São Paulo - A Bolsa brasileira teve sua maior queda do século desde nesta segunda-feira (9). O Ibovespa, maior índice acionário do país, despencou 12,17%, a 86.067 pontos, menor patamar desde 26 dezembro de 2018. Essa é a maior queda diária desde 10 de setembro de 1998, quando a Bolsa caiu 15,8%, ano marcado pela crise financeira russa.

Imagem ilustrativa da imagem Bolsa brasileira despenca 12%, na pior queda do século
| Foto: Gustavo Carneiro - Grupo Folha

Nesta sessão, o índice abriu em forte queda e, às 10h30, as negociações foram interrompidas quando a queda superou 10%. Esse é o nível para que se acione o chamado circuit breaker, que leva à suspensão do pregão. É o primeiro circuit breaker desde o episódio conhecido como Joesley Day, em maio de 2017, e sexto da história. A suspensão foi de meia hora.

LEIA TAMBÉM:

Bolsa brasileira cai 10% logo após abertura e paralisa negócios

Alta do dólar muda comportamento de clientes nas casas de câmbio

Os mercados financeiros de todo o mundo viveram nesta sessão a perfeita definição de dia de pânico. O dólar disparou, apesar da intervenção do BC (Banco Central). O risco-país teve alta recorde. Os juros futuros subiram.

Desde o pico mais recente, quando atingiu a máxima histórica de 119.527 pontos, em 23 de janeiro, o Ibovespa cai cerca de 26%. A queda apaga todo o ganho do mercado de ações desde o início do governo de Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019.

O dólar abriu nesta segunda em forte alta. Na máxima, bateu R$ 4,7940, mas teve a disparada parcialmente contida pela venda de US$ 3 bilhões de reservas pelo BC -o triplo do inicialmente previsto. O plano, na última sexta (6), era vender US$ 1 bilhão. A moeda fechou em alta de 2,00%, a R$ 4,7270. O turismo está a R$ 4,9780 na venda. Em algumas casas de câmbio, chega a ser vendido acima de R$ 5.

O pessimismo sinaliza principalmente uma piora nas perspectiva de impacto econômico com a disseminação do novo coronavírus. A desaceleração da economia global por causa da doença já é considerada inevitável.

Pesam neste início de semana a decisão do governo da Itália de colocar 16 milhões de pessoas no norte do país em quarentena, e da guerra de preços do petróleo entre grandes países produtores.

O quadro é de muita aversão, com investidores em todo o mundo buscando ativos considerados mais seguros -que não estão no Brasil neste momento.

Economistas agora aguardam medidas do governo brasileiro para amenizar o impacto da crise. Nesta manhã, o FMI (Fundo Econômico Mundial) recomendou aos governos do mundo que sejam ágeis na adoção de planos para evitar que o coronavírus tenham efeitos prolongados de retração econômica. Sugeriu medidas como aumento do crédito e liberação de seguro-desemprego.

O risco-país brasileiro, medido pelo contrato de CDS (Credit Default Swap) de cinco anos sobe 40%, a maior alta da história em um dia. O índice retorna ao patamar de dezembro de 2018, aos 200 pontos.

A deterioração nos mercados nesta segunda sinaliza ainda os efeitos negativos da retração no preço do petróleo. O contrato futuro do barril do tipo Brent chegou a cair mais de 30% nesta sessão e agora é negociado ao patamar de US$ 34,47, queda de 23,8%. É a menor cotação desde 2016.

"A decisão da Arábia Saudita pega os mercados de surpresa e adiciona preocupações. Por ora, o impacto nos mercados está sendo avassalador", escreveu a corretora Guide em relatório desta segunda.

As ações da Petrobras, cuja receita é atrelada ao preço do barril de petróleo, tiveram a maior queda percentual da história. As preferenciais (mais negociadas) despencaram 29,70%, a R$ 16,05. As ordinárias (com direito a voto) caíram 29,68%, a R$ 16,92. Os patamares são os menores desde agosto de 2018, quando a estatal se recuperava de perdas decorrentes da paralisação dos caminhoneiros, quando a companhia adotou programa de subvenção e o preço do diesel caiu.

"A mudança no preço do petróleo envolve diretamente a rotina operacional não só da Petrobras, mas de todas as companhias que pautam seus guidances com um preço de referência", diz Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos.

No ano, o petróleo cai quase 50%, reflexo da percepção de que a demanda pelo produto será menor com a redução da atividade econômica global. Uma queda de consumo já é certa: querosene de aviação, com a redução das viagens causada pelo coronavírus.

O Goldman Sachs apontou que o óleo pode ficar ao redor de US$ 30 por barril ao longo do segundo e do terceiro trimestre, sem descartar uma queda para US$ 20.

Já os juros brasileiros sobem, reflexo do temor de investidores sobre os impactos da doença sobre a economia brasileira. Na dúvida, a preferência é por cobrar mais para emprestar ao governo. A curva de juros futuros mostra uma aposta do mercado em Selic a 4% ao ano, se distanciando dos 3,5%. Hoje, a taxa básica está a 4,25% ao ano.

Uma queda de braço entre a Arábia Saudita (membro da Opep) e a Rússia, que se recusou a cortar a produção para fazer frente à queda do preço da matéria-prima já está sendo chamada de guerra do preço do petróleo, com impactos em escala global.

O Banco do Brasil se disse confiante na retomada da economia brasileira e que está preparado para atender clientes em momentos de necessidade e capital de giro.

"É natural que os ânimos do mercado se exaltem diante de incertezas, mas os fundamentos econômicos de longo prazo não mudaram, continuam sólidos. O coronavírus e o stress internacional são pontuais e transitórios. Os mercados tendem a se acomodar após o susto do inesperado, estamos confiantes na reaceleração da economia e do crédito", afirma Rubem Novaes, presidente do Banco do Brasil.

No exterior, Bolsas americanas tiveram o pior pregão desde 2008, ano da crise financeira. S&P 500 caiu 7,60%, Dow Jones, 7,79% e Nasdaq, 7,29%.

'É preciso ter sangue frio para não sair vendendo o que comprou'

Com investimento diversificado em ações, o médico Lucas Uliani Lima conta que ficou preocupado quando a bolsa de valores hoje suspendeu o pregão após atingir queda de 10%. Com foco no investimento de longo prazo, no entanto, ele diz que já foi preparado para enfrentar esse tipo de turbulência.

“Já se espera que, ao longo do caminho, haja oscilações importantes. Ainda mais no Brasil, com questões políticas, internacionais. Claro que gera ansiedade, mas a pessoa que tem perfil de investidor tem que ter isso na cabeça. Tem que ter um pouco de sangue frio para não sair vendendo o que comprou para não ter prejuízo.”

Em situações como essa, com ações em queda, os investidores não têm o que fazer, a não ser esperar passar a turbulência, avisa Eduardo Guergoleti, assessor de investimentos da youp! Financial Group. “Em momentos de pânico, a melhor orientação é não fazer nada.” Mesmo que as ações continuem caindo, não é recomendado vende-las com prejuízo. “O mercado é cíclico. Ao mesmo tempo que cai, não vai ser surpresa se em uma semana voltar a subir.”

Mas como vai ficar o mercado de ações nos próximos dias, ninguém sabe ao certo. “Não tem como prever o mercado de ações de renda variável. Espero que após passar pânico do coronavirus que tem agitado, a bolsa tenda a estabilizar, mas o mercado financeiro é soberano e ninguém sabe de nada”, finaliza Guergoleti. (Colaborou Mie Francine Chiba)

CONTINUE LENDO:

Dólar desacelera para R$ 4,94 após abrir acima de R$ 5

LEIA MAIS

Queda no preço do petróleo deve reduzir competitividade do etanol no Brasil