Em 1930 após a Primeira Guerra e prestes a estourar a Segunda Guerra, Freud, criador da psicanálise, escreveu um texto chamado Mal-estar na civilização. Neste trabalho ele mostra a batalha que é para o ser humano lidar com sua vida pulsional, já que muitos impulsos têm uma natureza violenta. O processo civilizatório não consegue inibir eficientemente todos os perigos que existem dentro de nós. Há em toda pessoa uma pulsão destrutiva e Freud foi bem direto quando disse que os homens não encontrariam nenhuma dificuldade em exterminar uns aos outros. Um texto de 90 anos atrás, mas mais válido que nunca principalmente sob esses tempos atuais de invasão russa na Ucrânia.

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. | Foto: Aris Messinis - AFP

A guerra sempre fez parte da história e faz parte. Não é algo localizado apenas nos livros históricos sobre anos passados. A disposição para a guerra é atual porque está dentro de nós, é inerente à nossa natureza. Freud apontava que as pessoas percebiam essa tendência à destruição e que isso criava uma recorrente angústia e inquietação pelo medo de irmos às vias de fato e termos sucesso na exterminação total. A civilização, a sociedade precisa constantemente estar “ajustando” os níveis de violência e quando esse ajuste falha ou não é suficiente o lado mais horroroso que carregamos se faz presente.

Na arte o demônio ou os demônios são representados como bestas monstruosas, hibrido de animal e humano. Pior que qualquer besta animal e pior que qualquer humano dito como tal essas representações são, na verdade, o que existe dentro de nós e o que nos assusta. É só olharmos para trás e verificar que muitos povos considerados civilizados e cultos foram capazes das mais atrozes a aterrorizadoras ações para com outras pessoas. A tão aclamada racionalidade do ser humano que faz com que muitos se achem a última bolacha no universo inteiro vai para o ralo quando os impulsos internos mais bestiais surgem à tona e dominam a mente. Nem precisamos ir tão longe nos massacres e genocídios pela História, mas basta notar que se a polícia deixasse de existir a barbárie tomaria conta de todos e o que valeria seria sem dúvida a lei do mais forte.

Nessa guerra atual que se trava entre Ucrânia e Rússia podemos, infelizmente, presenciar esse lado tão terrível em nossa natureza. A violência, barbárie, selvageria são frutos de uma mente que não se desenvolveu e não criou recursos internos para lidar com esse impulsos. Os ataques à capacidade de pensar predomina e tudo o mais que existir é posto de lado. Razão se perde fácil, mais do que gostaríamos de admitir.

Quando rompemos com a racionalidade a violência se torna a única forma para se lidar com o mundo e tudo o que for diferente é visto como o inimigo; tudo o que trouxer frustração passa a ser violentamente reprovado e atacado. Todos esses eventos podem acontecer individualmente ou no coletivo. No indivíduo há um louco que comete violência, no coletivo há a guerra.

Temos que cuidar para que a besta que há em nós não predomine e nos faça bárbaros. Só mesmo uma melhora significativa em como lidamos com a suade mental pode rarear guerras, conflitos, injustiças, etc.

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A opinião do colunista não é, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina

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