Os chistes, ou trocadilhos, ocupam um lugar especial na psicanálise, especialmente na obra de Freud, que dedicou um estudo profundo ao tema em seu trabalho: O Chiste e sua Relação com o Inconsciente (1905). Chistes não são apenas formas de humor ou entretenimento, mas janelas para o inconsciente, revelando de maneira disfarçada desejos, pensamentos e impulsos que normalmente seriam reprimidos.

Freud identificou que os chistes operam de maneira semelhante aos sonhos e aos lapsos de linguagem. Eles permitem que conteúdos inconscientes – desejos, conflitos ou agressões reprimidas – se expressem de forma socialmente aceitável. Ao mascarar uma intenção séria com uma camada de humor, o chiste permite que algo potencialmente ameaçador ou inadequado seja dito sem as consequências diretas que isso poderia acarretar.

Por exemplo, uma pessoa pode fazer uma piada aparentemente inofensiva sobre a preguiça de um colega de trabalho: "Ah, você deve ser alérgico ao trabalho, né?" Embora essa frase seja dita em tom de brincadeira, pode carregar um julgamento sério sobre a ética de trabalho do colega. O humor aqui atua como um véu, disfarçando a crítica e tornando-a mais palatável, tanto para quem a profere quanto para quem a recebe.

Muitas vezes, o chiste é utilizado como uma forma de agressão velada. A pessoa que faz a piada pode se proteger dizendo que "era só uma brincadeira", evitando, assim, confrontos diretos e as responsabilidades que viriam com uma crítica aberta. No entanto, para o observador atento, o chiste revela a intenção subjacente: um ressentimento, uma crítica ou até uma hostilidade que não pode ser expressa diretamente. Um exemplo clássico seria uma situação familiar em que um parente, ao ver que alguém engordou, faz a seguinte observação em tom de brincadeira: "Cuidado, hein! Daqui a pouco vamos ter que te rolar pela casa!" Por trás da risada, pode haver uma crítica séria ao peso do outro, algo que seria difícil de dizer diretamente sem causar desconforto.

O chiste também pode ser visto como uma forma de negociação entre os impulsos de vida e de destruição. Através do humor, impulsos agressivos podem ser liberados de uma maneira que não destrói a relação social, preservando, assim, os laços. Contudo, a intensidade e o conteúdo do chiste podem revelar o quão próximo o sujeito está de um rompimento desses laços, usando o humor como uma última barreira antes da agressão direta. É que há brincadeiras e brincadeiras. Algumas são tão ‘carregadas’ que causam mal-estar e gera um ‘clima’ ruim. Outras brincadeiras podem ser inofensivas e até carinhosas. Tudo depende de como a brincadeira é proferida e da intenção oculta.

O chiste, portanto, é bem mais complexo do que se imagina. Ao prestar atenção ao que está por trás da "brincadeira", podemos obter insights valiosos sobre as verdadeiras intenções e conflitos que movem o comportamento humano.

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