procuradoria do Trabalho em Londrina, composta por 69 municípios, já foram recebidas 159 denúncias relacionadas ao novo coronavírus.

Imagem ilustrativa da imagem Denúncias relacionadas à Covid-19 no MPT-PR passam de 1.400

Segundo o procurador do trabalho Marcelo Adriano da Silva, elas se referem a empresas de vários setores econômicos, como frigoríficos, supermercados, bancos, shoppings, indústrias, hospitais, mas os frigoríficos ganham destaque devido ao grande contingente de trabalhadores possivelmente afetados.

Falta de EPIs - principalmente máscaras, falta de espaçamento entre os trabalhadores no ambiente de trabalho, trabalhadores com suspeita de contaminação que não são afastados de imediato, entre outros, são exemplos de irregularidades constantes nas denúncias.

No Paraná, 13 TACs (Termo de Ajustamento de Conduta) já foram firmados e oito ações civis públicas ajuizadas pelo MPT-PR com os frigoríficos. De acordo com denúncias dos sindicatos, os trabalhadores estariam sendo obrigados a utilizar a mesma máscara por até cinco dias, sendo que o ambiente dos frigoríficos costuma ser bastante úmido ou com muita poeira. Trabalhadores com teste positivo para a Covid-19 também estariam sendo pressionados a voltar ao trabalho, caso não apresentem sintomas, antes do período de isolamento obrigatório.

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Os sindicatos também se preocupam com a aglomeração de trabalhadores na linha de produção e em outros ambientes coletivos da empresa. “É um ambiente de pouca renovação de ar. Temos salas ou salões com 700 a 800 trabalhadores trabalhando ombro a ombro”, conta Ernane Garcia Ferreira, presidente do STIAA (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação de Apucarana e Região).

Só na Jaguafrangos, em Jaguapitã, foram identificados 202 casos positivos de coronavírus em testagem feita pela própria empresa nos trabalhadores de um turno da indústria duas semanas atrás. Na JBS em Rolândia há 25 casos positivos da Covid-19 e 120 casos em investigação conforme informações prestadas pela própria empresa duas semanas atrás.

Auxiliar de produção, Ademilson Fernochi é um dos que foram diagnosticados com a Covid-19. Não é possível saber onde o contágio aconteceu, mas Fernochi diz se sentir ansioso ao trabalhar em um lugar com tanta gente. O local onde ele trabalha não tem muita gente, mas áreas comuns como bebedouro e refeitório e situações como entrada e saída do expediente causam uma grande aglomeração. “É muita gente.”

O auxiliar de produção foi à procura de um médico depois que começou a passar mal. “Procurei meu médico, fizemos exame e deu positivo. Me afastei por 14 dias e depois me liberaram para voltar trabalhar.” Por sorte, Fernochi só sentiu mal-estar e perdeu o paladar, mas há dez dias, dois colegas de trabalho perderam a vida para o coronavírus. Valdir Santana, de 53 anos, e Aparecida dos Santos Pereira, de 45 anos, trabalhavam há sete anos na unidade da JBS em Rolândia.

A principal reivindicação dos sindicatos da categoria de trabalhadores é a testagem dos trabalhadores, mesmo dos assintomáticos, e com mais frequência. “Como não tem testagem, essas pessoas estão trabalhando e contaminando sem serem identificadas”, salienta Wanderlei Sartori, assessor jurídico da Federação dos Empregados em Indústrias de Alimentação do Estado do Paraná. Segundo Ernane Ferreira, do STIAA, os frigoríficos delegam a responsabilidade à saúde pública. “A testagem de todos os trabalhadores a cada momento com certeza traria um diagnóstico mais preciso e reduziria o número de transmissores e doentes nos frigoríficos.”

O medo de perder o emprego também faz com que trabalhadores continuem trabalhando mesmo com sintomas ou diagnóstico positivo da Covid-19, observa Sartori. “As pessoas têm medo de comunicar que estão doentes. Empresas como a Jaguafrangos e a JBS como buscam mão de obra em várias cidades da região, existe uma abundância muito grande de mão de obra. O receio de ser dispensado é muito grande nesse sentido.”

'Não há como se flexibilizar ou relativizar medidas', diz procurador

No dia 30 de junho, a Secretaria de Estado da Saúde havia publicado uma resolução (855/2020) com medidas de prevenção e controle da transmissão do coronavírus nas plantas frigoríficas de indústrias de abate e processamento de carnes. A resolução, no entanto, foi revogada e substituída em 31 de julho pela 944/2020 considerada menos avançada que a anterior. “A revogação da resolução 855 na visão do MPT foi um retrocesso. Era a portaria mais avançada do setor no Paraná”, diz Lincoln Roberto Nóbrega Cordeiro, procurador do Trabalho e vice-gerente do Projeto Nacional de Adequação do trabalho em frigorífico. “Tinha distanciamentos bem fixos em padrões elevados, possibilidade de testagem massiva de plantas, paralisação de setores unidades diante de número expressivo de casos.”

Por outro lado, a conscientização do empregador, na visão de Cordeiro, é imperativa. “A par de questões normativas, a gente precisa de conscientização das empresas, entender que em relação a essa infeliz doença não há como se flexibilizar ou relativizar medidas. Você quando diminui padrão de proteção aumenta o risco de contágio.”

A medida mais efetiva de controle dos casos de Covid-19 é o distanciamento social, mesmo na produção, reitera o procurador. “Nos frigoríficos faz-se ainda mais necessário, justamente por ser empresa que são grandes empregadores, com vários funcionários laborando.” Qualificação das máscaras e “olhar de vigilância ativa” são outras medidas destacadas por Cordeiro. “Vendo pessoas apresentando sintomas, realizar rapidamente o afastamento. Aí entra também a questão de testagem. Testar pessoas que apresentem sintomas possibilita que a empresa verifique eventuais contactantes e já afaste também.”

Investimento no combate à doença chega a R$ 100 milhões, diz Sindiavipar

Em nota para a imprensa, o Sindiavipar (Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Estado do Paraná) afirmou que “está acompanhando constantemente, junto aos seus associados e entidades do setor, as atividades nas plantas do estado e as atualizações de protocolos e recomendações de órgãos como Organização Mundial da Saúde e do Ministério da Saúde”.

“O Sindicato destaca ainda que as empresas vêm seguindo rigorosamente essas determinações pois estão comprometidas na garantia da saúde e bem-estar de suas equipes e da comunidade. A entidade projeta que as indústrias avícolas paranaenses já tenham realizado um investimento de aproximadamente R$ 100 milhões no combate à doença”, continua a nota.

Dentre as medidas adotadas, o Sindicato destacou o afastamento de trabalhadores de grupos de risco, elaboração e distribuição de conteúdo explicativo sobre processos de higienização dentro e fora da empresa, adoção de medidas para impedir aglomerações nos ambientes da empresa, atenção especial aos EPIs, medição diária da temperatura de todos os colaboradores e acompanhamento médico dos funcionários.

Disse ainda que o setor produtivo estabeleceu protocolo setorial, validado cientificamente pelo Hospital Albert Einstein, que adicionou uma série de medidas protetivas aos colaboradores, como proteção buconasal, faceshield e outros, além dos habituais uniformes, luvas e outras camadas de proteção.