A condição humana é a da falta. Isso quer dizer que não somos completos e nunca seremos. Sempre nos faltará algo, sempre haverá esse sentimento de vazio e quando isso é sentido geralmente causa um mal-estar e faz com que muitas pessoas procurem meios de ‘tapar’ ou ‘ocultar’ de si próprios o que lhes falta. Podemos ser imensamente ricos em dinheiro, famosos, termos uma família linda digna de capa de revista, várias realizações e tal, mas mesmo assim jamais sentiremos a tão idealizada completude. Podemos até mesmo lançar ônibus espaciais no espaço sideral com objetivos de coloniza-lo, porém continuaremos a ser humanos e isso implica em se deparar com a falta.

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. | Foto: iStock

Essa privação da completude é inerente à nossa natureza e traz muita angústia. Esta é o mesmo que dor, mas dor psíquica, ou seja, uma dor que não está localizada em alguma parte do corpo e que possa ser resolvida com medicamentos ou procedimentos cirúrgicos. Não há nada que possamos FAZER em relação a esse sofrimento porque não se trata de efetuar uma ação contra a dor, que como já disse faz parte da nossa essência, porém exige que aprendamos a lidar com a dor por uma perspectiva nova: precisamos aprender a sentir e a suportar a dor de se ser humano.

Quando muitas pessoas se deparam com essa necessidade de aprender a tolerar o sofrimento ficam tomadas por uma ansiedade muito grande e tentam, de todas as formas, fugir disso. Ocorre, entretanto, que não temos como fugir da condição humana. Até mesmo se tomarmos um foguete e formos para Marte habitar lá, toda a nossa natureza interna vai junto conosco. Não há como escapar de nós mesmos. Já que não há escapatória que nos possibilite deixar a condição humana os mais desesperados encontram meios de se enganar.

Drogas, bebidas, excesso de comida, de compras ou de sexo são maneiras entre muitas outras de se enganar. Bion, psicanalista inglês, tinha uma frase muito interessante: “as drogas são para aqueles que não toleram esperar”. Sim, as drogas e qualquer outra coisa que seja compulsiva em nossas vidas apresentam um pseudo alívio imediato que enganam, achando que estamos nos preenchendo e, portanto, saindo do sentimento de falta. Só que é um engodo que faz com que a compulsão interfira entre a discriminação entre o que é real e o que é falso na vida. Assim, toda pessoa compulsiva acredita que “cria” a sua própria realidade e que esta independe da realidade externa real que de fato existe. Só que esses comportamentos compulsivos têm pouca duração (afinal não são reais) e acabam sempre demandando mais e mais para sentir-se aliviados do vazio que sentem. São aquelas pessoas que estão constantemente atrás de prazer, um atrás do outro, mas nada satisfaz de fato.

Ao não tolerar-se o vazio e a falta a gente procura substitutos falsos que atrapalham desenvolver um mundo interno mais consistente e fortalecido. O resultado é que não crescemos de verdade, mas ficamos dependentes de sempre procurar algo prazeroso lá fora de maneira compulsiva e por isso mesmo desastrada. Podemos até nos colocar em riscos desnecessários e pagar um preço alto demais. Aprender a tolerar a condição humana de falta demanda tempo e paciência para ‘encorparmos’ nosso mundo interno que pode, sim, nos oferecer meios de se viver que sejam mais autênticos e satisfatórios. Quando aprendemos a tolerar o vazio podemos construir algo genuíno que possa realmente nos ajudar e não a nos enganar.

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A opinião do colunista não é, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina

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