Ah, o silêncio
PUBLICAÇÃO
terça-feira, 21 de setembro de 2021
Adriano Garib
Aos poucos venho aprendendo a guardar silêncio, coisa que temos enorme dificuldade de fazer. Precisamos dizer qualquer coisa, como se calar fosse uma ofensa, como se o silêncio nos anulasse, nos tornasse desinteressantes, como se ficar em silêncio fosse uma ameaça. Para quem tem o hábito de falar pelos cotovelos, silenciar pode às vezes trazer certo perigo. Quando paramos de tagarelar, ficamos mais predispostos a observar o mundo e a nós mesmos, o que, para muitos, pode ser profundamente incômodo.
Humanos temem o silêncio, e agora me refiro a boa parte deles. Repare: quando alguém, por não ter ou não saber o que dizer, permanece calado, quase sempre alguém ralha: “Fulana é esquisita… Não abre a boca pra nada!” Esse tipo de comentário vem quase sempre carregado de um tom pejorativo, como se a pessoa não tivesse o direito de calar ou como se fosse pouco inteligente por isso. “Fulano não fala… Sem graça!”
Claro que incomoda. Se você cala, o outro não consegue te ler, não consegue saber o que você está pensando, o que é quase uma afronta social. Todo mundo fala o tempo todo, quem você pensa que é pra ficar calado? Nesse caso, falar qualquer coisa é considerado mais adequado que guardar silêncio. E todos vão dizendo a primeira coisa que lhes ocorre, pois já não se ouvem, nem a si mesmos nem aos outros. É uma surdez coletiva, talvez já se possa dizer “uma surdez endêmica”.
A tagarelice nos define. Dizia um velho amigo: “Duros são os comentários!” Receio que nos falte a noção de que calar é, muitas vezes, mais sensato que falar qualquer coisa. Esse imperativo social - ter que dizer alguma coisa - me deixa com a incômoda sensação de que muitos não pensam, nem que seja por uns segundos, antes de falar. Parece que falam menos para se comunicar do que para cumprir um protocolo social.
De modo que quase já não ouço o que me dizem no dia a dia, a menos que sejam coisas como “o almoço está pronto”, “já tomou seu banho?” ou “por que você não passa um café?”. Já se for uma consideração que se assemelhe vagamente a algum tipo de comentário despropositado, fico surdo na hora. Não consigo evitar, meus ouvidos se fecham num reflexo. Surdez seletiva? Não sei se chega a tanto, mas é quase isso.
Claro que alguns comentários são verdadeiras luzes na escuridão, mas estes recebemos um a cada par de anos, se tivermos sorte. E se, ao menos vez que outra, menos falarmos e mais escutarmos.
De outro lado, entendo a histeria falastrona que grassa por todos os lados. Segundo o senso comum, num mundo cada vez mais barulhento, quem mais grita, mais apita. Minha sensação é outra: quem tanto grita, vira barulho.
Por essas e outras, retomo aqui um sábio conselho: “A menos que possa melhorar o silêncio, fique em silêncio.”
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