BRASÍLIA - DF- O corte de R$ 988 milhões nas despesas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) previstas no Orçamento de 2022 ameaça o atendimento a segurados, segundo fontes do governo ouvidas pelo jornal Folha de S.Paulo. O Congresso havia aprovado uma dotação de R$ 2,388 bilhões para gastos de custeio do órgão, responsável pelo pagamento de aposentadorias, pensões e outros benefícios. O presidente Jair Bolsonaro, porém, vetou 41% dessa verba, deixando o INSS com uma previsão de R$ 1,4 bilhão para o ano.

Embora o valor seja igual ao solicitado pelo governo ao enviar a proposta de Orçamento, em agosto de 2021, técnicos o consideram abaixo do mínimo para assegurar as atividades do órgão. O veto se dá justamente no momento em que o governo tenta regularizar a fila de espera por benefícios, que acumulava 1,85 milhão de pedidos em novembro de 2021 – dos quais 1,3 milhão com espera acima de 45 dias.

Nos bastidores, técnicos alertam que agências podem suspender atendimentos devido à falta de dinheiro. A tesourada pode comprometer a capacidade do órgão de honrar o pagamento de contratos terceirizados de vigilância e limpeza. Sem essas atividades de apoio, as agências não podem abrir ao público.

Em dezembro do ano passado, a falta de pagamento a um fornecedor da área de segurança no Distrito Federal comprometeu o repasse de salários aos vigilantes, que cruzaram os braços. Os atendimentos previstos para os dias de paralisação precisaram ser reagendados.

Para os servidores do órgão, o corte também coloca em risco a infraestrutura da rede de atendimento, o que pode ter efeito sobre a fila de espera. Ainda que o INSS tenha investido na digitalização dos serviços nos últimos anos, técnicos e analistas dizem que computadores e sistemas utilizados para validação de dados estão defasados. "O risco é claro, de ainda maior morosidade nas respostas. Cai um recurso que seria usado para gestão e processamento de dados. A manutenção da estrutura, dos equipamentos, de internet, tudo isso já está profundamente sucateado", diz Viviane Pereira, secretária de políticas sociais da Fenasps (Federação dos Sindicatos de Trabalhadores em Previdência e Assistência Social).

Segundo a dirigente sindical, muitas agências ainda não reabriram as portas, em meio à pandemia, por falta de estrutura mínima de atendimento, como ventilação e banheiros acessíveis. Com o corte, a Fenasps aposta na inviabilidade de centenas de agências. "A gente vem reiteradamente discutindo a necessidade de melhoria e de reabrir agências. O serviço do INSS não pode ficar apenas pela internet. O segurado ainda tem muita dificuldade de fazer tudo online", diz Pereira.

A entidade começou um levantamento, junto aos estados, de quantas agências devem ficar sob risco de paralisação diante do corte de verbas. Nesta segunda-feira (24), as federações e sindicatos de técnicos e analistas do seguro social começaram a redigir um ofício ao atual presidente do INSS, José Carlos Dias de Oliveira, no qual pedem o detalhamento de cada uma das atividades que serão afetadas pela redução de recursos.

Rita de Cássia Assis Bueno, dirigente do Sinsprev (Sindicato dos Servidores e Trabalhadores Públicos em Saúde, Previdência e Assistência Social) em São Paulo, diz que a expectativa dos funcionários do órgão era oposta ao que se consolidou com o veto. "O sistema, os computadores, tudo é muito antigo, vive fora do ar. É o contrário do que o INSS precisa, que é investimento. "Em 24 de agosto de 2021, o então presidente do INSS, Leonardo Rolim, afirmou que o valor mínimo para assegurar o funcionamento do órgão seria de R$ 1,863 bilhão. O alerta foi registrado em ata de reunião do CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social).

No ano passado, o Congresso aprovou inicialmente uma previsão de R$ 1,176 bilhão para as despesas de custeio e investimentos do INSS, mas ao longo do ano a cifra foi elevada a R$ 1,456 bilhão, justamente para evitar um apagão. Ainda que o valor aprovado para 2022 seja semelhante, há expectativa de que os contratos terceirizados fiquem mais caros, devido ao aumento do salário mínimo de R$ 1.100 para R$ 1.212. Por isso, o dinheiro é considerado insuficiente. Além disso, a verba prevista para este ano é a menor desde pelo menos 2010, quando consideradas as dotações finais para o INSS em cada ano, após remanejamentos.

O veto ao orçamento do INSS também compromete os planos de digitalização e inovação do órgão, segundo as fontes ouvidas pela reportagem. O órgão permite a concessão de aposentadoria por idade urbana, parte das aposentadorias por tempo de contribuição e BPC (Benefício de Prestação Continuada) a idosos de forma digital, por exemplo. O plano é estender a automatização aos benefícios rurais e aos urbanos que ainda não foram totalmente digitalizados, mas a falta de recursos pode levar a atrasos.

A empresa responsável por viabilizar a tecnologia é a Dataprev, cujo contrato já vem sofrendo sucessivos cortes. Segundo as demonstrações contábeis do INSS, o órgão ainda acumulava um passivo de R$ 99,6 milhões com a estatal no terceiro trimestre de 2021. Há também o temor de que fiquem comprometidas as verbas para manutenção da "Helô", assistente virtual do órgão que tem ajudado a desafogar a demanda por atendimentos presenciais ou telefônicos, pela Central 135. Como boa parte dos atendimentos de orientação e informação foram direcionados para esses canais digitais, a falta de verbas pode, na avaliação de técnicos da área, sobrecarregar agências e reduzir a eficiência do INSS, que hoje tenta centrar sua mão de obra na análise de benefícios.

A avaliação é que esse gargalo pode comprometer o cumprimento dos prazos para zerar a fila de espera por benefícios, previstos em acordo homologado pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O INSS também deve ter dificuldades para implementar o projeto de teleatendimento, que inclui perícias a distância. O TCU (Tribunal de Contas da União) já ordenou a elaboração de um protocolo para o atendimento remoto dos segurados.

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