A praga virou benção, diz produtor
PUBLICAÇÃO
quinta-feira, 05 de março de 2009
A reportagem confessa que estranhou ao saber que iria experimentar o café-jacu, mas encarou com naturalidade ao ler sobre o assunto antes de beber. É um café muito bom, que deixa um gosto de fruta na boca. Se vale R$ 10 a xícara é outra história... As razões para o preço, porém, ficam mais claras ao ouvirmos as explicações do produtor Henrique Sloper, um carioca formado em marketing na Califórnia, e proprietário da Fazenda Camocim, no Espírito Santo, de onde sai o exótico café. Confira alguns trechos da entrevista.
FOLHA - Como surgiu a idéia do café-jacu?
SLOPER - Primeiro gostaria de dizer que este é um fenômeno natural, só criamos a tecnologia. Antes, queria me livrar dos jacus, pois os via como pragas na minha lavoura. Eu já conhecia o kopi luwak (café da Indonésia, que passa pelo processo digestivo de um felino). Foi num dia fatídico, quando vimos uns 80 jacus devorando os cafezais, que caiu a ficha. Aí a praga virou benção.
E como é o processo?
O jacu pega o grão no pé, senta perto do cafezal e vai comendo os frutos maduros até encher. É um espetáculo estranho. O jacu é uma mistura de urubu com galinha, faz um barulho assustador. Ele não tem estômago, é só papo e intestino. E o que ele quer é só a parte mole da fruta. Em 30 a 40 minutos ele defeca.
Vocês colhem as fezes e a partir daí o que acontece?
Aí entra o nosso processo tecnológico (que não revela em detalhes). O mundo tem vários cafés exóticos. O segredo nosso foi ter descoberto uma tecnologia própria. Colher cocô de pássaro é fácil. Transformar aquilo em bebida boa é que é a questão. Já registramos a marca jacu-coffee no mundo inteiro e o nosso projeto é transformar isso em tesouro nacional brasileiro.
E o que atrai tanto os jacus para a fazenda?
São três fatores: o sistema de produção florestal (floresta com agricultura), a lavoura orgânica e biodinâmica (sem utilização de produtos químicos), e o microclima da fazenda (região de montanha, silenciosa). O jacu é sensível e não gosta de barulho.
Por que o café é
tão caro?
Por causa do custo de produção. Na última safra colhemos 70 toneladas de café na fazenda, sendo que menos de uma tonelada foi de café jacu. No final do processo, isso vai gerar uns 500 quilos apenas. É menos de 1% da produção.
Na hora de beber, qual a principal diferença do café-jacu?
Na boca, não sabemos dizer quimicamente o que muda porque isso ainda está em processo de pesquisa. Em relação ao outro tipo de café que produzimos na fazenda, o jacu passa por uma seleção natural, feita pelo próprio pássaro. Ele só come os grãos bons, do mesmo tamanho e maduros, que têm teor de açúcar mais alto. O jacu sabe o que faz.
Você pode dizer por quanto vende o jacu-coffee no exterior?
De jeito nenhum. Mas posso garantir que o preço é bem mais alto do que dentro do Brasil (cerca de R$ 40 o pacote de 250 gr de café em grão). E não tenho produção para atender a demanda. Para fora, o café vai embalado a vácuo, em caixas de cinco quilos, em grãos verdes. Eles preferem assim porque dizem que o café torrado depois de 15 dias já era... (G.M.)