Depois de 2016, a mobilidade urbana de Londrina passou a ter uma cara nova, graças aos aplicativos de transporte ou de carona compartilhada. Muito mais do que preencher lacunas do transporte público, abrangendo locais e horários em que o ônibus não chega, o sucesso dessa nova forma de se movimentar pela cidade se deu também pela possibilidade de ter conforto e rapidez a um preço acessível, sobretudo para quem não tem condições de ter um veículo particular.

Contudo, essa realidade sofreu grandes transformações, principalmente nos últimos dois anos, fazendo com que essa alternativa não seja mais a grande solução que se propôs a ser.

É, por exemplo, o que tem vivenciado a professora Giovanna da Costa Gregório, que saiu de Londrina em 2020 e voltou há poucos meses. Por morar no centro, ela estava acostumada a fazer várias tarefas a pé e usar o aplicativo de transporte apenas para ir ao trabalho. “Semana passada eu fiquei muito tempo, mas muito tempo mesmo esperando, o valor estava alto e o único motorista disponível não aceitava corrida”. Esse dia, segundo ela, foi o estopim para começar a buscar outras opções de transporte. Desde então, a professora tem adaptado sua agenda às linhas de ônibus disponíveis.

“Faz uns dois meses que eu senti muita diferença no valor e também não encontro mais motorista, dependendo do horário”, comenta a advogada Amanda de Marchi, que usa os aplicativos de transporte com frequência. Segundo ela, as corridas estão custando quase o dobro, o que tem feito ela repensar o uso da alternativa. “Algumas vezes eu até deixo de sair, fico esperando o preço abaixar ou peço carona”, conta a advogada, que, assim como Gregório, optou pelo ônibus para trabalhar.

Uma das hipóteses que as duas passageiras levantam para explicar essa mudança é também uma das maiores reclamações dos motoristas: o preço do combustível.

O olhar de quem dirige

“Até o começo da pandemia, em março de 2020, meu cálculo era de que, a cada R$ 100 que eu fazia, R$ 35 iam para o combustível. Com o aumento, esse valor chegou a mais ou menos R$ 45, R$ 50”, calcula o engenheiro Thiago de Paula, que passou a trabalhar com os aplicativos de corrida no final de 2019.

A conclusão do motorista Rodrigo Adriano Gois é mais ou menos a mesma. “Quando eu entrei ainda era vantajoso. Por exemplo, eu enchia o tanque de álcool com R$ 120. Eu conseguia tirar R$ 400, R$ 450. Hoje eu encho o tanque com R$ 180 e ganho o dobro disso, no máximo. A taxa do aplicativo aumentou, mas não acompanhou o preço do combustível”, pondera. Motorista há dois anos e meio, Gois hoje está na área da saúde, fazendo corridas apenas aos finais de semana para complementar a renda. Quando é questionado sobre a intenção de parar de trabalhar como motorista, ele é taxativo: “Com certeza”.

Imagem ilustrativa da imagem Apps de transporte são alvos de reclamação de usuários e motoristas
| Foto: iStock

“O reajuste até melhorou um pouquinho a situação. Mas ele veio quando a gasolina estava R$ 5,90, R$ 6, e a gente já está em R$ 6,40, R$ 6,50. Então os ganhos desse reajuste já foram perdidos”, calcula de Paula, comentando um ajuste que as empresas teriam feito em setembro de 2021, para frear a saída de motoristas. Contudo, para se adequar a essa nova realidade, ele passou a trabalhar mais e a abdicar dos finais de semana: “Com a pandemia, eu tive que trabalhar picado para pegar os horários de pico. No fim das contas, comecei a fazer mais ou menos umas dez horas por dia”.

Recentemente, ele foi aprovado em um concurso público e saiu dos aplicativos. Apesar dos novos rumos, de Paula já pretendia parar com as corridas. “Eu definitivamente já estava procurando outra opção. Dia 2 de janeiro meu carro quebrou. Eu ainda não sei quanto vai ficar para consertar, mas, trabalhando de Uber, isso com certeza seria um problema enorme para mim”.

O que dizem as empresas

A FOLHA fez contato com três empresas que atuam neste setor em Londrina – Uber, 99 e Maxim. Em nota, a Uber atribuiu a conjuntura ao aumento da procura por corridas, em virtude do relaxamento das medidas de isolamento social e do abrandamento da pandemia: “os usuários estão tendo que esperar mais tempo por uma viagem porque, especialmente nos horários de pico, há momentos em que há mais solicitações do que motoristas parceiros disponíveis para atendê-las. Com esse desequilíbrio temporário do mercado, também podem ocorrer com mais frequência tanto cancelamentos pelo usuário quanto recusa de viagens pelo motorista”. Por meio de sua assessoria, a empresa afirmou que tem por política não divulgar dados e estatísticas sobre o número de corridas feitas, de motoristas ativos e de lucros auferidos.

Já a Maxim, que está atuando na cidade desde abril de 2021, também sustentou a mesma política de não publicar números sobre lucros, corridas e quantidade de motoristas cadastrados. Contudo, a pedido da FOLHA, informou que a quantidade de solicitações no mês de dezembro foi 43,52% maior do que em outubro. O preço médio da viagem nos últimos três meses de 2021 oscilou entre R$ 11,92 e R$ 12,06 para os usuários do aplicativo.

Apesar dos contatos feitos através do canal para a imprensa, pelo serviço de 0800 e junto ao escritório de atendimento dos motoristas em Londrina, a 99 não respondeu até a conclusão desta reportagem.

Weygle Pereira, taxista há 19 anos, atende a região da Gleba e tem percebido um crescimento da clientela, principalmente de pessoas mais jovens
Weygle Pereira, taxista há 19 anos, atende a região da Gleba e tem percebido um crescimento da clientela, principalmente de pessoas mais jovens | Foto: Gustavo Carneiro

Seria a volta do vermelhinho?

Apesar da passagem de ônibus ter a tarifa reduzida e de grande parte das atividades já ter retornado presencialmente, o fluxo no transporte coletivo ainda é cerca de 60% do que havia em março de 2020. Segundo a CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanismo de Londrina), a média diária de passageiros que usam o transporte coletivo na cidade hoje é de aproximadamente 33 mil pessoas em comparação aos 51mil londrinenses que utilizavam ônibus todos os dias antes da pandemia começar.

Uma das saídas que tem sido eleita é a volta para o táxi. Segundo Keity Rocha, taxista há 19 anos e presidente do Sindicato do setor, “quando os aplicativos de transporte chegaram, o táxi perdeu cerca de 70% do movimento. Na pandemia, chegou bem perto de zero, e nos últimos três meses aumentou entre 30 e 40%”.

A percepção de Rocha é confirmada pelos números. Segundo dados repassados à FOLHA, a Faixa Vermelha do Táxi fez 12.860 corridas em outubro de 2021, 14.789 em novembro e 18.102 em dezembro. Percentualmente, significa um aumento de 40,7% em três meses. Na Faixa Azul do Táxi, o aumento nesse mesmo período foi em torno de 50%.

Embora exista um aumento generalizado do fluxo de pessoas, um dos fatores que contribui para o uso mais frequente do taxi é a estabilidade do serviço. Weygle Pereira, taxista há 19 anos, atende a região da Gleba e tem percebido um crescimento da clientela, principalmente de pessoas mais jovens. “Teve gente que entrou no meu táxi e disse ‘meu, pedi cinco corridas e cancelaram, não quero mais isso não’”, pondera o motorista. Na avaliação de Pereira, os motoristas de aplicativo não estão resistindo ao aumento dos combustíveis: “eles viram que é inviável cobrar muito barato. O táxi ainda tem um valor justo, pelo qual dá para trabalhar”.

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