A desvalorização do real provocou uma queda de pelo menos 80% no movimento das lojas de Ciudad del Este (Paraguai), na fronteira com Foz do Iguaçu, considerada o paraíso dos sacoleiros brasileiros. A avaliação é do Centro de Importadores e Comerciantes de Alto Paraná (Cicap), entidade empresarial que reúne os 60 maiores lojistas da cidade paraguaia.
‘‘Há casos de lojas que não venderam absolutamente nada desde a desvalorização. Muitos já estão baixando os preços, tendo um lucro mínimo, apenas para sobreviver e esperar a situação melhorar’’, afirma Charif Hammoud, presidente do Cicap e dono da Monalisa, a maior e mais requintada loja da Tríplice Fronteira (Brasil, Paraguai e Argentina). A mudança da política cambial foi adotada pelo governo brasileiro há dez dias.
Com lojas vazias, muitos empresários optaram por fechar os estabelecimentos mais cedo, para evitar gastos como o consumo de energia. Em algumas galerias comerciais, na última semana lojas chegaram a fechar as portas até às 11 horas - apenas três horas após o início do expediente. Às 15 horas, a maior parte dos estabelecimentos do centro comercial já estava fechada.
Todo o comércio de Ciudad del Este foi atingido pela mudança cambial, mas a crise foi sentida com maior intensidade nos shoppings e galerias destinados a atender exclusivamente os sacoleiros. No início da tarde da última quinta-feira, a Folha percorreu boa parte do comércio da cidade paraguaia. A maioria das lojas e galerias desse setor - geralmente mais simples e sujas - estava vazia.
As que permaneciam abertas, não haviam vendido quase nada. Às 12h30 paraguaias (13h30 no horário de Brasília), a loja de eletrônicos Toca-Fitas Centro, localizada na galeria Jebai Center, havia vendido apenas uma fita de vídeo, por US$ 2,00 (o equivalente a R$ 3,3). No dia anterior, uma quarta-feira - tradicionalmente o dia de maior movimento na cidade -, a loja vendeu mercadorias no valor de US$ 70,00. Antes da desvalorização do real, o faturamento em uma quarta-feira atingia até US$ 4 mil.
Nos shoppings e galerias mais requintados, cuja maior parte da clientela é formada por turistas, a situação era um pouco melhor. ‘‘Minhas vendas caíram à metade’’, resumiu o empresário Pedro Chung, dono da Miguelito Eletrônicos, do Shopping Americana, um dos maiores de Ciudad del Este. O câmbio era flutuante: o dólar variava entre R$ 1,55 a US$ 1,70.
A crise do real afeta diretamente o comércio paraguaio da fronteira. Segundo estimativa do Cicap, os brasileiros representam 85% dos clientes de Ciudad del Este - os outros 15% são representados por argentinos, chilenos e paraguaios. Há pouco menos de dez anos, no auge do ciclo dos sacoleiros, Ciudad del Este recebia em um sábado, uma média de 500 ônibus, transportando cerca de 20 mil compristas brasileiros.
De acordo com um levantamento informal da Foztur (órgão oficial do turismo em Foz do Iguaçu), desde o início da crise chegam à cidade apenas seis ou sete ônibus por dia. Se viajarem lotados, esses ônibus trazem diariamente à fronteira somente 280 sacoleiros (1,4% do movimento anterior).
Se a situação não mudar em pouco tempo, os empresários já estudam iniciar um processo de demissões em massa. Essa medida provocaria uma grande crise social em Foz do Iguaçu. Um terço dos 30 mil funcionários das lojas de Ciudad del Este são brasileiros.
Devido à falta de movimento, muitas lojas já anteciparam férias coletivas. Ciudad del Este possui cerca de 5,5 mil lojas. ‘‘Podemos suportar essa situação por, no máximo, um mês’’, prevê Charif Hammoud. Os empresários também vão pedir ao governo paraguaio a redução de impostos para enfrentar os efeitos da crise brasileira.Christian RizziÀs moscasLojas das principais galerias de Ciudad del Este ficaram vazias desde que o real foi desvalorizado; algumas preferiram fechar as portas para cortar custosValmir Denardin