Advogados que atuam na área previdenciária consideram dura a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo
Advogados que atuam na área previdenciária consideram dura a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo | Foto: Carl de Souza/AFP



O governo federal busca convencer a sociedade de que a reforma da Previdência - encaminhada nesta quarta-feira (20) ao Congresso Nacional - visa reduzir igualdades e eliminar privilégios. Mas não é isso que pensam os advogados que atuam na área previdenciária. Para eles, a proposta prejudica a maioria dos segurados, incluindo os mais pobres.

"A proposta veio mais dura que eu esperava", aponta a advogada, colunista da FOLHA, e presidente da Abap (Associação Brasileira dos Advogados Previdenciários), Renata Brandão Canella. "É a proposta mais complexa apresentada até hoje e realmente vai segurar bastante o acesso aos benefícios, seja por idade ou contribuição", diz Thiago Napoli, do escritório Balera Berbel&Mitne. "A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) está olhando só o lado econômico e não o social", emenda Edmeire Aoki, secretária-geral da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil - Londrina) e representante do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário).

Entre os pontos prejudiciais para o segurado, Renata Canella cita o que proíbe a acumulação de pensões. "O casal mora junto a vida inteira e tem as mesmas despesas. Na hora que um dos dois falece, quem fica terá uma queda expressiva na renda", afirma. É que, pela reforma, a viúva ou viúvo vai receber 100% da pensão maior e apenas uma parcela da outra. "Em alguns casos, essa parcela será de apenas 20%", ressalta.

Ela também destaca a redução do BPC (Benefício de Prestação Continuada) - salário mínimo pago a idosos em vulnerabilidade social. Hoje, pessoas nessa condição com 65 anos ou mais já podem ser beneficiadas. A proposta, embora diminua a idade mínima para 60, torna o benefício proporcional. O segurado com 60 anos terá direito a apenas R$ 400. "Só quem tiver 70 anos ou mais ganhará o salário mínimo", conta a advogada.

Thiago Napoli chama atenção para a mudança na aposentadoria especial. Hoje, alguém com 25 anos de trabalho insalubre já tem direito à aposentadoria, independentemente da idade. "Com a reforma, só poderá se aposentar a partir dos 60", critica. Essa regra, ressalta ele, altera a finalidade da norma, que é antecipar o benefício. "Colocar uma idade mínima numa questão de benefício especial é prejudicar demais o trabalhador. Pode ser um médico, um mecânico ou qualquer um que faz trabalho considerado insalubre", explica.

Alterações na aposentadoria rural também vão prejudicar os menos favorecidos, segundo Edmeire Aoki. "Hoje, o trabalhador rural tem de comprovar tempo de atividade. Pela PEC, terá de comprovar tempo de contribuição", alega. Ela também critica o fato de a proposta aumentar de 55 para 60 anos a idade mínima para aposentadoria da trabalhadora rural, tornando a regra igual à dos homens. "Essa também é uma mudança que não faz sentido."

Rebatizada de aposentadoria por incapacidade permanente, a atual aposentadoria por invalidez também terá alterações, de acordo com a advogada. Hoje, todos os aposentados nesta categoria recebem 100% da média das contribuições. Pela proposta que está no Congresso, só terão benefício completo os que sofrerem acidente do trabalho ou apresentarem doença ocupacional.

Edmeire Aoki critica ainda o fato de o projeto deixar muitas definições para leis complementares, que exigem maioria simples nas votações do Congresso (50% mais um dos votos) enquanto uma PEC necessita de quórum qualificado (3/5 dos votos dos parlamentares). "Fica muito mais fácil de aprovar novas mudanças", ressalta.

Um dos temas que poderão ser tratados posteriormente por projetos de lei complementares é a capitalização, sistema no qual os trabalhadores fazem sua própria poupança para a aposentadoria. De acordo com a advogada, as regras permanentes das aposentadoria também serão definidas por lei complementar.