A escolha de "brain rot" como a expressão do ano pelo Dicionário Oxford é um sintoma eloquente do mal-estar em que vivemos. O termo, que traduzido pode ser algo como "podridão cerebral", remete à deterioração mental provocada pelo consumo excessivo de conteúdos superficiais, sobretudo nas redes sociais. Em uma leitura psicanalítica, isso aponta para uma angústia coletiva: a percepção de que nossa capacidade de pensar, refletir e elaborar simbolicamente está sendo corroída por estímulos incessantes, fragmentados e pouco nutritivos para o psiquismo.

O funcionamento mental saudável depende da capacidade de criar ligações simbólicas e transformar experiências brutas em algo pensável e elaborável. Como destacou Bion, o pensar é um processo que surge da necessidade de metabolizar a frustração e dar forma à ausência, ao vazio. Entretanto, as redes sociais, com seu fluxo contínuo de imagens, vídeos e mensagens instantâneas, muitas vezes interrompem essa capacidade, oferecendo gratificações rápidas e imediatas, mas que pouco contribuem para o trabalho psíquico. Nesse cenário, mais importante do que o acúmulo de informações é a capacidade de processá-las, integrá-las e dar-lhes significado, transformando dados isolados em saberes que dialoguem com a experiência subjetiva.

O "brain rot", portanto, pode ser compreendido como uma falha nesse processo de metabolização. Ao invés de simbolização, temos a repetição automática; ao invés de criatividade, encontramos o consumo passivo de estímulos que não exigem esforço de elaboração. Freud já nos alertava sobre os riscos de ceder à busca pela gratificação imediata, que tende a sufocar a capacidade de lidar com o desprazer e com as angústias inerentes à vida psíquica. O excesso de informação, quando não acompanhado por um trabalho mental que permita sua digestão e integração, se transforma em um ruído interno que contribui para o esgotamento psíquico.

Além disso, o fenômeno reflete um vazio existencial que é mascarado pela hiperatividade mental promovida pelas redes. As pessoas se encontram saturadas de estímulos, mas emocionalmente desnutridas. É o paradoxo de viver conectado a tudo e, ao mesmo tempo, sentir-se desconectado de si mesmo. Essa desconexão, muitas vezes, se manifesta em estados de apatia e ansiedade.

A superficialidade dos inúmeros conteúdos consumidos nas redes sociais impede que o sujeito acesse camadas mais profundas de sua subjetividade, deixando-o à deriva em um mar de estímulos voláteis. A incapacidade de processar informações gera a ilusão de conhecimento enquanto enfraquece a possibilidade de transformação e aprendizado autênticos.

Do ponto de vista clínico, os efeitos desse fenômeno são evidentes. Crescem os relatos de pacientes que, ao buscarem análise, se queixam de uma sensação de "entorpecimento mental", dificuldade de concentração e falta de motivação. O analista, nesse contexto, pode ajudar o sujeito a encontrar espaço para a reflexão e para o reencontro com sua capacidade de sonhar, pensar e criar. A análise oferece um espaço onde o sujeito pode, enfim, desacelerar e processar suas vivências, permitindo que informações dispersas ganhem corpo.

O "brain rot" é um sintoma de uma época marcada pelo excesso de informações e pela escassez de significado. Frente a isso, cabe à psicanálise oferecer um contraponto: um espaço e um tempo, onde o ritmo frenético é desacelerado, e a mente pode reencontrar o tempo necessário para se restaurar. Mais do que criticar o uso das redes sociais, a psicanálise convida a uma reflexão sobre como habitamos esse espaço digital e como podemos transformá-lo em algo que alimente, ao invés de corroer, nossa vida psíquica. Afinal, o que realmente importa não é o quanto consumimos, mas o quanto conseguimos digerir e integrar, transformando informação em sabedoria e conexão em verdadeira experiência subjetiva.

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A opinião do colunista não é, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina