No mês de setembro a primavera chega e os ipês aqui em Londrina se abrem em flores. No bairro onde moro há bastantes ipês de cor branca e é um espetáculo ver as árvores, após uma leve chuva antecedida por uma severa seca, explodir em flores. Porém, nem tudo são flores e, andando pelas ruas e admirando os ipês, vi algumas faxineiras de alguns prédios bastante irritadas varrendo o tapete das flores que naturalmente caem nas calçadas.

Cheguei a escutar de uma delas que a árvore deveria ser cortada porque só fazia sujeira. Que coisa mais triste! Flores, mesmos as caídas, não são sujeiras. É um processo natural as árvores perderem flores e folhas, tal como nós perdemos fios de cabelo. Sim, as calçadas precisam ser varridas e isso dá trabalho, mas é bem melhor varrer flores e folhas do que latinhas, garrafas, bitucas de cigarro e sacolinhas plásticas que são, sim, sujeiras que jogamos pela cidade afora. Mesmo caindo fios de cabelo não precisamos necessariamente raspar a cabeça para evitar o trabalho de aspirar ou varrer nossa casa. Por que, então, deveríamos cortar as belas árvores que nos dão tanta beleza?

A questão jaz, na minha opinião, menos nas reclamações das pessoas que dizem que dão trabalho ou de que fazem sujeira, mas na incapacidade de se admirar e suportar o que é belo. A verdade é que muitas pessoas não conseguem tolerar aquilo que é belo e bom nas próprias vidas. Quando algo interessante acontece e é digno de nota, muitas pessoas correm para cortar isso de suas vidas.

O fato é que apesar da grande maioria das pessoas afirmarem que querem que suas vidas se transformem em coisas boas, isso está mais na boca do que no coração. Ou seja, está mais no discurso, no que se fala, do que nas verdadeiras atitudes. Há um prazer frequente, muito empobrecedor, em lamentar. Prefere-se, entre muita gente, reclamar do que admirar aquilo que é bom.

Quando vamos atacando tudo aquilo que é bom e belo em nossas vidas cada vez mais vamos tirando as “flores” que podem tanto nos enriquecer e dignificar. Uma cidade repleta de ruas sem árvores fica uma cidade feia, pobre, seca, quente e sem vida. Hoje em dia, os planejadores urbanos enfatizam o quanto precisamos de mais áreas verdes nas cidades. O quanto isso tudo traz qualidade de vida aos moradores. As cidades sem vida são na verdade reflexo do que se passa dentro de muitas pessoas. Elas ficam com a mente também sem vida, sem nada preservado, sem nada que possa florescer.

As flores de verdade morrem, caem, dão trabalho. Uma música brasileira diz que as flores de plástico não morrem, mas elas também não vivem. Uma flor artificial jamais poderá substituir uma verdadeira. Com a vida também se passa o mesmo. Ela também dá trabalho, também perdemos, mas uma vida artificial, cheia de reclamações, não poderá substituir, nem mesmo por um instante, uma vida autêntica. Se queremos “florescer” em nossas vidas precisamos aceitar o trabalho que tudo isso nos dá. Só que quando florirmos será verdadeiro e de uma forma que vale a pena viver.

A opinião do colunista não é, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina

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