São Paulo - A Bolsa brasileira teve forte alta de 1,70% e recuperou os 118 mil pontos nesta quarta-feira (23) com alívio no exterior e a aprovação do novo arcabouço fiscal no Congresso. O projeto de lei que põe fim ao teto de gastos teve apoio de ampla maioria na Câmara e, por já ter passado pelas duas Casas, segue para sanção presidencial.

Já o dólar registrou queda de 1,67% e terminou o dia cotado a R$ 4,8569, também impactado pela aprovação das novas regras fiscais. A moeda americana foi pressionada, ainda, pela redução de temores sobre a política de juros nos Estados Unidos após a divulgação de dados econômicos fracos no país.

A aprovação do arcabouço fiscal era um dos eventos mais esperados da semana pelo mercado. Com as novas regras, a avaliação é que a percepção de risco sobre o Brasil deve diminuir, aumentando a atratividade do país para investimentos estrangeiros.

Além disso, o Copom (Comitê de Política Monetária) mencionava "incertezas sobre a política fiscal" em suas atas de reuniões sobre juros ao justificar a manutenção da Selic no patamar de 13,75% ao ano. Em sua decisão mais recente, no início de agosto, o comitê retirou esse trecho e promoveu um corte maior que o esperado pelo mercado.

Com a aprovação das novas regras, a expectativa é que as chances de reduções de juros mais agressivas aumentem.

O novo arcabouço fiscal foi desenhado com a promessa de garantir mais recursos para políticas públicas e ao mesmo tempo reequilibrar gradualmente as contas do governo, que entraram no vermelho em 2014 —e, desde então, só exibiram resultado positivo em 2022.

A proposta determina que as despesas federais vão crescer todo ano de 0,6% a 2,5% em termos reais (além da inflação). O percentual vai variar dentro desse intervalo de forma proporcional às receitas obtidas pelo governo —ou seja, quanto maior tiver sido a arrecadação, mais será possível gastar.

O mercado também vê como positivo o apoio obtido pelo governo para a aprovação do projeto, o que mostra que a pauta econômica pode avançar mesmo após embates entre governo e congressistas nas últimas semanas.

"Tivemos uma sequência histórica de 13 quedas consecutivas que, em grande parte, pode ser justificada pelo travamento da agenda econômica. Agora, com o arcabouço aprovado, temos espaço para caminhar com o Orçamento de 2024 e tirar da gaveta outras pautas econômicas, entre elas a própria execução das novas regras fiscais", diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.

Agradou ao mercado, ainda, a decisão da Câmara de rejeitar uma proposta do governo que permitia ao Executivo enviar o PLOA (projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2024 com cerca de R$ 32 bilhões em despesas condicionadas à aprovação de um crédito suplementar.

Na prática, o dispositivo, costurado pela ministra Simone Tebet (Planejamento), abria espaço no texto para gastos extras, com o objetivo de assegurar os projetos do novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Agora, a expectativa é sobre a apreciação do projeto que altera as regras do Carf, devolvendo ao Executivo o chamado voto de desempate, o que poderia assegurar parte das receitas que contribuiria para o plano da Fazenda de zerar o déficit e equilibrar as contas públicas.

Nesta terça, a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado aprovou o projeto, que é visto como essencial para a execução das metas do arcabouço fiscal. O texto ainda deve ser analisado pelo plenário da Casa, e a expectativa é que as discussões ocorram ainda nesta semana.

"Com a agenda do governo no Congresso sendo destravada, a tendência é que os ativos consigam se recuperar, tal como ocorreu na sessão de terça com o Ibovespa", disse a equipe da Guide Investimentos.

Apesar de trazer otimismo, o novo arcabouço fiscal também é alvo de críticas. Dentre elas, há ceticismo sobre o cumprimento das metas de déficit primário estabelecidas pelo texto, que dependem de medidas de arrecadação ainda não confirmadas —como o próprio projeto do Carf—, e projeções de crescimento da dívida pública mesmo com as novas regras.

"Mesmo que o arcabouço seja cumprido à risca, a dinâmica de endividamento brasileiro ainda será ascendente, como apontado por estimativas do governo. Além de cumprir o compromisso firmado pelo arcabouço fiscal, o governo também precisa revisitar os cálculos e fontes de recursos para que a dinâmica da dívida torne-se minimamente estável", diz Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.

Com a aprovação do arcabouço, as curvas de juros futuros do Brasil também tiveram forte queda. Os contratos com vencimento em janeiro de 2025 foram de 10,53% para 10,43%, enquanto as para 2027 foram de 10,37% para 10,18%.

Nesse cenário, a Bolsa brasileira registrou alta e atingiu os 118.134,59 pontos, impulsionada pelas ações da Petrobras, que registrou ganhos de 5,32% em seu papéis preferenciais e de 5,67% nos ordinários. A empresa foi beneficiada por elevações de recomendação de compra do BTG Pactual e do Bank of America, mesmo em dia de declínio do petróleo no exterior.

A Vale também foi um dos apoios do Ibovespa, registrando alta de 0,81% em meio ao avanço dos contratos futuros de minério de ferro. Ganhos de Eletrobras (7,31%) e Itaú (1,28%), que completaram a lista de mais negociadas da sessão, davam fôlego ao índice.

A forte alta da Eletrobras teve como pano de fundo o anúncio da companhia sobre o início de estudos para a incorporação da subsidiária Furnas, numa tentativa de simplificar sua estrutura societária e governança.

O destaque negativo ficou novamente com o setor de varejo. Perdas de Via (2,39%) e Carrefour (2,04%) ficaram entre as maiores da sessão, e as ações do GPA tiveram forte queda de 19,18% após completar a cisão de sua participação no grupo Éxito. Analistas avaliam, porém, que a separação irá destravar valor no GPA.

Para Lucas Almeida, especialista em mercado de capitais e sócio da AVG Capital, o varejo tem sofrido com uma aversão do mercado sobre o setor.

"Os investidores estão mais cautelosos com as ações de varejo devido a dados anteriores, do mês de julho, que mostraram uma desaceleração nas vendas e condições de crédito mais apertadas, que podem afetar os resultados das companhias e atrasar uma retomada dos preços das ações mesmo em cenário de queda de juros", afirma Almeida.

Nos Estados Unidos, a S&P Global informou que seu índice PMI, que acompanha os setores de indústria e serviços, caiu para 50,4 em agosto, ante 52 em julho, registrando a maior queda desde novembro de 2022. Os dados apontaram ritmo fraco de crescimento da atividade empresarial dos EUA

Segundo operadores, essa leitura pode diminuir a possibilidade de o Federal Reserve optar por uma trajetória de política monetária mais restritiva do que o esperado pelos mercados —cenário que, somado a sinais de fraqueza econômica na Europa e na China, tenderia a sustentar o dólar.

Após a divulgação dos dados, o dólar registrou queda ante outras divisas fortes, depois de ter tocado uma máxima em dois meses.

Além disso, os índices de ações americanos operavam em forte alta. O S&P 500, o Dow Jones e o Nasdaq avançavam 1,10%, 0,54% e 1,59%, respectivamente.