BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Anunciada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nesta segunda-feira (21) como resultado das negociações de parceria estratégica com o governo Donald Trump, a ampliação da cota de açúcar que o Brasil poderá exportar a mais para os Estados Unidos já era esperada desde abril.

Bolsonaro divulgou em mensagem nas redes sociais que o Brasil poderá exportar 80 mil toneladas a mais de açúcar ao mercado dos EUA.

"A quota para o açúcar brasileiro nos EUA passa de 230 para 310 mil toneladas e, por lei, beneficiará exclusivamente os produtores do Nordeste", escreveu o presidente.

"Trata-se já do primeiro resultado das recém-abertas negociações Brasil-EUA para o setor de açúcar e álcool, conduzidas no Brasil pelo MRE e nos EUA pelo USTR [autoridade comercial americana]", continuou.

Apesar de Bolsonaro ter propagado a ampliação como uma vitória, ainda em abril, a USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) divulgou publicamente que haveria aumento das quotas tarifárias até 30 de setembro.

Consequentemente, coube ao representante comercial dos Estados Unidos alocar a cota extra para diversos países.

Em junho, o Brasil recebeu uma quota adicional de 13 mil toneladas. Nesta terça, houve anúncio da possibilidade de exportação de mais 80 mil toneladas de açúcar, como divulgado por Bolsonaro.

A razão alegada para a ampliação foi a quebra da safra de açúcar nos EUA aliada a incertezas no nível de fornecimento de certos países, como México e os efeitos da pandemia do novo coronavírus.

O anúncio da medida como resultado da negociação com os EUA nesta segunda irritou representantes do setor. O motivo do incômodo é que esse tipo de notícia divulgada com teor político e como se fosse uma novidade afeta os mercados.

A UNICA (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) e o FNS (Fórum Nacional Sucroenergético) divulgaram nota na qual esclarecem que a concessão de cota adicional de 80 mil toneladas "se trata de um procedimento normal adotado pelos EUA nos últimos anos".

O anúncio, dizem, ocorre "sem representar qualquer avanço estrutural para um maior acesso do açúcar brasileiro àquele país."

"Além da cota tradicional que o Brasil possui, de 152 mil ton/ano, tem sido praxe a abertura de novas cotas para suprir os volumes dos países que não conseguem vender a quantidade prevista ou para complementar a demanda anual dos Estados Unidos" diz a nota das entidades. "Nesses casos, o Brasil acaba sendo beneficiado não por concessão americana, mas por ser o país com o maior volume de açúcar para exportação no mundo."

O texto ainda reforça que a cota extra de açúcar representa 0,3% das média das exportações brasileiras de açúcar e é "consideravelmente inferior à cota mensal de etanol que o Brasil ofereceu novamente aos EUA em setembro".

"É fundamental, portanto, que as discussões entre os dois países avancem em direção à ampliação significativa das nossas exportações de açúcar, a partir de resultados permanentes e concretos, condizentes com a concessão feita pelo Brasil nos últimos anos para o etanol americano", conclui a nota.

Neste mês, o governo Bolsonaro estendeu uma medida que zera o imposto de importação sobre o etanol americano.

Em decisão tomada no último dia 11, foi cortada a taxa de 20% sobre 187,5 milhões de litros originados dos Estados Unidos por 90 dias.

Antes disso, o governo já havia liberado a importação de uma cota de 750 milhões de litros de etanol americano sem o imposto de importação regular de 20% para o produto. Nesse caso, a medida venceu no último dia 31.

A decisão foi tomada pelo comitê executivo da Camex (Câmara de Comércio Exterior), órgão responsável por definir alíquotas de importação e exportação, fixar medidas de defesa comercial, analisar regras de acordos comerciais e outras atribuições. O comitê é integrado pela Presidência da República e pelos ministérios da Economia, das Relações Exteriores e da Agricultura.

Conforme mostrou o jornal Folha de S.Paulo, a nova medida teve participação do ministro Ernesto Araújo (Relações Exteriores). Ele convenceu o presidente Jair Bolsonaro a adotar mais um gesto para agradar o governo do presidente Donald Trump, que disputa as eleições naquele país em menos de dois meses.

Os americanos não queriam apenas a prorrogação da cota: eles trabalhavam para que o Brasil aceitasse o livre comércio do produto, o que beneficiaria produtores de milho daquele país --o etanol americano é feito a partir do cereal, e não da cana-de-açúcar, como ocorre no caso brasileiro.