No filme americano Bela Vingança (2020) a personagem principal é uma moça inteligente e sensível que fica tomada pela paixão do ódio. Sua única procura é pela vingança, esquecendo do principal: ela mesma. Quando alguém é dominado pela paixão pelo ódio fica cego e surdo a qualquer outra coisa e geralmente acaba sucumbindo a situações trágicas. O apego ao ódio gera ignorância e nada pode ser mais trágico do que isso.

Imagem ilustrativa da imagem Paixão pelo ódio
| Foto: iStock

No enredo do filme a personagem vive uma situação, em seu passado, muito dolorosa e a injustiça que se segue torna o evento mais danoso ainda. Não é só a ocorrência do que se passou que causa dor, mas a falta de justiça e reconhecimento do quão grave e séria foi a situação. A perda e a humilhação foram tão severas que ela não consegue se desapegar do ódio que sente. Ela inteira passou a ser ódio.

Quando ficamos apegados a alguma emoção ou sentimento podemos ficar tão identificados com eles que não conseguimos discriminar mais nada, nem a nós mesmos. A busca pela vingança passou a ser sua única ligação com o mundo e qualquer outra coisa não tinha a menor chance de se desenvolver. Confúcio, pensador da Antiga China, disse uma frase: Quando sair em busca de vingança cave duas covas: uma para seu inimigo e outra para você mesmo. Ele entendia que a vingança era um apego tão grande ao ódio que não tinha como acabar bem.

Gandhi disse: Essa história de olho por olho acaba deixando todo mundo cego. Claro que é fácil falar sobre o quanto a vingança pode ser prejudicial, mas muito mais difícil é se desapegar dela quando ficamos identificados com o ódio que sentimos. Queremos causar no outro a mesma dor, a mesma humilhação que sofremos. O nível de violência para isso é tamanho que não há mesmo chance de terminar de forma satisfatória.

O problema é que ficar dominado por uma emoção, seja ela qual for, nos torna escravos, e quem está escravizado não consegue ser livre, está acorrentado por alguma coisa. Quando as emoções são fortes demais elas nos aprisionam de forma assustadora. O escravo não tem a chance de viver a própria vida, pois tem de servir ao seu amo. Quando uma emoção nos domina ela se torna nosso amo, nosso mestre.

O ódio, a emoção que dominava a personagem do filme, é algo “gostoso” de sentir porque nos faz sentir poderosos, cheios de força, mas toda esta força só leva a destruição, porque não é temperada com a inteligência e a sabedoria. Não é à toa que a ira, que vem do ódio, é considerada como um dos sete pecados capitais.

Para não sucumbir ao ódio, não ficar escravizado por ele, só mesmo praticando o desapego. Em todas as religiões se prega o desapego, mas muitos entendem de maneira limitada esse conceito, como se ele tratasse apenas do desapego material. Na verdade, o real desapego começa primeiro internamente, no psiquismo, no desapego das nossas emoções mais intensas e primitivas. Só com esse desapego podemos verdadeiramente fazer justiça. Só desapaixonado de certas emoções podemos ser sagazes para lidar com o mundo de maneira mais eficiente. Como estamos necessitados de entender e viver isso. Precisamos aprender a escrever a nossa carta de alforria.

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