Alta dos custos da construção civil pressiona preços dos imóveis
Insumos mais caros, carga tributária elevada, juros em ascensão e, principalmente, a valorização da força de trabalho encarecem o metro quadrado
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segunda-feira, 25 de novembro de 2024
Insumos mais caros, carga tributária elevada, juros em ascensão e, principalmente, a valorização da força de trabalho encarecem o metro quadrado
Simoni Saris - Grupo Folha
A carga tributária elevada, os juros em ascensão, a alta dos preços dos materiais de construção e o aumento dos gastos com a força de trabalho pressionam os preços dos imóveis. Para manter as margens de lucro, prevê a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), nos próximos meses as construtoras deverão repassar esses custos aos compradores.
“A situação vai gerar o repasse de custo maior para o preço dos imóveis. Quem for comprar a casa própria vai encontrar preços maiores. Não tem jeito, as empresas têm de preservar as margens (de lucro)”, disse o presidente da CBIC, Renato Correia.
No momento, há uma tendência de alta nos custos de construção, medidos pelo INCC (Índice Nacional de Custo da Construção). No período de 12 meses encerrado em setembro, o índice teve crescimento de 5,48%, enquanto no mesmo intervalo, a inflação oficial do país, mensurada pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), avançou 4,42%. Ou seja, o custo da construção já ultrapassa a inflação nacional.
“O setor da construção civil, especificamente, depende da macroeconomia. Tem que ter renda, emprego, crescimento para as pessoas terem condição e capacidade ou interesse de adquirir um imóvel. A gente precisa de juros. As taxas de juros acabam influenciando bastante o setor”, disse a presidente do Sinduscon Norte Paraná, Célia Catussi.
Embora a carga tributária seja uma das maiores preocupações para os empresários do setor, é na força de trabalho que está um dos principais gargalos. A demanda por profissionais está aquecida, mas faltam pessoas qualificadas, o que puxa para cima os salários. Assim, o componente “mão de obra” dentro do INCC subiu 7,7% nos últimos 12 meses, pressionando os custos setoriais. Outra dificuldade é treinar e reter os trabalhadores que estão no mercado.
“Todos nós da construção discutimos e nos preocupamos todo dia com esse assunto. Seja por falta de mão de obra, seja por causa da qualificação da mão de obra, ou seja, por conta da necessidade de mudança de mão de obra”, destacou o vice-presidente da CBIC, Eduardo Aroeira.
Segundo Catussi, neste ano o Sinduscon Norte Paraná calcula que o reajuste nos salários dos profissionais do setor ficou 6% acima do índice inflacionário. “O desemprego está com taxa menor e o Paraná está crescendo, é um dos estados que mais cresce, o que inflaciona o valor da mão de obra.”
Para contornar essa dificuldade, disse a presidente do Sinduscon, as empresas têm adotado algumas ações. Buscar trabalhadores fora do Paraná é uma delas, assim como reforçar os investimentos em inovação e em equipamentos, aumentando a automatização dos processos.
INSUMOS MAIS CAROS
A subida dos preços dos materiais de construção é outro desafio para o setor. Durante a pandemia, alguns insumos chegaram a ser reajustados em mais de 80%, mas terminado o período crítico da crise sanitária, os preços se acomodaram e, ao longo de todo o ano passado, foi registrada redução. Agora, em 2024, essa situação se reverteu e desde março, os insumos começaram a registrar aumento, acumulando alta de 3,89% em 12 meses.
“Os custos dos materiais estão pressionando, o governo está falando em aumento do aço e também a parte da mão de obra que a gente está sendo pressionado”, disse Catussi. Um dos principais reflexos dessa alta é o reajuste do preço do metro quadrado. “Uma preocupação é com a reforma tributária, como ela vai influenciar esse custo do metro quadrado. Vários vetores vêm pressionando os preços”, ressaltou a presidente do Sinduscon Norte Paraná.
“Algumas construtoras vão repassar e outras vão deixar de lançar pelo fato da alta do preço. Isso é um alerta que tem no mercado para construtoras e empreiteiras. Diminuir a margem (de lucro) é uma opção, mas as construtoras têm um limite para isso. O mercado está sendo pressionado, especialmente se continuarem os juros altos, os insumos em elevação e a mão de obra mais cara”, pontuou Catussi.
Atualmente, as maiores preocupações para o empresário da construção são, nesta ordem: carga tributária elevada; custo e/ou falta de trabalhadores qualificados; e taxa de juros elevadas. A economista comentou que o ciclo de alta da Selic, iniciado recentemente, também passa a pressionar o custo do financiamento para o setor. “Esses fatores formaram uma ‘tempestade perfeita’ para o setor da construção”, enfatizou.
Mesmo com adversidades, expectativa é de alta de 3,5% em 2024
Apesar de todas as adversidades, a CBIC revisou, no último dia 28, a projeção de crescimento do setor para este ano, elevando a expectativa de 3% para 3,5%. Entre os fatores que resultaram em projeções mais otimistas estão o aquecimento do mercado de trabalho, o bom desempenho da área imobiliária de padrão econômico e a expectativa de crescimento mais robusto da economia neste ano e início de 2025.
“O setor vem em um ciclo virtuoso de crescimento. O saldo de novas vagas geradas continua positivo e os empresários mantêm expectativas otimistas para o nível de atividade nos próximos seis meses. Diante desses fatores, é possível que o crescimento supere o inicialmente previsto”, afirmou o presidente da CBIC. A construção civil emprega hoje cerca de três milhões de trabalhadores formais, mas somando-se os informais, são quase sete milhões de ocupados, segundo a CBIC.
Correia apontou, no entanto, alguns obstáculos que podem impedir a confirmação das projeções, especialmente as perspectivas de novos aumentos na taxa básica de juros, a Selic, que podem inibir os investimentos. Além disso, ele entende que é preciso considerar a pressão sobre a disponibilidade de recursos do crédito imobiliário.
“Esses fatores podem influenciar o resultado da construção nos próximos meses e provocar um desempenho abaixo do esperado, mesmo diante dos atuais indicadores positivos. O cenário futuro está marcado por incertezas, o que pode comprometer os resultados no final de 2024 e início de 2025.”
Os fatores apontados pela CBIC para a revisão das projeções do setor incluem o crescimento da economia brasileira acima do projetado inicialmente - as últimas estimativas do Banco Central apontam para uma expansão de 3,05% para o país. A resiliência do mercado de trabalho, que nos primeiros oito meses deste ano já gerou mais de 1,7 milhão de novas vagas formais, o desempenho favorável do mercado de padrão econômico e as expectativas positivas dos empresários em relação aos novos lançamentos imobiliários, que deverão gerar empregos e estimular a compra de insumos, também são apontados pela CBIC.
Anteriormente, a Câmara já havia revisado sua projeção de crescimento para este ano. No final de 2023, a estimativa era de avanço de 2,3%, alterados em julho para 3% e, em outubro, para 3,5%. “Os resultados do segundo trimestre foram mais positivos, o que acabou, então, influenciando a nova projeção”, explicou a economista da CBIC, Ieda Vasconcelos. Os 3,5% de crescimento superam as previsões de alta do PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil, calculado em 3,05%, segundo o relatório Focus de 18 de outubro, emitido pelo Banco Central.
Menos dinheiro disponível
Além da alta de custos, empresas do setor da construção civil enfrentam um outro problema. O presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), Renato Correia, aponta a dificuldade das incorporadoras para encaminhar os clientes para o financiamento bancário no momento de entrega das chaves do imóvel vendido na planta. A situação, segundo ele, decorre da elevação dos juros no país e da falta de recursos para abastecer os financiamentos. “Tem muito empreendimento com dificuldade de fazer o repasse”, disse.
Diante dessa situação, o presidente da CBIC reiterou o pleito para que ocorra a liberação dos depósitos compulsórios dos bancos e o seu direcionamento para o crédito imobiliário. Essa medida serviria para amenizar a situação de aperto até um momento mais favorável nos próximos meses. O Banco Central, entretanto, não tem indicado apoio à medida. “O BC entende que não é um remédio definitivo”, comentou Correia.
A proposta consiste na redução de 5% no compulsório bancário com o objetivo de direcionar o dinheiro para os financiamentos de imóveis. Essa sugestão foi encaminhada à autoridade monetária no início de 2023 pelos representantes do setor da construção, entre eles a própria CBIC, a Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias), o Secovi, que reúne empresas do setor imobiliário, e o Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção). Ao longo do ano, os bancos também aderiram, sob liderança da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança).
Por trás dessa movimentação está a preocupação com os juros altos do crédito imobiliário, que inibem lançamentos e vendas. Uma das razões para isso é o encaminhamento das fontes de recursos que os bancos usam para conceder empréstimos.
Os últimos anos foram marcados por perda de recursos das cadernetas de poupança - fonte de recursos com menor custo para o crédito - e a necessidade de utilização de outras fontes de mercado pelos bancos, geralmente atreladas ao CDI (Certificado de Depósito Interbancário), título de curtíssimo prazo.