Alta do dólar abre oportunidades ao setor produtivo
Indústria e agronegócio se beneficiam da alta da moeda norte-americana para exportar mais e buscar novos mercados
PUBLICAÇÃO
sábado, 13 de julho de 2024
Indústria e agronegócio se beneficiam da alta da moeda norte-americana para exportar mais e buscar novos mercados
Simoni Saris - Grupo Folha

Para o consumidor comum, a alta do dólar eleva os gastos nas viagens de férias, encarece as compras de itens importados e, internamente, puxa para cima a inflação porque muitos itens fabricados no Brasil sofrem influência da moeda norte-americana. Mas para o setor produtivo, a variação cambial não é de todo ruim. Apesar de aumentar os custos de produção, quem exporta se beneficia da valorização do dólar frente ao real. Em alguns setores, como no agronegócio e na indústria, o momento é de aproveitar as oportunidades.
No decorrer desta semana, o câmbio ficou um pouco mais estável, mas desde o início deste mês tem sido um dos temas mais comentados entre os economistas em razão da sua forte interferência na política monetária nacional. No último dia 1, a cotação do dólar chegou a R$ 5,64, o maior valor registrado desde 10 de janeiro de 2022. Em junho, o dólar subiu 6,4% e até o início de julho, a moeda norte-americana acumulava alta de 15% no ano.
São muitos os fatores que provocaram a valorização cambial, mas entre eles, alguns se destacam, como o aquecimento econômico nos Estados Unidos. Com baixo nível de desemprego, o governo norte-americano aumentou a taxa de juros para conter a inflação, medida que atraiu investidores.
Ao mesmo tempo, o Brasil teve queda nas exportações de minério de ferro e petróleo, o que reduziu o ingresso de dólar no país. “Com menos dólar para receber, há menos oferta da moeda americana e o dólar sobe”, explicou o técnico do Departamento Técnico e Econômico do Sistema Faep/Senar-PR, Luiz Eliezer Ferreira. Há ainda a preocupação com a política fiscal do governo, que indica a possibilidade de déficit.
No setor do agronegócio, o impacto da alta do câmbio tem dois lados. Embora aumente os custos de produção, uma vez que grande parte dos insumos usados nas lavouras brasileiras é importada, o dólar em uma cotação mais elevada beneficia as exportações, com a valorização das commodities. “O preço da soja subiu. A soja acompanha bem esse movimento do dólar nas últimas semanas, mas ele é apenas uma das peças do quebra-cabeça para a formação do preço das commodities”, disse Ferreira.
No início da semana passada, quando a alta do dólar atingiu o pico, a saca da soja acompanhou esse movimento e chegou a ser cotada em R$ 137,68 em 3 de julho, em uma demonstração da grande volatilidade deste mercado. Trinta dias antes, o preço da mesma saca era de R$ 132,47, uma valorização de 3,9%.
A oscilação da moeda norte-americana favorece as vendas futuras. Muitos agricultores brasileiros se anteciparam e fecharam contratos de exportação. Até o começo de julho, segundo o presidente da SRP (Sociedade Rural do Paraná), Marcelo Janene El-Kadri, desde o começo de julho, quatro milhões de toneladas do grão haviam sido comercializadas. “Com a desvalorização do real em relação ao dólar, o mercado brasileiro fica mais agressivo e competitivo lá fora.”
Por outro lado, El-Kadre destacou que o aumento dos custos de produção pode resultar em preços mais altos para os alimentos no mercado interno. “Isso impacta não apenas os consumidores finais, mas também a competitividade dos produtos agrícolas brasileiros no mercado doméstico em relação aos importados”, destacou o presidente da SRP. “Em resumo, enquanto a alta do dólar pode beneficiar exportadores agrícolas brasileiros ao aumentar a competitividade internacional, também pode introduzir desafios significativos, como aumento dos custos de produção e pressões inflacionárias no mercado interno.”
O cenário ideal vislumbrado por El-Kadre seria o de pouca oscilação da moeda americana porque assim, empresas e produtores poderiam programar suas compras e vendas.
Para a indústria, assim como no agronegócio, a desvalorização do real é positiva para as atividades de exportação, que tornam os produtos brasileiros mais competitivos no mercado estrangeiro, o que pode influenciar no aumento do volume de vendas externas. “Se as empresas entenderem que esse cenário continua, uma oscilação (do dólar) para cima, pode despertar o interesse das empresas em explorar o mercado internacional, se antes não pensava. Com essa taxa, é mais uma oportunidade”, afirmou o economista da Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), Evanio Felippe.
Mas para as atividades industriais que dependem de matéria-prima importada, a alta cambial é vista com preocupação. Dos US$ 18 bilhões importados pelo Paraná em 2023, 95% foram comprados pela indústria de transformação, especialmente do setor químico, direcionado ao agro. Como deixar de importar não é uma alternativa em razão do risco de desabastecimento do mercado interno, a oscilação da taxa cambial altera os custos de produção e impacta a atividade produtiva no Estado. “Há uma redução da competitividade nossa. Está mais caro para produzir e isso afeta os preços finais do mercado interno”, pontuou Felippe.
O dólar mais alto também faz obriga as indústrias a recalcularem os custos de investimento na modernização de maquinários e processos. Planejamentos para o segundo semestre feitos no início do ano passam agora por uma revisão de planilha. “Essa oscilação acaba afetando os projetos de investimentos das empresas. O cenário não é muito certo, não é muito estável e as empresas estão mais reticentes em comprar um novo maquinário ou equipamento”, ressaltou o economista.
Prever como o dólar deve se comportar é impossível, mesmo em curto prazo, mas entre os economistas existe a expectativa de que ocorra uma acomodação. Internamente, a política fiscal e os posicionamentos do governo federal interferem direta e quase instantaneamente na cotação cambial, mas há que se observar também os fatores externos, como a política monetária dos Estados Unidos, as guerras no Leste Europeu e no Oriente Médio. “Acreditar que vai subir é uma aposta, assim como a queda. Tudo pode acontecer”, resumiu Felippe.

