O corte de investimentos que atingiu as startups nacionais em 2022 não afetou as empresas de inovação que atuam no setor do agronegócio. Pelo menos, na região de Londrina. Após o boom experimentado em 2021, no ano passado os recursos minguaram e as prioridades, mudaram, reduzindo pela metade o volume de investimentos nesse tipo de negócio. Um levantamento da plataforma de inteligência de dados SlingHub, apontou que o aporte caiu de US$ 10,5 bilhões (R$ 53,7 bi) para US$ 5,2 bilhões (R$ 26,6 bi) de um ano para outro.

Nas startups da América Latina, a queda nos investimentos foi ainda maior, da ordem de 34%, baixando de US$ 18,4 bilhões (R$ 94 bi) em 2021 para US$ 12 bilhões (R$ 61,3 bi) no ano passado. Em número de aportes, a redução foi de 10%.

Entre as principais causas da menor disposição do mercado para investir, está a elevação da taxa de juros impulsionada pela alta da inflação, principalmente nos Estados Unidos. O Federal Reserve, o banco central americano, elevou rapidamente o ritmo de aperto monetário em 2022, revertendo o fluxo de dinheiro de ativos mais arriscados para os considerados mais seguros, como a renda fixa, com impacto direto nas startups.

No Brasil, esse movimento ocorreu com mais força no primeiro semestre, quando unicórnios – as startups avaliadas em US$ 1 bilhão ou mais – promoveram demissões em massa. O número de novos unicórnios no país despencou 80% depois do recorde de dez startups que alcançaram esse patamar em 2021. No ano passado, foram apenas duas: Neon e Dock.

Head de Relações Institucionais do Cocriagro, hub de inovação para o agronegócio surgido no ecossistema local de inovação, George Hiraiwa afirma que as startups londrinenses que atuam no setor ainda surfam na onda dos bons negócios, alheias à ameaça de estouro da “bolha” das empresas de inovação observada em outros setores. “Para o agronegócio, o ano passado foi muito bom, principalmente para as startups que olham para a questão de crédito, especialmente para o pequeno e médio produtor, e as agfintechs. (Nessas áreas) os fundos ainda estão procurando”, avaliou o executivo.

Ao longo do ano passado, Hiraiwa calcula em cerca de R$ 8,5 milhões o total de investimentos feitos por fundos nas startups do hub Cocriagro. Somando-se a esse valor os investidores anjos, o total fica em torno de R$ 9 milhões.

CEO da Agroboard, startup fundada há dois anos em Campinas (SP) voltada à gestão de riscos do mercado de commodities, Danilo Lombardi está otimista em relação à captação de novos investimentos e acredita que pelo fato de o agronegócio estar em franca expansão, as empresas de inovação do setor não devem ser impactadas pela queda nos aportes.

Em meados de dezembro, a empresa abriu rodada de captação com previsão de chegar a R$ 1,5 milhão até o fechamento das negociações, mas em menos de uma semana, já contabilizava 80% da meta, com R$ 1,2 milhão recebidos. "A gente lê as notícias, entende que é um movimento que está afetando bastante as startups (baixa no número de investidores), mas no agronegócio não sentiu esse impacto. O agro passa um pouco longe das crises e a gente tem indicativo de finalizar a rodada bem antes do previsto", disse Lombardi.

Com 16 anos de atuação no mercado de commodities, o CEO afirma que os negócios voltados ao agronegócio estão em uma crescente. "Temos demandas de novos clientes que já sinalizaram que vão entrar na plataforma e temos clientes já existentes pensando em expandir dentro da plataforma. A crise não afeta as commodities, principalmente as voltadas à alimentação."

Sem desviar o olhar das questões macroeconômicas que impactam diretamente a capacidade de investimentos do mercado, Hiraiwa acredita que as empresas ainda terão muito espaço para crescer e novas oportunidades deverão se abrir para o setor ao longo deste ano. A taxa Selic é um dos principais focos de sua atenção porque quanto mais altos os juros, maior é a cautela do investidor. “Com essa alta taxa do momento, qualquer investidor vai pensar muito antes de fazer um aporte, ainda mais em startups, que são empresas de risco.”

O executivo ressaltou, no entanto, uma particularidade das startups do agronegócio, que é o tempo maior que levam para performar. “No agro, não se tem um valuation alto como em outros setores”, apontou.

Para empresas que apresentam soluções em rastreabilidade, que propõem ideias para diminuir ou racionar o uso de insumos, como defensivos e fertilizantes, ou que atuam em foodtech, assegurou Hiraiwa, não devem faltar investidores interessados. “Estou muito otimista, apesar de todas as dificuldades, com acontecimentos exteriores que interferem diretamente no agro, como a guerra entre Rússia e Ucrânia. Acredito que 2023 vai ser um ano muito bom.”

Se haverá declínio nas startups do agro, disse o head do Cocriagro, ele ainda não se desenha no horizonte. Responsável por cerca de 30% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, o agro deve ser a mola propulsora das startups no futuro. “A inovação tecnológica, a digitalização no agro, é mais recente. Em outros setores, como saúde, finanças, a digitalização veio antes. O agro foi mais tardio, então ainda tem muito espaço para crescer”, analisou. “O agro é gigante e permite a atuação em N frentes, antes, dentro e depois da porteira e ainda na questão do processamento da indústria. É um setor que está com grande apetite e se tiver projetos bons para resolver as dores dessas quatro frentes, vai haver investimento. Nós, no Cocriagro, estamos com muita demanda.”(Com Folhapress)

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